Projecto de Lei N.º 268/XIV/1.ª

Consagra a obrigatoriedade do subsídio de refeição

... procedendo à 15.ª alteração ao Código do Trabalho, aprovado pela Lei n.º 7/2009, de 12 de fevereiro

Exposição de Motivos

Ao longo de décadas os trabalhadores, organizados pelos seus sindicatos de classe, lutaram pela manutenção e conquista de direitos. Desde a redução da jornada de trabalho, passando pelos aumentos e valorizações salariais, por benefícios sociais, até ao aumento das garantias e da proteção face ao patronato. Nada aos trabalhadores foi dado de “mão beijada”, tudo foi conquistado pela sua luta, pela sua persistência de todos os dias nas empresas e locais de trabalho.

Elemento densificador e aglutinador das conquistas sociais e laborais e fonte primaz do Direito do Trabalho são as convenções coletivas de trabalho. Nelas persistem, apesar dos ataques dos sucessivos Governos e do patronato, as conquistas e os resultados das lutas de décadas dos trabalhadores portugueses.

Exemplo dessas conquistas é a instituição, na maioria das convenções coletivas, do direito ao recebimento de um subsídio de refeição que visa “(...) compensar os trabalhadores das despesas com a refeição principal do dia em que prestam serviço efetivo, tomada fora da residência habitual.” (1)

No entanto, e apesar dessa consagração na grande maioria das convenções coletivas de trabalho, fruto dos sucessivos ataques perpetrados pelo sucessivos Governos e pela sua política de direita, a aplicação da contratação coletiva não é tão alargada como deveria, não alcança o número de trabalhadores que seria desejável, não se aplica a todos os trabalhadores que dela deveriam beneficiar.

Se a todos e cada um dos trabalhadores da Administração Pública é aplicável o direito ao subsídio de refeição, graças às suas lutas e justas reivindicações, no setor privado o mesmo não acontece.

Um direito que é já considerado essencial, inerente e incindível da prestação do trabalho, deve ser universal e aplicável a todos os trabalhadores.

Numa fase em que tanto se fala de aumento das remunerações dos trabalhadores, de aumentos salariais transversais, não descurando nem substituindo o necessário e urgente aumento geral dos salários, assim como a subida do salário mínimo nacional para o valor de 850,00€, a universalização e garantia do direito ao pagamento do subsídio de refeição poderá ser um passo, tendo em vista esse objetivo final.

Não só aos trabalhadores abrangidos pela contratação coletiva é garantido o direito ao pagamento do subsídio de refeição, também aqueles a quem esta não é aplicável e que, por essa via, recai sobre o Governo o ónus de emissão de Portaria de Condições de Trabalho, têm direito a subsídio de refeição. Disso é exemplo a Portaria de Condições de Trabalho para os trabalhadores administrativos publicada no Diário da República n.º 119/2018, Série I de 2018-06-22 com o n.º 182/2018 e com alterações introduzidas pela Portaria n.º 411-A/2019 publicada no Diário da República n.º 251/2019, 1º Suplemento, Série I de 2019-12-31. Nesta Portaria é determinada a existência de subsídio de refeição de valor, a partir de 1 de janeiro de 2020, de 4,80 €. Se o Governo reconhece, e justamente, o direito destes mais de 100.000 trabalhadores ao subsídio de refeição, também o reconhecerá, certamente, a todos os outros trabalhadores do setor privado a quem não é aplicável nenhum IRCT, contribuindo, certamente e de forma decisiva, para a sua universalização.

Não negamos a existência de realidades que são marcadas por valores miseráveis de subsídio de refeição e mesmo por trabalhadores que, pelos mais diversos motivos (como por exemplo, a caducidade da contratação coletiva) não têm este direito salvaguardado. Por isso, para além de definir como limiar mínimo do valor do subsídio o praticado para os trabalhadores da Administração Pública, determina também a revisão e atualização anual destes valores definida com as organizações representativas dos trabalhadores. Esta atualização anual tem, igualmente, como objetivo a garantia de que ao determinar que o valor de referência do subsídio é o auferido pelos trabalhadores da Administração Pública, não servirá, no futuro, como argumento para que estes não vejam o seu subsídio de refeição atualizado de forma justa.

O PCP defende (e tem intervindo nesse sentido) que a contratação coletiva deve ser valorizada e reforçada, deve ser posto fim à sua caducidade para assim reforçar direitos laborais, incluindo o direito ao subsídio de refeição, por isso prevê que podem as normas agora propostas ser alteradas por IRCT, desde que, e sempre, em sentido mais favorável aos trabalhadores.

Assim, ao abrigo da alínea b) do artigo 156.º da Constituição da República Portuguesa e da alínea b) do n.º 1 do artigo 4.º do Regimento da Assembleia da República, o Grupo Parlamentar do PCP apresenta o seguinte Projeto de Lei:

Artigo 1.º

Objeto

A presente lei procede à 15 ª alteração ao Código do Trabalho, aprovado em anexo à Lei n.º 7/2009, de 12 de Fevereiro, que aprova a revisão do Código do Trabalho, com as alterações introduzidas pela Lei n.º 105/2009, de 14 de setembro, pela Lei n.º 53/2011, de 14 de outubro, pela Lei n.º 23/2012, de 25 de junho, pela Lei n.º 47/2012, de 29 de agosto, pela Lei n.º 69/2013 de 30 de agosto, pela Lei n.º 27/2014, de 08 de Maio, pela Lei n.º 55/2014, de 25 de Agosto, pela Lei n.º 28/2015, de 14 de Abril, Lei n.º 120/2015, de 01 de setembro, pela Lei n.º 8/2016, de 01 de Abril, Lei n.º 28/2016, de 23 de Agosto, Lei n.º 73/2017, de 16 de agosto e da Lei n.º 14/2018, de 19 de março e pela Lei 93/2019 de 4 de setembro, consagrando a obrigatoriedade do subsídio de refeição.

Artigo 2.º

Alterações ao Código do Trabalho

Os artigos 3.º e 154.º do Código do Trabalho, na sua redação atual, passam a ter a seguinte redação:

«Artigo 3.º

Relações entre fontes de regulação

  1. [...].
  2. [...].
  3. [...]:
    1. [...];
    2. [...];
    3. [...];
    4. [...];
    5. [...];
    6. [...];
    7. [...];
    8. [...];
    9. [...];
    10. [...];
    11. [...];
    12. [...];
    13. [...];
    14. Subsídio de refeição, respetivo valor e condições de atribuição e pagamento.
  4. [...].
  5. [...].

(....)

Artigo 154.º

Condições de trabalho a tempo parcial

  1. [...].
  2. [...].
  3. [...]:
    1. [...];
    2. Ao subsídio de refeição, no montante praticado na empresa e em valor não inferior ao valor pago aos trabalhadores em funções públicas ou no montante previsto em instrumento de regulamentação coletiva de trabalho, caso seja mais favorável, com exceção das situações em que o período normal de trabalho diário seja inferior a 5 horas ou metade da jornada de trabalho diária, conforme for mais favorável ao trabalhador, casos em que o valor do subsídio de refeição a pagar é proporcional às horas de trabalho efetivamente prestadas.
  4. [...].»

Artigo 3.º

Aditamento ao Código do Trabalho

Ao Código do Trabalho, na sua redação atual, é aditado um novo artigo 259.ºA, com a seguinte redação:

«Artigo 259.º-A

Subsídio de Refeição

  1. O trabalhador tem direito a um subsídio de refeição diário a pagar pela entidade patronal, por cada dia em que preste, pelo menos, 4 horas de trabalho ou metade da jornada de trabalho diária, conforme for mais favorável ao trabalhador.
  2. O valor do subsídio referido no número anterior não pode ser inferior ao estabelecido para os trabalhadores em funções públicas, sem prejuízo de valores superiores já praticados.
  3. O montante previsto no número anterior pode ser substituído pelo fornecimento da refeição em espécie, de igual valor.
  4. O subsídio de refeição é pago na totalidade a todos os trabalhadores cujo período normal de trabalho seja igual ou superior a 4 horas ou metade da jornada de trabalho diária, conforme for mais favorável ao trabalhador.
  5. Considerando o previsto no n.º anterior, no caso de trabalhador cujo período normal de trabalho seja inferior 4 horas ou a metade da jornada de trabalho diária, conforme for mais favorável ao trabalhador, o valor de subsídio de refeição a pagar é proporcional às horas de trabalho efetivamente prestadas.
  6. O valor do subsídio de refeição é atualizado anualmente, devendo essa atualização ser definida com as organizações representativas dos trabalhadores.
  7. São asseguradas ao subsídio de refeição a mesma proteção e garantias aplicáveis à retribuição do trabalhador.
  8. O disposto no presente artigo só pode ser afastado por instrumento de regulamentação coletiva de trabalho que disponha em sentido mais favorável aos trabalhadores.
  9. Constitui contra-ordenação muito grave a violação do disposto neste artigo.»

Artigo 3.º

Entrada em vigor

A presente lei entra em vigor no dia seguinte ao da sua publicação.

Nota:

(1) Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça de 27-11-2017, Proc. N.º 2766/17.4T8LSB.L1.S1, disponível em www.dgsi.pt

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