Comunicado do Comité Central do PCP, de 16 de Janeiro de 2001

O Comité Central do Partido Comunista Português reunido a 16 de Janeiro de 2001 procedeu à análise das eleições presidenciais, da situação política e social, e das tarefas decorrentes da situação actual visando potenciar e concretizar orientações e decisões do XVI Congresso designadamente no desenvolvimento da luta de massas e no reforço da intervenção, da organização e da iniciativa política do Partido.

1. Eleições presidenciais

O Comité Central do PCP sublinha e valoriza a acção desenvolvida pelo candidatura de António Abreu que com grande dignidade, seriedade e força de convicções afirmou os principais objectivos a que se tinha proposto no quadro particularmente complexo destas eleições.

O resultado obtido constitui - em eleições muito específicas e num contexto concreto muito difícil, onde um único candidato é eleito e este ano, um se apresentava à partida como vencedor antecipado - uma expressão da capacidade de mobilização e afirmação do PCP.

O Comité Central saúda todas as Organizações e militantes do PCP e da JCP e os muitos milhares de simpatizantes que desde a primeira hora se associaram a esta candidatura e que à nossa campanha se entregaram com entusiasmo ou que, ao longo dela, fizeram chegar tantas palavras de estímulo, e salienta a importante e decisiva dinâmica imprimida em resposta à decisão tomada de confirmar a ida às urnas a poucos dias do acto eleitoral.

Esta candidatura desempenhou um papel insubstituível no debate político das presidenciais, na afirmação diferenciada dos valores que apresentou e no espaço que preencheu trazendo para o debate os principais problemas que afectam e preocupam os trabalhadores e o povo português, na mobilização do eleitorado para a sua participação cívica e eleitoral.

A candidatura de António Abreu defendeu e expressou pontos de vista, ideias, valores e propostas essenciais para dar corpo a uma política de esquerda correspondente às necessidades nacionais e a profundas aspirações de valorização do trabalho e dos trabalhadores, de igualdade de direitos para as mulheres, de justiça social, de fortalecimento da democracia, de desenvolvimento nacional, de afirmação dos interesses de Portugal no processo de construção europeia e no plano internacional. Sustentou com clareza uma concepção do exercício das funções de Presidente da República activamente vinculada aos valores e ao projecto constitucional e dotada de efectiva autonomia, independência e espirito crítico face ao governo. E, ponto fundamental, pela sua intervenção e propostas testemunhou a independência política e ideológica do PCP em relação a todos os outros candidatos em presença, assim afirmando a clara e total autonomia e identidades políticas próprias do PCP nesta batalha eleitoral.

A decisão do PCP de levar até às urnas a candidatura de António Abreu, para além do significado político que comporta, tem o alto valor democrático de ter aberto e proporcionado a mais de 220 mil eleitores e a possibilidade de um voto inteiramente conforme com a sua consciência, vontade e opções programáticas que, de outro modo, com grande probabilidade se teria deslocado para a abstenção, ou para votos nulos ou brancos. A decisão tomada permitiu uma votação que, não correspondendo à real influência eleitoral do PCP, exprime de forma clara uma exigência critica sobre o segundo mandato de Sampaio. O PCP saúda estes eleitores que deram voz a um assumido movimento de afirmação de valores e de um projecto de justiça e progresso social.

O Comité Central está convicto que os eleitores do PCP que votaram em Jorge Sampaio, essencialmente movidos pelo desejo da derrota de Ferreira do Amaral logo à primeira volta, continuam a confiar no PCP e nas causas e valores por que se bate. Assim como podem esses eleitores estar certos que contamos com eles para as batalhas que prosseguem e para a luta por uma nova política e por uma alternativa de esquerda.

A reeleição de Jorge Sampaio, marcada por um grande e muito preocupante nível de abstenção (expressão entre outros factores da continuada não resolução dos problemas e do fomento da resignação e conformismo), confirmou um resultado que antecipadamente se apresentava previsível e veio comprovar as adquiridas vantagens eleitorais num candidato que culminava o seu primeiro mandato presidencial.

O Comité Central do PCP chama a atenção para as leituras e aproveitamento que alguns, iludindo as características particulares e a especificidade destas eleições, tentam ilegitimamente tirar destes resultados conclusões assentes numa estreita lógica partidária. Pela nossa parte não contribuiremos para apreciações que assente em critérios de calculismo e conveniência de momento, acabem por consentir que o resultado de Jorge Sampaio seja absurdamente interpretado como uma "reabilitação" ou recuperação do PS e da política do Governo que manifestamente não se verifica.

O projecto, propostas e valores que a intervenção da candidatura do PCP deu expressão perdurarão para além destes eleições na exigência de uma nova política e encontrão projecção no desenvolvimento da acção e de luta futura por uma vida melhor e mais justa e nas próximas tarefas e batalhas políticas a que o PCP será chamado.

2. A situação política e social e o desenvolvimento da luta de massas

O Governo PS vem confirmando nas questões mais estruturantes a sua política de direita comprometendo assim as possibilidades de assegurar um desenvolvimento progressivo e sustentado num quadro de independência e soberania nacional.

Na recente cimeira de Nice o Governo, acompanhado uma vez mais pelo PSD e o CDS/PP, subscreveram alterações institucionais cuja natureza fundamental aprofunda a via federal da U.E. e que no imediato se traduzem pela perda de influência e do poder do nosso país. A Alemanha, França e Reino Unido viram reforçados o seu poder no Conselho Europeu o que se traduzirá na prática na possibilidade de inviabilizarem ou bloquearem qualquer decisão; foi abolido em importantes matérias o principio do voto por unanimidade eliminando assim na prática o direito de veto em políticas como os fundos estruturais e comerciais; foi reduzido o número de deputados portugueses no Parlamento Europeu num quadro em que os cinco maiores países, num total de 27 somam 365 deputados em 732, ou seja, ficam a 1 deputado dos 50% e a 2 da maioria absoluta. Por outro lado, novos passos foram dados visando a consagração da União Europeia como pilar europeu da NATO numa lógica de militarização da U.E. que não serve a paz , o desenvolvimento e a construção de uma Europa social.

Ao sustentar que o resultado da Cimeira foi o "melhor possível" o Primeiro Ministro não tardará a vir lamentar hipocritamente o previsível agravamento dos problemas económicos e sociais do País sacudindo as responsabilidades que lhe cabem por ter dado aval a decisões que se traduzem na efectiva perda de poderes de Portugal no quadro da União Europeia.

Esta postura vem também no seguimento de outras como foi o caso do comprometimento do País na guerra da Nato contra a Jugoslávia que, como o caso do urânio empobrecido mais o evidencia, nunca foi "asséptica", "cirúrgica" ou "humanitária".

O PCP ao mesmo tempo que expressa a sua solidariedade para com a população dos Balcãs vítima dos bombardeamentos, reafirma a sua reclamação há muito formulada da saída dos militares portugueses do Kosovo não só pela firme oposição a esta presença como também por medida de precaução e garantia de defesa da vida e da saúde dos militares e policias aí destacados. E por maioria de razão o não envio de novos contigentes. Neste sentido o Grupo Parlamentar do PCP apresentou na Assembleia da República um projecto de resolução cujo agendamento foi significativamente protelado pelo PS.

O que está a passar-se em Portugal e muito outros países da Europa em relação com a morte e doença de militares enviados para os Balcãs e a utilização de munições com urânio empobrecido, constitui um vigoroso alerta quanto aos perigos gravíssimos decorrentes da política agressiva dos EUA e da NATO e do acelerado processo de militarização da União Europeia, que na Cimeira de Nice conheceu novos desenvolvimentos. O PCP considera da maior importância multiplicar as acções e fortalecer o movimento contra as armas nucleares e pelo desarmamento, pelo progressivo desvinculamento de Portugal da NATO e pela sua dissolução, contra a militarização da U.E., por uma política externa patriótica e independente, de paz, amizade e cooperação com todos os povos.

No quadro da situação política decorrente das eleições presidenciais, as tentativas já em curso para retomar artificialmente o processo de alteração à legislação eleitoral a pretexto da abstenção e do alegado distanciamento entre eleitos e eleitores, passando precisamente ao lado das razões mais fundas que têm origem nos conteúdos da acção política e governativa e no desrespeito pelos compromissos eleitorais assumidos, não deixam de constituir um acto deliberado para, aproveitando-se dessa mesma abstenção que dizem querer combater, tentar impor soluções que constituiriam um novo factor de empobrecimento democrático e de distanciamento político de muitos cidadãos.

No plano económico o Governo do PS prossegue a destruição do aparelho produtivo nacional e o desmantelamento do Sector Empresarial do Estado designadamente pela via da privatização total dos sectores das Comunicações, electricidade, do gás e petrolífero, Cimenteiro e do Papel, por novas privatizações no sector Aéreo e Ferroviário, pela desactivação da Siderurgia Nacional e dos Estaleiros Navais da Margueira.

No plano social agravam-se as condições de vida dos portugueses e em particular dos trabalhadores face ao recente aumento dos bens de primeira necessidade, nomeadamente de alimentação, da habitação, dos combustíveis, das portagens e da electricidade e às fortes pressões para conter e desvalorizar os salários assumindo o próprio Governo o papel, através dos baixos aumentos salariais impostos na Administração Pública, de dar força às confederações do grande patronato.

Tal como o PCP tinha afirmado e denunciado, a taxa de inflação já ultrapassou as metas do Governo como indicam os últimos dados, absorvendo os aumentos salariais nominais o que coloca a exigência de reposição do poder de compra dos trabalhadores.

O PCP na sua intervenção política e iniciativa legislativa não regateará esforços para trazer à ordem do dia a exigência do respeito pela efectiva liberdade de negociação e contratação colectiva postas em causa pelo Governo no processo negocial com as organizações dos trabalhadores da Administração Pública e pela prática de associações patronais, em diversos sectores.

Na área da justiça e em particular na justiça do trabalho o Governo, em vez de dar combate à morosidade dos processos, tomou medidas que redundam em prejuízos dos trabalhadores agravando as condições em que estes exercem os direitos de acesso à justiça.

Nos últimos tempos salientam-se as acções e lutas de diversos sectores. Os trabalhadores das minas de Neves Corvo, da TAP, dos têxteis, vestuário e calçado, os professores contratados e os da protecção da natureza desenvolveram fortes lutas e significativos protestos por melhores salários e pelo emprego com direitos.

No conjunto de diversos sectores milhares de cadernos reivindicativos foram aprovados por trabalhadores dando mais sustentação e dinâmica à primeira fase da negociação de importantes contratos colectivos na industria, transportes e comércio. Mais de 700 trabalhadores da Siderurgia Nacional ameaçados de despedimento colectivo preparam acções de denúncia e de protesto.

Numa fase crucial do desenvolvimento da acção reivindicativa, perante situações tendentes ao agravamento do desemprego e da precariedade o Comité Central do PCP apela à intervenção e participação dos militantes e organizações do Partido na luta por melhores condições de vida, pelos direitos das mulheres, pela valorização dos salários, pelo emprego, contra a precariedade e os despedimentos, por melhores pensões e reformas.

No quadro da iniciativa política e legislativa decorreu neste período a discussão e aprovação da lei que reforma os impostos sobre o rendimento, processo desencadeado pelo PCP através do seu Grupo Parlamentar. Pela justeza das propostas do PCP e pelo seu empenhamento e persistência nas alterações a lei. ficando aquém nalguns aspectos do que seria desejável, irá traduzir-se a ser aplicada em mais justiça e equidade fiscal. Haverá menos evasão fiscal, as mais valias mobiliárias e imobiliárias passarão a pagar imposto, o sistema bancário e as sociedades gestoras de participações sociais verão fortemente reduzidos os privilégios ilegítimos de que usufruíam.

O PCP considera que estes avanços se devem reflectir, no futuro próximo, no desagravamento fiscal sobre os rendimentos dos trabalhadores e da generalidade das famílias portuguesas.

O agendamento para discussão na A.R. de um Projecto-lei do PCP visando alterar algumas das normas mais gravosas da lei dos contratos a prazo, corresponde a mais uma contribuição para dar combate à precariedade e à efectivação dos direitos dos trabalhadores e trabalhadoras.

Como Partido de luta e de proposta o PCP continuará a corresponder aos legítimos anseios e reivindicações dos trabalhadores e do povo português, estimulando e empenhando-se na luta, com propostas sérias na perspectiva da construção dum política diferente e da alternativa de esquerda.

3. Tomar a iniciativa, reforçar o Partido, alargar a sua influência

O Comité Central assinala o êxito que constituiu o XVI Congresso. O Congresso diferente de um Partido diferente, que no seguimento de uma viva discussão no colectivo partidário reafirmou de forma inequívoca a sua identidade comunista e traçou as linhas de trabalho para o seu reforço e alargamento de influência, como Partido necessário, indispensável e insubstituível aos trabalhadores, ao povo e ao País, na luta por uma alternativa de esquerda, por um projecto de democracia avançada e pelo socialismo para Portugal.

O CC marca para os próximos dias 3 e 4 de Fevereiro uma nova reunião para definição do plano de acção partidária e decisão de aspectos do trabalho de direcção decorrentes do XVI Congresso.

O Comité Central aponta para a importância da realização de reuniões e plenários dos organismos e organizações partidárias para a definição das acções necessárias à concretização das orientações do XVI Congresso na área em que intervêm e dos respectivos planos de actividade e apela à dinamização da acção partidária nas diversas frentes.

O Comité Central salienta desde já as seguintes linhas e áreas de acção:

- A programação de uma linha de acções de reforço do Partido, com destaque para uma ampla intervenção junto da classe operária e dos trabalhadores, o reforço das células de empresa, o recrutamento de novos militantes a dinamização das organizações de base, a responsabilização de quadros, a realização de Assembleias das organizações e a concretização de uma vasta acção de contacto com os membros do Partido com inicio no mês de Março a propósito da entrega do novo cartão do Partido no sentido do esclarecimento de situações, da sua integração na acção partidária e do pagamento e actualização da quotização.

- O desenvolvimento de uma activa iniciativa política, da luta de massas em torno dos problemas mais importantes e mais sentidos pelos trabalhadores, pela juventude, pelas populações, designadamente no plano do aumento dos salários, dos direitos e rendimentos, do combate à subida dos preços, à degradação de serviços públicos e às privatizações, da defesa do emprego com direitos, contra a discriminação das mulheres trabalhadoras e pelo exercício dos seus direitos, e da exigência de uma resposta urgente e séria aos prejuízos causados pelos temporais que têm assolado o país.

- A promoção e apoio a acções de protesto contra o envolvimento de Portugal na política agressiva do imperialismo, contra a corrida aos armamentos, pela paz, pelo não envio de novos contigentes portugueses para os Balcãs e pelo regresso dos que aí se encontram estacionados, para que seja apurada a grave situação criada com o armamento do urânio empobrecido para que sejam assumidas responsabilidades, reparadas as situações e assistidas as vitimas. O Comité Central destaca neste âmbito a importância da Acção Pública de Protesto marcada para o dia 25 de Janeiro, junto da residência do Primeiro Ministro.

- O Comité Central do PCP sublinha como tarefa de maior importância a intensificação da preparação das Eleições Autárquicas a realizar no final do corrente ano, e apela ao conjunto das organizações para que se empenhem no lançamento de uma forte campanha de dinamização da CDU, com vista à sua afirmação e alargamento, contribuindo pela sua acção e iniciativa para a aproximação e comprometimento de muitos milhares de independentes que vêm na CDU e no seu projecto a mais sólida contribuição para a defesa dos interesses das populações, a resolução dos seus problemas e o progresso e desenvolvimento das suas terras, vilas e cidades. Assume neste quadro tarefa de maior significado e reforço da informação e valorização da obra realizada no poder local pelos eleitos da CDU, o aprofundamento da concretização do seu projecto de desenvolvimento das freguesias e concelhos, e a preparação das listas a apresentar nas próximas eleições. Correspondendo à importância e significado desta batalha política e eleitoral o Comité Central do PCP decidiu convocar uma iniciativa nacional sobre as eleições autárquicas para o próximo dia 5 de Maio.

- O Comité Central decide promover uma Campanha Nacional de Fundos de 250 mil contos e apela a todas as organizações e militantes para uma activa participação na concretização deste objectivo. O Comité Central considera que no conjunto das iniciativas partidárias nos próximos tempos, devem merecer particular atenção a preparação e organização das comemorações do 70º Aniversário do "Avante!" e dos 80 anos da fundação do Partido, bem como a realização da 25ª Festa do "Avante!" nos dias 7,8 e 9 de Setembro, imprimindo uma maior dinamização à organização partidária, alargando os contactos com muitos militantes e democratas independentes que colaboram com o Partido.

O Comité Central apela às Organizações do Partido para que as comemorações do 80ª Aniversário do Partido, assentes numa grande diversidade de pequenas e grandes iniciativas, sejam uma importante jornada de intervenção política, de divulgação e afirmação dos valores e do projecto do PCP, que contribua para alargar a sua influência e para a sua confirmação como Partido da liberdade, da democracia e do socialismo.