Intervenção de Miguel Tiago na Assembleia de República

Campos de golfe

Programa de gestão ambiental dos campos de golfe
Sr. Presidente,
Srs. Deputados:
Quero, antes de mais, em nome do Grupo Parlamentar do Partido Comunista Português, valorizar as iniciativas que estamos a discutir, porque «nem tudo o que luz é ouro» e nem tudo o que é verde é ecológico. E, nestas coisas dos campos de golfe, às vezes, parece que estamos perante um belo prado, um campo bonito e bem ornamentado, quando, na verdade, estamos a olhar para um verdadeiro «cancro» inserido no território.
Não subscrevemos tentativas de demonização da prática do golfe ou dos campos de golfe — não é essa a intenção — nem tão-pouco da importância económica desta actividade, particularmente no sector turístico e hoteleiro. No entanto, não podemos permitir este exercício que o PS, pelos vistos, com o apoio das bancadas do CDS e do PSD, quer fazer: «como é importante, façam as asneiras que entenderem, porque trazem muito dinheirinho»…
Não podemos também esquecer que, ao abrigo dos campos de golfe, muitas vezes vem mais do que o campo de golfe: vem o empreendimento de habitação de luxo que ali é autorizado, apenas porque ali existe um campo de golfe. Ou seja, vem a habitação de luxo, vem o empreendimento turístico, tudo ao abrigo do campo de golfe que tem uma importância estratégica no nosso turismo nacional. E não podemos continuar a permitir que o território e os recursos naturais do País sejam geridos «à peça», sem uma visão estratégica e apenas em função dos interesses privados que vão disputando estes recursos para a instalação dos campos de golfe.
É muito positivo e é de valorizar que surjam contributos das diferentes bancadas, neste caso do Partido Ecologista «Os Verdes» e do Bloco de Esquerda, para que seja regulamentado o uso da água nos campos de golfe. Estamos a falar de regulamentar e não de cada um fazer como entender para poder utilizar isso como uma mais-valia de propaganda e de publicidade do seu campo de golfe. Não é isso! A lei deve obrigar a um conjunto de normas.
Talvez a mais importante das medidas que estão em cima da mesa seja a que obriga todo e qualquer campo de golfe a uma avaliação de impacte ambiental. Se esta medida existisse, Sr. Deputado Renato Sampaio — que está a fazer caretas enquanto estou a falar… —, não teria sido possível ao seu Governo a autorização sem avaliação de impacte ambiental de um campo de golfe de 9 buracos no Jamor para depois vir fazer outro de 9 buracos. Sabe porquê? Porque a lei só obriga a uma avaliação de impacte ambiental os campos de 18 buracos. Assim, o promotor faz um de 9 buracos e depois, passados dois ou três anos, faz outro de 9 ao lado e fica com um de 18, assim contornado a lei…!
Portanto, é extremamente importante que seja obrigatória a declaração de impacte ambiental decorrente de um processo de avaliação de impacte ambiental para campos de golfe.
Ainda assim, Sr. Presidente e Srs. Deputados, reforço que sem querer demonizar, o mais importante que deve resultar deste debate, além da regulamentação, dos planos de gestão ambiental e dos planos de manutenção da biodiversidade, é que, num País com escassos recursos naturais, não podemos continuar a permitir que o território nacional seja gerido sem uma visão harmoniosa e integrada, em que os planos de ordenamento são, pura e simplesmente, desrespeitados e muitas vezes até manipulados ao ponto de permitir apenas este tipo de empreendimentos turísticos.
Para terminar, Sr. Presidente, vou dar um exemplo muito claro: a proposta que foi posta à discussão pública do Plano de Ordenamento do Parque Natural do Sudoeste Alentejano e Costa Vicentina. Pasme-se! Era proibido qualquer tipo de operação de loteamento independentemente do seu impacto no ambiente, desde que não fosse loteamento para empreendimento turístico…! Para esse fim, podia sempre!! Portanto, se fosse um loteamento para empreendimento turístico com campo de golfe, não havia nenhum problema; se fosse outro tipo de loteamento, independentemente do impacto que viria a ser, seria proibido.
Isto revela bem a dualidade de critérios. Como no outro dia dizia aqui, às vezes é mais difícil apanhar um raminho de salsa numa área protegida do que instalar lá um campo de golfe!...

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