Intervenção de

Combate à corrupção - Intervenção de António Filipe na AR

Debate de actualidade, sobre a ética, o Estado de direito e o combate à corrupção

 

Sr. Presidente,
Srs. Deputados:

Consideramos que o debate sobre a corrupção tem total pertinência e actualidade.

Aliás, tanto assim pensamos que o Grupo Parlamentar do PCP suscitou, nesta Assembleia da República, um debate de urgência precisamente sobre este tema em 2006, logo que foi conhecido o relatório do Grupo de Estados Contra a Corrupção (GRECO), do Conselho da Europa, que se referia a Portugal e aconselhava alterações práticas, procedimentais e, inclusivamente, legislativas. Suscitámos, por isso, aqui esse debate de urgência numa altura em que este tema não era tão falado ou tão mediático como é hoje.

Importa lembrar que esta Assembleia chamou a si esse debate, promoveu, inclusivamente, uma conferência internacional, tendo-se aberto um período para a apresentação de iniciativas várias que têm vindo a ser discutidas num grupo de trabalho criado no âmbito da 1.ª Comissão.

A esse respeito importa dizer duas coisas.

Importa dizer que, apesar de reconhecermos que a Comissão está ainda dentro dos prazos que a si própria definiu para concluir os trabalhos, na especialidade, sobre esse conjunto de iniciativas, do nosso ponto de vista, pelo que se avançou na discussão das matérias durante o ano passado, de 2007, já tinha havido tempo para que o grupo de trabalho tivesse concluído os seus trabalhos e para que a Comissão pudesse ter votado, na especialidade, todas as iniciativas.

O prazo não passou ainda, mas teria havido tempo suficiente, se o ritmo de trabalho de 2007 se tivesse mantido durante o ano de 2008.

Infelizmente, o ritmo abrandou manifestamente em 2008.

Assim, fazemos aqui o apelo a que haja um empenhamento redobrado da parte de todos os grupos parlamentares para que prontamente essa discussão se conclua e cada grupo parlamentar assuma as responsabilidades que tiver de assumir relativamente às posições que tomar quanto às iniciativas legislativas que estão apresentadas.

Delongas é que não são, de facto, justificáveis.

Um segundo aspecto que quero assinalar é que não estamos muito optimistas relativamente ao resultado final, porque são já conhecidas posições expressas pelos vários grupos parlamentares e, concretamente, pela maioria.

Relativamente às posições que o Partido Socialista (que tem maioria nesta Câmara) tem manifestado, consideramos, de facto, que peças essenciais das iniciativas legislativas apresentadas estão, neste momento, à partida, condenadas a ser rejeitadas - a menos que o Partido Socialista reconsidere a sua posição.

E refiro-me, concretamente, à criação do tipo de crime de enriquecimento injustificado, que o PCP aqui propôs e que já foi informado que o Partido Socialista é contra essa consagração; às propostas que o PCP apresentou em matéria de protecção de testemunhas, por forma a abranger os crimes de corrupção nos programas de protecção de testemunhas, que também já têm uma rejeição anunciada com o pretexto de que o Governo está a pensar neste assunto; e, designadamente, ao programa de combate à criminalidade económica, que o PCP também apresentou e que também já foi anunciada a sua rejeição.

Portanto, o nosso receio neste momento é o de que o resultado final da discussão destas iniciativas legislativas seja uma profunda frustração e o de que esta Assembleia não corresponda minimamente às expectativas que os cidadãos têm relativamente à aprovação de legislação que combata efectivamente o fenómeno da corrupção.

Sr. Presidente, 
Srs. Deputados:

Também estamos muito preocupados com esta situação e quer parecer-nos que a Assembleia, se não der um contributo positivo nesta matéria, ficará muito mal vista aos olhos dos nossos concidadãos. Isto porque há fenómenos que ninguém ignora: fenómenos de promiscuidade entre o exercício de funções públicas e a titularidade de cargos públicos e negócios privados; ou, como já foi aqui referido, o fenómeno de quem, enquanto titular de um órgão de soberania, intervém em determinados negócios e depois, cessando as suas funções nesse órgão ou nesse cargo, passa para o lado do sector privado, intervindo nos mesmos negócios em que interveio antes enquanto governante ou enquanto titular de um cargo político.

Do nosso ponto de vista, o País não pode continuar a assistir a estes fenómenos com a impunidade com que tem assistido até aqui. Portanto, este tipo de promiscuidades têm de ser eliminadas e, do nosso ponto de vista, devem ser feitas as alterações legislativas que for necessário fazer para pôr termo a essas situações. Embora reconheçamos que não estamos apenas confrontados com um problema de lei, mas também de prática, de medidas concretas para que a legislação existente seja efectivada e que isso não tem acontecido, também consideramos que é perfeitamente possível que esta Assembleia faça mais e melhor por forma a criar uma armadura legislativa que impeça a continuação desse tipo de atitudes, que tanto descredibilizam, muito justamente, a actividade política aos olhos do conjunto dos cidadãos.

Portanto, Sr. Presidente e Srs. Deputados, concluindo, o nosso apelo é o de que a 1.ª Comissão conclua rapidamente o trabalho que tem em mãos relativamente às iniciativas legislativas que ainda aguardam a conclusão da sua discussão na especialidade, o de que todos assumam as suas responsabilidades nesta matéria e o de que se estudem outras soluções em matéria legislativa por forma a que situações que muito justamente chocam todos os cidadãos não continuem a acontecer impunemente no nosso país.

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