Intervenção de

Código Penal e Código de Processo Penal

 

Alteração ao Código Penal e ao Código de Processo Penal

Sr. Presidente,
Sr.as e Srs. Deputados:

Apesar de o Sr. Deputado Paulo Portas não ter feito ainda a apresentação do projecto de lei que altera o Código Penal, faremos, obviamente, a apreciação das duas iniciativas em conjunto (projecto de lei n.o  593/X e projecto de lei n.o  594/X).

Começo por dizer que, de facto, para o PCP, elas merecem apreciações substancialmente distintas.

Quanto à iniciativa respeitante à alteração ao Código Penal, não podíamos estar mais em desacordo. Aliás, pela leitura do preâmbulo desta iniciativa, percebe-se, facilmente, que o CDS volta a recuperar a caracterização de Portugal como «faroeste» e manifesta, uma vez mais, a sua concepção sobre aquilo para que serve o sistema penal e a aplicação das penas, no âmbito dos processos penais.

Para o CDS, a lógica que vinga é uma lógica retributiva com vista à expiação da culpa do condenado, e esta é uma lógica que era aceitável no século XIX, mas não o era no século XX e, muito menos, o é no século XXI, onde, de facto, o sistema penal tem, sobretudo, como objectivo primeiro a ressocialização do indivíduo.

Portanto, a aplicação de uma pena no âmbito do sistema penal tem como objectivo a conformação da vida de um indivíduo às regras que a sociedade aceita para o seu funcionamento mais básico, nomeadamente naquilo que diz respeito à protecção dos bens jurídicos que são objecto de atenção por parte do sistema penal.

É esta preocupação de ressocialização que tem de ser o primeiro objectivo do sistema penal.

Por isso, Sr. Deputado Paulo Portas, aquilo que importa, relativamente ao regime da liberdade condicional, é melhorar este instituto, no sentido de que também ele garanta este objectivo da ressocialização da melhor forma, permitindo que um condenado, no âmbito de um processo penal, que tenha cumprido uma parte da sua pena, possa reconfigurar a sua conduta, de forma a aceitar a regra que infringiu e a regular a sua vida no cumprimento dessa regra. Sr. Deputado Paulo Portas, não é, certamente, com a criação de mais obstáculos à aplicação da liberdade condicional, com a criação de novos obstáculos à ressocialização dos indivíduos que o sistema penal cumpre aquela que é a sua verdadeira missão.

Relativamente a esta questão, importa ainda referir que, no âmbito da última revisão do Código Penal, o PCP apresentou propostas de alteração deste instituto da liberdade condicional que iam precisamente neste sentido, ou seja, pretendíamos melhorar este instituto, garantindo melhores condições para que se cumprisse o objectivo primeiro da ressocialização dos indivíduos.

Quanto ao projecto de alteração ao Código de Processo Penal que o CDS aqui nos traz, fazemos uma avaliação substancialmente.

De facto, a preocupação com a necessidade de criar condições para que o julgamento, na sua forma sumária, possa ser mais utilizado, quando há, de facto, condições para que assim seja, quando estejam cumpridos os requisitos para que assim seja, é uma preocupação justa.

Aliás, o PCP, no último processo de revisão do Código de Processo Penal, apresentou um vastíssimo conjunto de alterações às regras dos processos especiais, incluindo, obviamente, o processo sumário, que, em nosso entender, davam resposta a essa necessidade e, simultaneamente, a essa possibilidade de uma maior utilização do processo sumário, garantindo uma justiça mais célere, mais eficaz, com respeito pelas garantias do arguido e, obviamente, com condições que permitam a realização da justiça.

A verdade é que as propostas que o PCP apresentou foram rejeitadas pelo Partido Socialista e a verdade também é que as actuais normas que regem os processos especiais e, em concreto, o processo sumário, não permitem, de facto, que este seja um instrumento de aplicação processual penal mais utilizado.

Há, pois, alguma necessidade de melhoria.

No entanto, consideramos que as propostas do CDS relativamente a esta matéria, ainda assim, devem ser repensadas em alguns dos seus aspectos, nomeadamente naquilo que tem a ver com a forma que nos é proposta quer para a recolha de prova quer para a sua apresentação em julgamento.

Pensamos que há alguma necessidade de ponderar as soluções que o CDS-PP nos apresenta e há, sobretudo, uma outra necessidade, Sr. Deputado Paulo Portas, que é a que resulta de mais uma medida apresentada pelo Governo do Partido Socialista, que tem a ver com a alteração à Lei das Armas e com aquilo que denunciámos, nesse debate, que era a criação de um novo modelo processual penal, enxertado do Código de Processo Penal, e introduzido na Lei das Armas.

É porque se o Sr. Deputado Paulo Portas tiver em atenção aquilo que consta da proposta de lei n.º 222/X, no que se refere ao aditamento de um artigo 95.º-A, verá que prevê um regime processual penal distinto relativamente aos crimes que sejam cometidos com a utilização de armas, nomeadamente determinando, quanto à detenção em flagrante delito, que o Ministério Público tenha de manter a detenção até à audiência de julgamento sob a forma sumária ou até ao primeiro interrogatório judicial, para eventual aplicação de uma medida de coacção ou de garantia patrimonial.

Portanto, entendemos que, por força desta opção errada que o Partido Socialista e o Governo entenderam assumir, ao apresentar uma alteração à Lei das Armas, estas propostas do CDS-PP têm de ser revistas, sob pena de criarmos aqui uma situação de incompatibilidade entre várias normas que regulam a mesma situação, neste caso, a sequência processual da detenção em flagrante delito e a aplicação do processo de forma sumária.

  • Justiça
  • Assembleia da República
  • Intervenções