Intervenção de Paulo Raimundo, Secretário-Geral do PCP

Comício «A Europa de Paz, Cooperação e Progresso»

Uma calorosa saudação a todos os presentes nesta combativa iniciativa, promovida no âmbito do Grupo Confederal da Esquerda Unitária Europeia / Esquerda Verde Nórdica (GUE/NGL) – A Esquerda no Parlamento Europeu, que os deputados do PCP integram.

Gostaria de saudar de forma particular, a presença dos camaradas Bert de Belder, do Partido do Trabalho da Bélgica, da Vera Polycarpou, do AKEL, do Eduard Navarro, do Partido Comunista de Espanha e de Cyril Benoit, do Partido Comunista Francês.

A todos expresso o nosso profundo agradecimento pela sua participação, que muito enriqueceu esta iniciativa. Ficamos a conhecer mais sobre a realidade e os problemas com que se confrontam os trabalhadores e os povos dos seus respectivos países, ficamos a conhecer melhor as suas importantes lutas, às quais prestamos a nossa solidariedade.

Como compreenderão e nesta ocasião, gostaria de reafirmar a solidariedade dos comunistas portugueses para com a luta do povo cipriota. Uma luta pela reunificação da sua pátria, contra a ocupação turca – que este ano assinala 50 anos –, uma luta que tem como solução a criação de uma Federação Bicomunal e Bizonal, com uma única soberania, uma única personalidade internacional e uma única cidadania, com igualdade política.

A participação de camaradas da Bélgica, de Chipre, de Espanha e de França é expressão da cooperação entre partidos comunistas e outras forças de esquerda na Europa, nomeadamente no âmbito do Grupo Confederal GUE/NGL do Parlamento Europeu, que foi criado em 1994, com a particular contribuição do PCP.

Um grupo parlamentar que, no respeito pelas naturais diferenças entre as delegações que o integram, tem assumido importantes posicionamentos e propostas políticas que respondem a problemas sentidos pelos trabalhadores e os povos e dão voz às suas legítimas aspirações. Posicionamentos e propostas que ganham ainda mais valor, necessidade e significado no contexto da actual situação na Europa.

Daqui quero reafirmar-vos que contam com o empenho do PCP para dar continuidade a esta experiência de cooperação de âmbito institucional, no respeito dos princípios confederais que permitiram assegurar o funcionamento e a continuidade deste grupo parlamentar por cerca de 30 anos.

Peço-vos que transmitam aos vossos Partidos que o PCP está determinado e confiante na luta em defesa dos interesses dos trabalhadores e do povo português, na luta por uma Europa de paz, cooperação e progresso, por uma Europa dos trabalhadores e dos povos.

Ao escutarmos os nossos convidados internacionais, vemos grandes pontos de contacto com a realidade do nosso País, com os problemas que afectam o nosso povo, com as lutas que são levadas a cabo aqui em Portugal.

Aqui, como nestes países, os grupos económicos, os monopólios, as multinacionais, encontram na União Europeia um importante instrumento ao seu dispor.

Aqui, como nestes países, é sobre os trabalhadores e os povos que recaem os efeitos das políticas da União Europeia. Efeitos que se fazem sentir de forma particularmente intensa em Portugal.

Ao contrário do que diz e omite a intensa propaganda da ideologia dominante, os fundos comunitários e as chamadas “bazucas” não compensam, como nunca compensaram, tudo aquilo de que se abdicou e se está a abdicar no nosso desenvolvimento.

Desde 1996, Portugal recebeu em termos líquidos 72 mil milhões de euros de fundos comunitários, mas viu sair do País cerca de 126 mil milhões de euros em lucros, dividendos e juros. Entre o que entra e o que sai, Portugal tem vindo a ser cada vez mais prejudicado.

Com o Euro, o País só conheceu estagnação económica, contenção salarial, menos serviços e investimento públicos.

O País perdeu soberania monetária com todas as consequências que aí estão e que ficaram muito evidentes durante o Pacto de Agressão das Troikas ou na forma como se expressa hoje no brutal agravamento das taxas de juro decretadas pelo Banco Central Europeu.

A Política Agrícola Comum de Bruxelas paga a uns para não produzir, favorece os grandes proprietários e obriga o País a comprar ao estrangeiro o que antes produzia.

Há hoje em Portugal menos 5,82% de explorações agrícolas do que há 10 anos. Menos 52% do que em 1999. Menos 80% do que em 1989.

Em 2022, o rendimento dos agricultores caiu 11,2% e os lucros da grande distribuição dispararam – para a Jerónimo Martins e a Sonae foram cerca de 3 milhões de euros por dia.

A CEE/UE pagou para se arrancar videiras e oliveiras, para se florestar áreas agrícolas, pagou para que não se produzisse e, depois, pagou sem obrigação de produzir.

E a verdade destas “ajudas” da CEE/UE, que só nos desajudam, mas que ajudam muito aqueles que nos vendem o que antes produzíamos, é que 7% dos seus beneficiários ficam com 70% das ajudas.

Este é um belo negócio, não há dúvida, mas é para uns poucos, não é para o povo, não é para o País.

E isto demonstra com grande clareza o tipo de constrangimentos com que estamos confrontados e dos quais é necessário que nos libertemos.

Cumprindo as orientações da UE e pelas mãos dos sucessivos governos, o País foi entregando ao capital estrangeiro cada uma das suas empresas estratégicas e que agora olha para a TAP como mais uma oportunidade de negócio para as multinacionais que dividem entre si os céus da Europa.

A EFACEC, entregue aos alemães da Mutares, juntamente com 200 milhões investidos pelo nosso próprio Estado, é outro exemplo claro de como os interesses nacionais são lesados com o aval da Comissão Europeia.

E agora aí está uma nova directiva que dá à Comissão Europeia plenos poderes para impor ao País ritmos para a redução da dívida, maior aperto sobre a despesa pública para as funções sociais do Estado, menos investimento, mais cortes nos serviços públicos, mais privatizações, ataques ao direitos laborais e à protecção social, mais contenção salarial.

E claro está que o novo Governo PSD/CDS procura agora justificações para não concretizar plenamente as promessas que fez a vários sectores de trabalhadores.

Aí está a desfazer, uma a uma, as ilusões que foi espalhando por entre aqueles que, impelidos por uma justa vontade de mudança, acharam possível que viria da direita a resolução dos seus problemas.

Seja PSD, seja CDS, seja Chega, seja IL, todos eles, de uma forma ou de outra, estiveram associados e aplaudiram a política das troikas, dos cortes nos salários, nas pensões, nas prestações sociais, do aumento das injustiças e desigualdades, da concentração de riqueza, do aumento da pobreza e da emigração.

E tal como prevenimos, aí está o novo Governo a demonstrar o que de negativo representa só por si.

Atirando para 2028 aumentos salariais que se impõem agora.

Promovendo ainda mais injustiça fiscal, baixando significativamente os impostos, não a quem trabalha, mas aos grupos económicos e a quem mais tem.

Abrindo as portas dos cuidados de saúde aos privados e a quem faz da doença negócio.

Protegendo a banca e os especuladores e tornando ainda mais infernal a já muito difícil situação de milhares de famílias que estão com muitas dificuldades em pagar a sua casa.

Nada disto infringe as regras da União Europeia, bem pelo contrário, esta é uma política incentivada por Bruxelas.

A cada dia que passa fica mais claro como a política de direita e a integração capitalista europeia são duas faces da mesma moeda. O combate a uma não pode ser levado a cabo sem o combate à outra.

A verdade é que é preciso romper com este ciclo que priva o nosso País das nossas riquezas, nomeadamente dos jovens que, não encontrando aqui as condições de vida que anseiam, emigram, levando para outros países a formação e o conhecimento que adquiriram cá, apartando-se da sua família e dos seus amigos.

É preciso recuperar instrumentos fundamentais da nossa soberania. Instrumentos monetários, financeiros, orçamentais e cambiais. E de eliminar obstáculos ao desenvolvimento, assegurando o controlo público de sectores estratégicos como a banca e a energia.

Não adianta agitar papões. É pelo nosso povo e pelos seus interesses que guiamos a nossa acção, não pelas directivas de Bruxelas. 

É pelo nosso povo e pelos seus interesses que colocamos a necessidade de romper com as dependências externas, reduzir os défices estruturais e assegurar o desenvolvimento e a soberania.

Se queremos uma Europa de Paz, cooperação e progresso, precisamos de romper com o actual rumo, e de forma firme e consequente intervir para transformar a realidade.

Tal faz com que os nossos adversários lancem mentiras e deturpações sobre as nossas posições, a que importa dar combate.

Defendemos, não os interesses de quem instiga e prolonga a guerra, mas pelo contrário a paz, a solução política, diplomática, negociada dos conflitos, o respeito pelos princípios da Carta das Nações Unidas, da Acta Final de Helsínquia e da Constituição da República Portuguesa.

A guerra defendem todos aqueles que se dispõem a enviar mais armas e a prolongar os conflitos, seja na Ucrânia, seja na Palestina, esses mesmos que estão dispostos a tudo para acentuar a escalada da guerra. E daqui voltamos a afirmar, é preciso pôr fim à guerra, é preciso pôr fim ao massacre e ao genocídio do povo da palestiniano, reconhecer o Estado da Palestina, pôr fim ao crime levado a cabo pelo povo de Israel. A hipocrisia e o cinismo que grassam pela União Europeia em relação às guerras evidenciam quem verdadeiramente está a ganhar com elas.

Defendemos, não o isolacionismo como os nossos inimigos falsamente nos acusam, mas pelo contrário, queremos isso sim o alargamento das nossas relações internacionais. Relações baseadas na paz, na cooperação, na solidariedade, na amizade e fraternidade, não com este ou aquele, mas com todos os povos do mundo.

Isolacionistas são todos aqueles que se acantonam atrás dos ditames de Bruxelas e de Washington, que procuram impor, restringir e determinar aqueles com quem nos podemos ou devemos relacionar.

Antagónicos e incompatíveis são os interesses dos trabalhadores e dos povos, e os interesses dos grupos económicos, dos monopólios, das multinacionais.

Para a Europa de Paz, cooperação e progresso, é mesmo preciso optar pelos trabalhadores e os povos, contra as injustiças e as desigualdades, pela justa redistribuição da riqueza, pelo cumprimento dos direitos, pela melhoria das condições de vida de todos aqueles que têm sofrido a exploração – nós fazemo-lo e como pudemos aqui testemunhar, não estamos sozinhos nesta luta.

Será o desenvolvimento da luta de massas o factor essencial e decisivo para a mudança de que precisamos. Tem sido ela a condicionar e a limitar a ofensiva levada a cabo pelos serventuários do grande capital. Não raras vezes, tem mesmo conquistado alguns limitados ou temporários avanços para as nossas vidas, que nunca devemos desvalorizar.

Mas se há força capaz de quebrar todas as barreiras é mesmo a força do povo, como prova essa realização maior do povo português que é a Revolução de Abril, cujos 50 anos comemoramos, cujos valores demonstraram estar bem vivos neste nosso vibrante comício.

Viva a solidariedade internacionalista!

Viva a amizade e a cooperação entre os povos!

Viva a Paz!

 

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