Intervenção de

Comunidades Portuguesas - Intervenção de Bernardino Soares na AR

Criação dos órgãos representativos dos portugueses residentes no estrangeiro

Sr. Presidente,
Sr. Secretário de Estado,

Penso que a consideração do Governo pelo Conselho das Comunidades Portuguesas está na prática e na proposta que apresenta.

Está na prática do seu não apoio às comunidades portuguesas, através de uma política que tem vindo a diminuir a capacidade de apoio a estas comunidades. O Governo nem tem cumprido compromissos assumidos em situações de crise e mais dramáticas, como o caso da Holanda, em que se comprometeu a que, a partir de agora, haveria uma fiscalização muito grande das empresas que colocam trabalhadores, haveria um acompanhamento muito sério, do ponto de vista social, dos trabalhadores aí deslocados, mas constatamos que as situações de trabalho ilegal, de abuso de direitos destes trabalhadores continuam a repetirse, sem que o Governo tenha criado os mecanismos para acompanhar esta situação.

Mas se falarmos da reestruturação consular, e quis o Governo - não foi o destino, foi o Governo -, no dia em que discutimos esta matéria (não sei se de propósito ou sem querer), aprovar a resolução do Conselho de Ministros, que define os princípios orientadores das reforma consular, que é aquela sobre a qual o Governo não ouviu devidamente e em tempo oportuno o Conselho das Comunidades das Portuguesas, como o próprio Conselho exprimiu aos grupos parlamentares, embora o Governo certamente vá dizer certamente que «se trata apenas de um projecto e que, portanto, ainda estarão a tempo de ser ouvidos nesta matéria».

Na verdade, o que o Governo está a fazer, em matéria de reestruturação consular, é a aplicar o PRACE (Programa de Reestruturação da Administração Central do Estado) também quanto ao apoio às comunidades portuguesas no estrangeiro, é a aplicar o PRACE sem sensibilidade para as situações criadas em cada comunidade.

Este Governo consegue o feito único de, para além da contestação à sua política no seu próprio País, bem expressa nas 150 000 pessoas que se manifestaram em Lisboa há uns dias, haver contestação ou manifestações e outros justos protestos até no estrangeiro, como vai acontecer em França nos próximos dias.

É o Governo que atinge «o pleno» da contestação em relação às suas políticas, no plano interno e no plano externo.

Finalmente, como disse no início, a consideração do Governo pelo Conselho das Comunidades está na prática e também está na proposta, porque o Governo refere no preâmbulo da proposta que quer fugir à ideia de um Conselho das Comunidades relacionado com as organizações não governamentais ou circunscrito à representatividade das organizações não governamentais, mas quer aproximá-lo - isso sim, belos princípios!... - dos portugueses no estrangeiro, das suas comunidades efectivas e ser essa a sua representação fundamental. Mas como é que o Governo o faz? Com menos eleitos pelas comunidades portuguesas propriamente ditas, com menos eleitos directamente pelas comunidades!!

Portanto, no preâmbulo o Governo diz que quer maior proximidade dos portugueses que, actualmente, elegem os conselheiros das comunidades e, depois, no articulado, estabelece uma limitação em relação a esse carácter electivo de uma parte dos membros do Conselho das Comunidades, para além da diminuição, chamada drástica pelo PSD, mas que é um bocadinho mais drástica do que a medida drástica que o próprio PSD também propõe no seu projecto de lei.

Portanto, esta é a política do Governo: a prática e a proposta. O que tememos é que esta proposta, aprovada nos termos em que está, venha a consagrar a ideia e a prática de que o Conselho das Comunidades não tem outro fim se não o de ser uma «peninha no chapéu» do secretário de Estado em função em cada momento. É contra esta concepção que nos insurgimos, apresentando um projecto de lei que vai contra essa ideia e que procura uma verdadeira representatividade dos conselheiros e inserção nas suas comunidades, para que sejam ouvidos e escutados a todos os níveis - consulares, por país, a nível regional e a nível da política do Governo português - em matéria de definição da política para as comunidades portuguesas.

(...)

Sr. Presidente,
Srs. Membros do Governo,
Srs. Deputados:

Na opinião do PCP, o Conselho das Comunidades Portuguesas é um órgão muito importante para a política para as comunidades e para a defesa e o apoio aos portugueses no estrangeiro.

É por isso que, ao longo dos anos, temos pugnado pela inserção no texto constitucional deste órgão tão importante, para o valorizar e para lhe garantir um estatuto adequado, mesmo a nível constitucional, no artigo em que se refere ao apoio dos portugueses no estrangeiro.

É por esta razão, e também por outras muito importantes para a política das comunidades, que temos vindo a propor sucessivamente, no Orçamento do Estado, a inclusão de uma verba para o recenseamento dos portugueses no estrangeiro, o que seria muito importante para a definição dos colégios eleitorais para o Conselho das Comunidades Portuguesas e também para a adequação da rede consular à realidade concreta da presença dos portugueses no estrangeiro - matérias que têm vindo a ser chumbadas, ora pelo PS, ora pelo PSD, ora por ambos, como, aliás, acontece em relação a muitas outras áreas da vida política nacional.

O projecto de lei do PCP apresentado hoje a debate é um diploma que valoriza o Conselho das Comunidades Portuguesas como órgão representativo e com importância para a definição da política para as comunidades portuguesas e aposta na sua proximidade em relação aos portugueses no estrangeiro e às suas próprias comunidades.

Estamos contra uma ideia de centralização apenas no conselho anual mundial para a discussão destas matérias. Entendemos que é preciso - a nível consular, a nível de país, a nível regional - manter a organização de comissões e de conselhos que permitam o debate e a intervenção nos problemas concretos daquelas comunidades, em cada região ou em cada país. Mas o Governo não quer isso! O Governo troca isso por uma representação a nível do conselho das comunidades, que depois se desagrega em comissões, que, certamente, podem ter um trabalho importante, mas não são mais importantes do que a proximidade, a intervenção concreta e a possibilidade de intervir junto da estrutura consular em representação dos interesses das comunidades. Portanto, o Governo troca isso, o que não é aceitável!

Quanto à reestruturação, Sr. Secretário de Estado, o que eu disse não foi que o Governo não ouviu o Conselho das Comunidades Portuguesas em matéria da proposta que hoje aqui apresenta. O que eu disse foi que o Governo não ouviu o Conselho das Comunidades Portuguesas em relação à reestruturação consular.

Só ouviu após o anúncio das principais linhas orientadoras. É por isso que digo, Sr. Secretário de Estado, que, se ainda tiver tempo (que o PS certamente lhe vai dar), o senhor vai dizer que era apenas um projecto e que, portanto, nada havia a perguntar ao Conselho das Comunidades Portuguesas e que, posteriormente, o Conselho foi ouvido. Mas o que os conselheiros disseram aos grupos parlamentares desta Casa é que é inaceitável - e nós subscrevemos isso - que, numa matéria essencial para as comunidades portuguesas no estrangeiro, o Governo não tenha, em primeiro lugar, ouvido o Conselho das Comunidades Portuguesas. E este é um aspecto do qual o Sr. Secretário de Estado não se livra!

Sr. Secretário de Estado, é evidente que tem de haver uma reestruturação consular. É evidente que estas realidades não podem ser imutáveis e têm de acompanhar - coisa que o Governo não faz - a evolução da emigração portuguesa, que hoje se faz de formas e para destinos diferentes de há uns anos atrás.

Aliás, referi-me a isso na intervenção que fiz há pouco. Só que a reestruturação que os senhores propõem não corresponde a nada disso! Corresponde a uma sigla: PRACE!

É isso que significa esta reestruturação consular! É o PRACE para as comunidades! É encolher os serviços, é reduzir o apoio às comunidades portuguesas, poupando, assim, uns «cobres», se me permite a expressão, Sr. Secretário de Estado, mas deixando mais desguarnecidos muitas centenas de milhares de cidadãos portugueses, que merecem o apoio do Estado português, tal como está previsto no artigo 14.º da Constituição.

É isto que está em causa neste debate!

Claro que a solução que criticamos nesta proposta de lei tem a ver com a composição do Conselho das Comunidades Portuguesas. De facto, o Governo pretende um Conselho das Comunidades muito mais reduzido, em que uma parte dos seus membros deixe de ser directamente eleita pelas comunidades, tal como o PSD propõe uma redução do Conselho das Comunidades e que uma boa parte dos 80 membros que o PSD propõe (neste caso, 20) sejam eleitos pela Assembleia da República, o que certamente dará uma indicação predominante pelo PS e pelo PSD, que não sei o que traz de positivo para o Conselho das Comunidades Portuguesas. O que é positivo para o Conselho das Comunidades Portuguesas é a sua ligação às comunidades, e essa não se faz pela eleição ou por qualquer acordo do bloco central, entre o PS e o PSD.

Registo também que o Governo propõe uma drástica redução das competências do Conselho das Comunidades. Isto é, transforma as atribuições previstas actualmente na lei, que eram muito amplas e espelhavam uma presença do Conselho das Comunidades em todas as matérias que às comunidades portuguesas diziam respeito num artigo de competências apenas - e já não de atribuições, o que é bastante diferente -, muito reduzidas, embora algumas com carácter genérico. Ora, é esta diminuição das competências do Conselho das Comunidades que também caracteriza esta proposta de lei do Governo.

 

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