Intervenção de Bernardino Soares na Assembleia de República

Aumento do salário mínimo nacional

(projecto de resolução n.º 272/XI (2.ª)

Sr. Presidente,
Srs. Deputados:
Penso que este debate demonstrou a oportunidade deste agendamento do PCP e a importância de, neste momento, debatermos o aumento do salário mínimo nacional para o ano de 2011 e a sua progressão até 2013.
Em primeiro lugar, porque a questão dos salários é central na coesão social do nosso país, por razões de justiça social na distribuição da riqueza, mas também porque é uma questão importantíssima para o nosso desenvolvimento económico, uma vez que o aumento do poder de compra, dos salários, das remunerações dos trabalhadores é um factor-chave para o desenvolvimento do País e o não aumento que o Governo prevê é um dos factores que mais agrava os riscos de recessão da nossa economia.
É evidente que alguns dizem, e diz o Ministro de Estado e das Finanças: se há cortes na Administração
Pública, porque hão-de aumentar os salários no sector privado? E nós dizemos que a injustiça não é aumentarem os salários no sector privado, a injustiça é haver cortes na Administração Pública, porque precisamos de valorizar todos os salários do nosso país.
É, aliás, curioso que o Orçamento do Estado, sempre que se refere à competitividade da nossa economia, só encontra um factor para avaliar essa competitividade: é sempre o dos custos unitários do trabalho. Até parece que não há custos da energia, custos do transporte, custos organizativos… Nada! A única coisa que defende a competitividade é baixar os salários, na opinião do Governo.
Ora, nós sabemos bem que as empresas têm como principais responsáveis pelos seus custos não os salários dos seus trabalhadores, (que são, em geral, bastante baixos), mas os custos da energia, os custos dos transportes, os custos do combustível em geral.
Aí os senhores não querem mexer, aí já não importa defender as empresas e defender os seus postos de trabalho!
Sabemos que este aumento do salário mínimo corresponde a apenas 1% da massa salarial. Não é, portanto, significativo.
Para o constatarmos basta fazermos um pequeno exercício: se uma microempresa tiver 10 trabalhadores e 5 deles (metade) receberem o salário mínimo nacional, este aumento significa mais 125 €/mês. Se esta empresa não pode pagar mais 125 €/mês então o problema dela não são os salários, são outros problemas de viabilidade. Se, numa empresa que tenha 500 trabalhadores, metade deles receber o salário mínimo nacional, o aumento, por mês, é de 6250 €. Ora, uma empresa com 500 trabalhadores não pode pagar mais 6250 €?!
Nenhuma empresa será comprometida pelo aumento do salário mínimo nacional.
Pelo contrário, a vida dos trabalhadores é que fica ainda mais comprometida se o salário mínimo nacional não for aumentado.
Com o salário mínimo, não estamos a dar mais do que os trabalhadores merecem. Se ele tivesse sido actualizado, desde há décadas atrás, pelo menos de acordo com a inflação, já seria hoje superior ao que é actualmente — bastante superior! Estamos, sim, é a dever salário aos trabalhadores e é isso que queremos alterar com este projecto de resolução.
O actual Programa do Governo refere que é preciso prosseguir com a elevação do salário mínimo nacional, e é isso que se propõe neste projecto de resolução. Mas o Programa do Governo anterior, ao abrigo do qual foi assinado o tal acordo de aumento do salário mínimo nacional, dizia que este salário mínimo nacional tem uma função importantíssima como factor de imunização da pobreza. Ora, estamos precisamente no Ano Europeu do Combate à Pobreza e Exclusão Social e é neste ano que o PS e o Governo estão a pôr em causa o aumento do salário mínimo nacional?!
O PS e o Governo têm na rua cartazes, aliás de muito mau gosto, a propagandear este Ano Europeu e a falar dos problemas da pobreza, cartazes que humilham aqueles que são pobres e as condições em que vivem. São cartazes com que se gastam centenas de milhares de euros,
distribuídos nos transportes públicos e por todo o País em campanhas publicitárias!
O PS, que põe na rua este tipo cartazes, agora diz que tem dúvidas sobre aumentar o salário mínimo?
Então, como é que se vai combater a pobreza? Como é que se vai cumprir aquilo que anunciam nos grandes cartazes? Como é que se vai cumprir o que dizem os folhetos distribuídos pelo Ministério do Trabalho e da Solidariedade Social, que o reconhecimento do direito a condições de vida dignas é hoje um pilar essencial das políticas públicas? É assim quando se congelam as reformas? Quando se corta nas prestações sociais?
Quando se erradica o abono de família? É isto que significa dar condições de vida dignas aos portugueses?!
Pode ler-se também, num folheto do Ministério do Trabalho, que este ano de 2010 tem de se afirmar como um momento de viragem na sociedade portuguesa. Ó Srs. Deputados, só se for viragem para baixo, porque com as medidas que os senhores têm no Orçamento do Estado, certamente não é viragem no sentido positivo.
Para terminar, Sr. Presidente e Srs. Deputados, dizem-nos que é preciso discutir esta questão na concertação social. Queria dizer o seguinte: a concertação social tem o seu papel, mas aqui é a Assembleia da República que representa o povo português. Ouvindo alguns dos discursos
que aqui foram proferidos, parecia que quem representa o povo português é a concertação social! Não, Srs. Deputados, quem representa o povo português somos todos nós aqui, e a Assembleia da República tem total legitimidade para pronunciar-se sobre esta matéria.
Se os Srs. Deputados repararam, não se trata, neste caso, de um projecto de lei, trata-se de um projecto de resolução, que permite assumir um posicionamento político e obrigar o Governo a cumprir esse posicionamento.
Até já compreendi — e com isto termino, Sr. Presidente — que várias bancadas têm dúvidas sobre estabelecer o valor de 600 € para 2013, e nós dizemos que é desejável fazê-lo, porque é possível manter o percurso de progressão do salário mínimo nacional. Mas também está aqui em discussão a questão dos 500 € em 2011 e o que propomos, com essa parte do nosso projecto de resolução, é que se confirme o que foi acordado. É isso que vai ficar claro nesta Assembleia: se o PS e os partidos da direita confirmam o que foi acordado, ou se o PS e os partidos da direita negam o que foi acordado, que é o direito elementar a um aumento minimamente digno do salário mínimo nacional!

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