Declaração de Jerónimo de Sousa, Secretário-Geral do PCP, sobre a política de transportes

Contra a destruição do sistema público de transportes

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Jerónimo de Sousa acusou o Governo de querer transferir o controlo público da CP, da CP Carga, da TAP, da ANA, da CARRIS, da Transtejo, da Soflusa, do Metropolitano de Lisboa ou dos STCP, para as mãos do grande capital estrangeiro, ou melhor para o grande capital Alemão ou Francês de onde são oriundas empresas como a DB, a ARRIVA, ou a Transdev.

Destruição do sistema público de transportes só pode ser travada pela luta dos trabalhadores e dos utentes

1. A menos de um mês do início do novo ano prossegue, em ritmo acelerado, a estratégia do governo que ameaça destruir as empresas e todo o sistema de transportes públicos.

Uma ofensiva que estando há muito a ser preparada - particularmente a partir do sub-financiamento e endividamento das empresas públicas de transportes e sob a chancela da União Europeia está a ter, no quadro do pacto de agressão que está em curso, um salto substancial no brutal aumento dos preços, na supressão e encerramento de serviços, na liquidação de direitos dos trabalhadores, no avanço de liquidação e fusão de empresas, enfim, na concretização daquilo que falta para concluir o processo da sua privatização.

Trata-se no fundo de transferir o controlo público da CP, da CP Carga, da TAP, da ANA, da CARRIS, da Transtejo, da Soflusa, do Metropolitano de Lisboa ou dos STCP, para as mãos do grande capital estrangeiro, ou melhor para o grande capital Alemão ou Francês de onde são oriundas empresas como a DB, a ARRIVA, ou a Transdev que já hoje operam em Portugal, sozinhas ou associadas a grupos económicos nacionais, como é o caso do Grupo Barraqueiro.

2. Perante a indignação geral que suscitou o conhecimento do chamado Plano Estratégico de Transportes e das propostas do Grupo de Trabalho que foi instruído para definir a reestruturação do sistema em toda a área metropolitana de Lisboa, o Governo apressou-se a dizer que se tratavam apenas de propostas e não de decisões. Mas a mentira tem perna curta. Na verdade, está a ser implementada uma política de factos consumados a coberto de um intenso manto de demagogia e manipulações. Incapaz de discutir com o PCP, com os utentes e os trabalhadores, que lhe desmascaram as mentiras e expõem as suas criminosas intenções, o Governo prefere a política das atoardas e dos factos consumados.

3. Denunciamos aqui hoje cinco exemplos concretos:

- Às escondidas dos trabalhadores, dos utentes e da própria opinião pública, iniciou-se este Domingo dia 11, a supressão de serviços na CP afectando milhares de utentes das linhas suburbanas e do serviço regional, que ficam ainda mais condicionados no seu direito à mobilidade indispensável para poderem trabalhar, estudar, ou aceder a serviços. É por isso para levar a sério tudo quanto foi escrito e que aponta para encurtar cerca de metade das carreiras da Carris, para reduzir a actividade do Metro de Lisboa, entre outras medidas de redução da oferta.

- O PCP tomou também conhecimento das medidas inscritas no “Plano de Acções EMEF 2011- 2015”. Inserida na política de destruição do aparelho produtivo nacional, o Governo prepara-se para despedir metade dos 1200 trabalhadores desta empresa, para encerrar a unidade de produção de vagões, para liquidar as oficinas do Barreiro, para entregar aos operadores privados as oficinas de Guifões, Contumil, Oeiras e Campolide, ao mesmo tempo que quer reforçar o papel da Siemens. Na prática é um programa de destruição da Empresa de Manutenção de Equipamento Ferroviário e da manutenção ferroviária em Portugal.

- No transporte aéreo, não deixam de ser reveladores os números divulgados esta semana pela Associação Internacional do Transporte Aéreo (IATA) sobre o sector aéreo nacional: um sector que gerou 2300 milhões de euros em Portugal (cerca de 1,4% do PIB), que garantiu 59 mil postos de trabalho (24 mil dos quais de forma directa), que contribui com mais 3300 milhões de euros através do sector do turismo, e com um valor acrescentado bruto por trabalhador que é o dobro da média nacional. Se acrescentarmos a estes dados o papel da TAP como primeiro exportador nacional e os quase 200 milhões de euros que as empresas do sector aéreo garantem à Segurança Social por ano, ficamos com uma ideia da importância estratégica deste sector para a economia. Um sector que assenta em três empresas públicas - Grupo TAP, Grupo ANA e NAV – e que as multinacionais das troikas se preparam para passar a controlar ameaçando a sua existência futura.

- O quarto exemplo, prende-se com o anúncio do fim das isenções de 50% no custo dos passes sociais para estudantes e idosos, a partir do próximo dia 1 de Janeiro. Uma medida cujo impacto será dramático para centenas de milhar de famílias que passarão a ter um custo agravado de largas centenas de euros por ano. Depois do maior aumento de que há memória no preço dos bilhetes imposto durante o Verão - e sem que o Governo tenha ainda revelado se concretizará um novo aumento no início do ano - esta é uma medida que reflecte a natureza de classe das opções deste Governo: ao mesmo tempo que transfere milhares de milhões de euros para a banca, que promove negociatas – como a do fundo de pensões da banca – em que os banqueiros ficam libertos do pagamento de impostos, penaliza de forma inaceitável famílias que vivem com pouco mais do que o salário mínimo, ou seja, 485€.

- O último exemplo prende-se com a campanha vergonhosa feita contra os trabalhadores das empresas públicas de transportes e que visa não só atribuir-lhes a responsabilidade pelo buraco financeiro que sucessivos governos foram criando, como abrir caminho para uma acentuada redução de direitos como pretende fazer com todos os outros trabalhadores. Na semana passada, assistimos a mais uma manipulação em torno das receitas da CP face à luta dos trabalhadores desta empresa, insinuando a ameaça de que se lutassem não lhes seriam pagos os salários. É preciso não ter vergonha! O Governo sabe que a CP pagou, só em 2011, de juros à banca cerca de 180 milhões de euros, mais 60 milhões que o total dos salários deste ano! E que, a cada ano que passa, paga cada vez mais à banca e cada vez menos aos ferroviários! Aliás, nas Empresas Públicas de Transportes, não apenas na CP, tudo o que tem sido roubado aos seus trabalhadores, tudo o que tem sido roubado aos utentes, está ser entregue à banca sobre a forma de juros! Não deixa aliás, de ser uma tremenda hipocrisia a posição do governo de pretensa preocupação com os direitos dos utentes quando a luta dos trabalhadores assume a forma de greve, quando é este governo, no seguimento daquilo que fez o anterior do PS, que tem vindo a encerrar centenas de quilómetros de linha ferroviária e prossegue uma política de encerramentos generalizada noutros sectores.

4. O PCP reafirma que o país está perante uma política para o sector dos transportes que é absolutamente criminosa. A milhões de portugueses, seja por via do agravamento dos preços, seja por via da eliminação de serviços, será negado o direito à mobilidade. No plano económico é a expropriação ao povo português de empresas estratégicas para o desenvolvimento do país, é a demissão completa do Estado da sua intervenção por via das empresas públicas de transportes no papel estruturante que estas têm para o transporte de mercadorias e passageiros, para o combate ao défice energético, para a sustentabilidade ambiental, para o planeamento urbano, para a defesa do emprego com direitos. Um papel que nenhum grupo económico assume ou assumirá. Um papel que ficará submetido aos interesses do lucro máximo, da exploração máxima, que só serve ao capital.

5. Ao longo dos últimos meses os trabalhadores do sector dos transportes têm dado provas de uma enorme coragem e combatividade na defesa dos seus direitos e das empresas públicas, uma luta que é convergente com a luta das populações e das comissões de utentes pelo direito à mobilidade, e que se insere, por sua vez, no combate mais geral contra o Pacto de Agressão que está em curso. Para o PCP, a única forma de travar esta política de desastre nacional, que ameaça a implosão de todo um sistema de transportes públicos, é por via da intensificação da luta de trabalhadores e utentes por aquilo que é seu, que é do país, e que não pode nem vai ficar nas mãos de um punhado de capitalistas que se julgam donos de Portugal.

O PCP, solidário com essa luta, intensificará a sua acção de denúncia e combate a todas e cada uma dessas medidas, na certeza de que, mais cedo do que tarde, estas acabarão por ser derrotadas.

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