Intervenção de Jerónimo de Sousa, Secretário-Geral, Acção «Contra os escândalos da banca e a corrupção: impõe-se a nacionalização»

Contra os escândalos da banca e a corrupção: impõe-se a nacionalização

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A decisão de realizar esta acção, com o lema “Contra os escândalos da banca e a corrupção: impõe-se a nacionalização”, aqui em Lisboa e no Porto, resulta de uma avaliação que temos vindo a fazer ao longo dos últimos anos de que é preciso acabar com a transferência de dinheiros públicos para salvar bancos privados, quando está confirmado que os problemas que esses bancos atravessaram ou atravessam são em grande medida devido à gestão danosa dos seus accionistas, o que não os tem impedido de se apoderarem de milhares de milhões de euros em lucros e dividendos.

De acordo com números do Banco de Portugal, entre 2008 e 2010, em plena crise do sector financeiro, os sete maiores bancos distribuíram cerca de 2000 milhões de euros em dividendos quando já se sabia nessa altura incluírem resultados gerados por créditos que no futuro, como se veio a confirmar, iriam requerer a constituição de imparidades com perdas muito significativas.

Como temos afirmado ao longo dos anos, após o início do processo de privatização em meados da década de 80, a banca privada mostrou que não serve os trabalhadores, as populações, as empresas e a economia nacional. Antes pelo contrário, serviu-se deles para: engrossar os lucros dos grandes accionistas e gestores; acumular riqueza numas poucas famílias; espoliar activos privados e públicos; paralisar o investimento e o gasto do Estado; especular no imobiliário e com a dívida soberana, entre outras malfeitorias.

Desde a intervenção estatal no Banco Português de Negócios, em 2008, várias foram as instituições financeiras suportadas pelos recursos públicos com os governos do PS, do PSD e do CDS a utilizarem o Estado e a lei para salvar os banqueiros a pretexto da estabilidade do sistema financeiro.

Dinheiro que sempre existiu para a banca, mas que foi sempre recusado para resolver problemas dos trabalhadores e do País. Sempre que o PCP avançou com propostas de aumento dos salários, incluindo o Salário Mínimo Nacional; para aumentar o investimento nos serviços públicos, nomeadamente para reforçar o Serviço Nacional de Saúde e a Escola Pública; para aumentar mais significativamente as pensões e reformas; para investir no apoio às micro, pequenas e médias empresas; para apoiar a criação e fruição culturais, entre outras necessidades do País, os governos do PS, do PSD e do CDS, invocaram sempre dificuldades económicas do País para não aprovarem as nossas propostas.

Entre 2008 e 2015 as operações de recapitalização realizadas nos 8 maiores bancos nacionais foram de 18 456 mil milhões de euros, dos quais 12 250 milhões de euros em garantias e empréstimos do Estado. Mesmo considerando a recapitalização do banco público, a grande fatia foi para a banca privada.

Desde a falência do BPN até hoje, o Estado português já disponibilizou mais de 20 000 milhões de euros para resolver problemas da banca privada provocados por uma gestão danosa, enquanto os accionistas desses bancos ficaram com milhares de milhões de euros de lucros e dividendos.

Destes mais de 20 000 milhões, uma parte muito significativa destas ajudas foram para o Novo Banco, cerca de 9000 milhões de euros de financiamento público em resultado da resolução do BES e da venda do banco à Lone Star.

A aplicação da medida de resolução ao BES pelo Banco de Portugal em articulação com o Governo do PSD/CDS, em plena intervenção da troika estrangeira e sob o comando da União Europeia, foi um autêntico escândalo, tal como o PCP na altura afirmou.

A divisão entre o banco bom e o banco mau, transformou-se num embuste que serviu apenas para justificar a medida. Já era claro na altura, que, ao contrário do que foi dito pelo Governador do Banco de Portugal, uma parte significativa dos activos problemáticos mantinham-se no chamado banco bom, tal como se veio a confirmar ao longo dos últimos anos. Não se tendo verificado a veracidade das contas apresentadas pelo Banco de Portugal, ficou provado que esta operação constituiu uma autêntica fraude política com o apoio do Governo PSD/CDS e do então Presidente da República Cavaco Silva.

Mas se o processo de resolução do BES configura um escândalo, a venda do Novo Banco a um fundo abutre, a Lone Star, em 2017, transformou-se num negócio ainda mais ruinoso para o Estado português.

Desde a assinatura do contrato de venda do Novo Banco à Lone Star, que se sabia pela sua natureza, iria recorrer a todo o capital disponível dentro do valor estabelecido de 3,9 mil milhões de euros. Quase três anos passados, confirmam essa probabilidade do Novo Banco recorrer a todo o capital disponível de acordo com o contrato celebrado, sempre em nome da estabilidade financeira do banco e do sistema financeiro no seu todo.

O PCP há muito que defende como um imperativo, não apenas fazer uma reflexão muito séria sobre a situação do sector financeiro mas, mais importante, apontar soluções credíveis para que este instrumento fundamental para o desenvolvimento económico e social do País, que é a banca, deixe de constituir um dos principais constrangimentos a esse desenvolvimento e à soberania nacional.

Durante todo este processo, desde a resolução do BES em Agosto de 2014 até hoje, o PCP em vários momentos apresentou a proposta de nacionalização do Novo Banco que, segundo o então Governador do Banco de Portugal, teria um custo para o Estado português, de cerca de 7000 milhões de euros.

Daí para cá, o Estado já transferiu, através do Fundo de Resolução, cerca de 9 mil milhões para o banco em que 75% do capital social está nas mãos da Lone Star. Dinheiro que serviu para limpar activos problemáticos e simultaneamente despedir centenas de trabalhadores.

Então perguntamos. Porque razão não foi o banco nacionalizado, quando o Estado já injectou na instituição cerca de 9000 milhões de euros?

A experiência tem mostrado, de forma concludente, que a banca pública é a única maneira de conservar o sistema bancário nacional. A privatização das instituições financeiras conduz, mais cedo ou mais tarde, à sua aquisição ou domínio, devidamente expurgadas dos activos tóxicos e recapitalizadas, nomeadamente com fundos públicos, por parte dos megabancos europeus, como se verificou na entrega do Banif ao Santander e como se preparam para fazer com a futura venda do Novo Banco.

O Governo insiste em fugir às suas reais responsabilidades escondendo-se por detrás das orientações da União Europeia em matéria de sector financeiro e procura criar as condições para continuar amarrado aos elementos centrais da política de direita, mantendo a possibilidade do Novo Banco utilizar todo o dinheiro disponível no valor de 3,9 mil milhões de euros, permitindo assim à Lone Star limpar o banco de activos tóxicos e vendê-lo com mais valias significativas.

A banca pública é a única possibilidade de garantir o interesse público e nacional, de evitar gravosas orientações determinadas pelos centros do capital financeiro transnacional, de limitar as distorções da concorrência pela grande concentração bancária privada, de recuperar uma alavanca imprescindível para o desenvolvimento soberano do País, pelo que se impõe a nacionalização do sector no seu todo.

Nacionalizar o Novo Banco é a solução mais segura e duradoura, apesar de tardia, capaz de contribuir para a curto prazo as famílias e as empresas poderem aceder ao crédito de que necessitam com taxas de juro não especulativas e, desta forma, contribuir para a dinamização da economia nacional.

Não, camaradas, o Estado não pode estar a pagar e a Lone Star a gerir.

A solução é o Estado paga, então o Estado deve gerir.

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