Intervenção de João Oliveira na Assembleia de República

Comissão Eventual de Inquérito Parlamentar relativa à Relação do Estado com a Comunicação Social

Comissão Eventual de Inquérito Parlamentar relativa à Relação do Estado com a Comunicação Social e, nomeadamente, à Actuação do Governo na Compra da TVI (http://www.parlamento.pt/ActividadeParlamentar/Paginas/DetalheIniciativa...) Sr. Presidente, Sr. Ministro, Sr.as e Srs. Deputados: Discutimos a constituição desta comissão de inquérito no momento em que o País e os portugueses vivem gravíssimos problemas económicos e sociais como resultado da política de direita resolvida pelo Governo do PS. No momento em que fazemos esta discussão importa começar com esta referência para deixar bem claro que da parte do PCP não precisamos de fazer nem faremos desta comissão de inquérito um instrumento de prova da nossa oposição às políticas do Governo. Não iremos ceder a tentativas de instrumentalização que procurem reduzir a oposição ao Governo a esta comissão de inquérito nem iremos ceder a lógicas mediáticas que procurem esconder por detrás desta comissão de inquérito a convergência objectiva com o Governo que outros partidos desta Assembleia da República têm realizado em matérias essenciais, essas sim, para o País, como aconteceu no último Orçamento do Estado aprovado na semana passada com a viabilização do PSD e do CDS. Queremos registar o nosso acordo com a constituição desta comissão de inquérito, particularmente tendo em conta a gravidade das informações que têm vindo a público nomeadamente nas audições que têm sido realizadas pela Comissão de Ética nos últimos tempos. Queremos destacar aqui o papel importantíssimo que têm tido estas audições da Comissão de Ética não só pela análise aprofundada de problemas que se verificam no sector da comunicação social, questões essas que têm que ver com a precariedade laboral a que os jornalistas estão sujeitos, mas que também têm que ver com tentativas de condicionamento por parte do Governo com o objectivo de garantir apenas a chamada «boa imprensa», as «boas notícias» para a imagem do Governo, recorrendo a todos os meios, silenciando jornalistas e órgãos de comunicação social eventualmente incómodos, numa estratégia que parece partir da definição daqueles que são os «grupos amigos da comunicação social», os «grupos amigos do Governo» e aqueles que não o são. De facto, estas audições na Comissão de Ética têm de ser valorizadas pela análise aprofundada que têm permitido em relação a estes problemas. A verdade é que, pelas respostas dadas, pelos silêncios assumidos e pelas contradições registadas, estas audições têm permitido à Assembleia da República confrontar-se com um conjunto de informação que, obviamente, tem também relevância no que diz respeito ao objecto desta Comissão de Inquérito. De facto, só por desatenção ou por deliberada intenção é que se podem compreender as palavras do Sr. Deputado Francisco de Assis, porque só assim é que se pode ignorar a gravidade das afirmações que têm sido feitas nestas audições. O Sr. Deputado afirma que, das audições, resulta claro que não há qualquer tentativa de condicionamento do Governo em relação à comunicação social, mas esse é um facto que não pode registar de acordo com o que tem sido dito nestas audições na Comissão de Ética. Sr. Deputado, quando temos tido, nesta Comissão de Ética, relatos concretos de intervenção directa do Sr. Primeiro-Ministro tentando evitar a publicação de notícias em jornais, tentando evitar que jornais levem por diante investigações em relação a processos judiciais em curso onde o Sr. Primeiro-Ministro é visado, tentado evitar a todo o custo que os rotundos falhanços da política deste Governo sejam notícia nos órgãos de comunicação social, não pode dizer que não há tentativas de condicionamento da comunicação social por parte do Governo. Quando temos assistido, nesta Comissão de Ética, a relatos concretos de como são utilizadas empresas públicas, mas também empresas privadas, grupos económicos privados, grupos financeiros privados nessas estratégias de condicionamento que o Governo tentou levar a cabo, o Sr. Deputado não pode dizer que não há factos que comprovem tentativas de condicionamento da comunicação social. Todos estes factos, Sr. Deputado, são da maior gravidade, porque põem em causa aspectos determinantes do Estado de direito democrático e têm obrigatoriamente de ser tidos em conta por esta Assembleia da República. Portanto, Sr. Deputado, quando ouvimos na Comissão de Ética respostas como, por exemplo, a que foi dada pelo Sr. Henrique Monteiro, Director do Expresso, que afirmou textualmente que neste país só não são condicionados os órgãos de comunicação social que à partida estejam alinhados com o poder político ou com o poder económico, consideramos que é uma exigência a constituição desta Comissão de Inquérito. Tal como consideramos que é uma exigência a constituição desta Comissão de Inquérito quando, no âmbito das audições que foram realizadas na Comissão de Ética, não ficaram explicados aspectos essenciais sobre negócios em concreto onde a intervenção do Governo é uma suspeita. Quando temos uma empresa pública com a dimensão da PT, onde há um administrador que tem a seu cargo pelouros como o imobiliário e outros conexos, que tem, como histórico da sua vida passada, o registo de ter sido dirigente do Partido Socialista mas não tem, do ponto de vista empresarial ou pessoal, qualquer característica especial que o indique como administrador para participar no negócio com a TVI e acaba envolvido nesse mesmo negócio, temos de saber porquê, Sr. Deputado. E não nos podemos conformar com respostas categóricas que, sem qualquer sustentação nos factos, nos digam que o Governo não teve intervenção. Temos de ter estas respostas e queremos saber por que é que isso aconteceu! Tal como queremos saber o que aconteceu na reunião do Conselho de Administração da PT do dia 25 de Junho, porque, das respostas que já obtivemos por parte de três administradores e do Presidente do Conselho de Administração, sabe o que resulta, Sr. Deputado Francisco de Assis? Resulta quatro respostas diferentes, com contradições nítidas entre elas e contradições entre o que foi a resposta dada pelo Presidente da Comissão Executiva na Comissão e na entrevista à RTP. Por todas estas dúvidas, Sr. Deputado, aquilo que pode esperar do PCP é uma postura séria e empenhada para apurar a verdade. Não é para embarcar em lógicas mediáticas de transformação desta Comissão de Inquérito na antecâmara de uma qualquer moção de censura, mas para apurarmos a verdade e os factos que, em torno destas questões, têm de ser apurados. E desses factos que vierem a ser apurados, da verdade que esperamos obter nesta Comissão de Inquérito, retiraremos as devidas consequências políticas, porque são essas que nos importam.

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