Intervenção de Jerónimo de Sousa, Secretário-Geral, Apresentação pública do Tomo V das Obras Escolhidas de Álvaro Cunhal

Apresentação do Tomo V das Obras Escolhidas de Álvaro Cunhal

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No vasto conjunto de iniciativas comemorativas do 40º aniversário da Revolução do 25 de Abril que, este ano, o PCP decidiu promover sob o lema “Os valores de Abril no Futuro de Portugal”, incluía-se o lançamento do V Tomo das Obras Escolhidas de Álvaro Cunhal.

Ele aí está como anunciado, abrangendo todo o período daquela que foi uma empolgante revolução libertadora e profundamente transformadora, um dos momentos mais marcantes e mais altos da vida do nosso povo e da história de Portugal.

Se a iniciativa editorial com o conteúdo que se apresenta e o momento escolhido são uma forma de celebração desse acontecimento maior da nossa história, ela vem igualmente na continuidade do notável esforço que as “Edições Avante” vêm fazendo, com o acompanhamento particular de Francisco Melo, de divulgação da produção teórica e da intervenção política de Álvaro Cunhal. Dessa valiosa e importante obra que não pode ser desligada do combate por uma sociedade nova, liberta de exploração e opressão, que o seu Partido de toda uma vida – o PCP – vem travando, não tardará, vai para um século.

Por este V Tomo das Obras Escolhidas de Álvaro Cunhal passa uma parte muito significativa e essencial da História da Revolução de Abril, escrita por quem, em nome do PCP, se apresentou perante o nosso povo tal como era e anunciando com total transparência e verdade, ao contrário de outros, os objectivos e o projecto de um Partido que haveria de desempenhar, no plano da intervenção e acção política, um papel ímpar na Revolução.

Na diversidade dos textos que seguem a fita cronológica dos acontecimentos, num processo que se desdobra à velocidade da luz se reconhece a vivência de um tempo novo.

O tempo novo de uma Revolução, que o povo português tomou nas suas próprias mãos para responder às suas aspirações mais profundas de liberdade, emancipação social, desenvolvimento independente e soberano.

Um tempo novo de construção e transformação da vida de todos e de nós próprios que se descobre em cada dia que passa e em cada página folheada.

Páginas que desfiam um tempo que foi demasiado curto para levar até ao fim, e a bom porto, a ciclópica tarefa de democratização da sociedade portuguesa com profundas transformações económicas e sociais, como propúnhamos e o nosso povo abraçou, mas um tempo exaltante de luta e descoberta, de iniciativa criadora das massas populares, que significam anos acumulados de realização, conquista, vivência e experiência colectivas que são inapagáveis e que serão sempre uma referência na construção de uma alternativa para servir os verdadeiros interesses dos trabalhadores, do nosso povo e do País.

É significativo e uma feliz coincidência que as primeiras palavras da entrevista que abre o V Tomo, sejam para se afirmar que “o movimento militar vitorioso do 25 Abril não caiu do céu” e, com tais palavras, iniciar a resposta à perplexidade manifestada pelo jornalista do L’ Humanité que procurava, logo no dia seguinte, explicação para o que dizia ser um êxito fulminante do levantamento militar.

Não caiu do céu o movimento militar vitorioso dos capitães a quem muito o País deve, como não iriam cair do céu os avanços, as conquistas, as grandes transformações que se lhe haveriam de seguir, nesse impetuoso processo revolucionário de Abril onde se combinou essa aliança original e frutuosa do Movimento das Forças Armadas e um poderoso movimento popular de massas. Movimento de massas que vinha em ascensão e que se tinha tornado um dos factores determinantes na criação da situação revolucionária e que contribuiu em grande medida também para fazer implodir num ápice a mais velha ditadura da Europa.

Era difícil apreender para quem olhava do lado de lá dos Pirenéus, ainda por cima tantas vezes enublado por uma deturpada e ilusória visão do País, do nosso povo e da sua luta, que esse fulgurante êxito era o culminar de um processo de uma longa luta de resistência dos trabalhadores e do povo ao fascismo, que tinha conduzido o regime a uma profunda crise interna e ao seu isolamento nacional e internacional, também com a luta dos movimentos de libertação nacional contra o colonialismo português.

Uma crise geral que se aprofunda e apressa com o agudizar dos problemas da guerra colonial e dos seus reflexos nas Forças Armadas, com o agravamento dos problemas económicos, e com a impetuosa luta e o movimento grevista que se desenvolve no período que antecede o 25 de Abril.

De facto, desde o primeiro momento que a Revolução Portuguesa desperta a atenção e até a admiração de todo o mundo.

Este V Tomo é bem a expressão desse interesse e dessa atenção pelo abundante número de esclarecedoras entrevistas concedidas por Álvaro Cunhal, em nome do PCP, aos mais variados órgãos de imprensa escrita de praticamente todos os continentes. Elas revelam o impacto da Revolução Portuguesa na vida internacional. Uma Revolução que não deixou ninguém indiferente. Não deixou indiferente as forças do progresso de todo mundo que viam na Revolução Abril a confirmação de que era possível abrir janelas de esperança na luta dos trabalhadores e dos povos pela sua emancipação, e vencer. Não deixou indiferente o imperialismo e todos os inimigos da luta de libertação dos povos que anteviam no exemplo da Revolução Portuguesa um sinal de perigo às suas posições de domínio no sistema de exploração e, por isso, desde cedo tanto se empenharam, fazendo costas com a contra-revolução interna para travar e inverter o processo de democratização e transformação económica e social da sociedade portuguesa.

Afirmava Álvaro Cunhal que a Revolução Portuguesa é a “história de grandiosas e constantes lutas da classe operária e das massas populares, aliadas aos militares revolucionários, para libertar Portugal da opressão, da miséria, da exploração, da injustiça e das desigualdades sociais, para democratizar a vida nacional na perspectiva do socialismo”.

São essas lutas que perpassam por todas estas páginas, a primeira das quais foi a luta para garantir as liberdades que tiveram que ser conquistadas.

Lutas que tiveram que enfrentar e superar a mais tenaz resistência das forças que a todo o custo pretendiam manter Portugal amarrado a um passado de exploração e garantir intacto o poder económico dos grandes monopólios e latifundiários, suportes da ditadura fascista.

O grande capital e as forças fascistas e reaccionárias utilizaram todos os seus poderosos recursos para, ditatorialmente, tomar conta do poder e impedir a democratização da vida nacional. Muitas vezes, é preciso não esquecer, com a conivência, senão com o apoio e envolvimento de outras forças que se reclamavam da democracia e até do socialismo, com particular evidência à medida que a Revolução punha em marcha profundas transformações económicas e sociais e, de forma declarada, a partir do momento em que o capitalismo monopolista de Estado é liquidado, com as nacionalizações da banca e das empresas dos sectores estratégicos da economia nacional.

A Revolução desde muito cedo enfrentou a sabotagem do grande capital e uma tentativa de estrangulamento económico que se tornou sistemática e que se tornou uma preocupação maior na condução dos destinos da jovem democracia portuguesa. Uma preocupação cada vez mais presente na intervenção do Partido. Denunciar as práticas de sabotagem e de paralisação dos centros vitais e impedir a desorganização País passou a ser, a par da luta pela liberdade, uma questão central para a defesa da Revolução.

Uma questão, tantas vezes evidenciada nos discursos de Álvaro Cunhal, e que revelava e traduzia o avolumar de uma crescente contradição entre o poder político democrático e o poder económico que tinha optado por estrangular o desenvolvimento do País, fazendo disso uma arma de desestabilização da Revolução.

Desestabilização que o grande capital, as forças da contra-revolução e os seus homens- de- mão levaram muito longe, ao promoverem logo no primeiro ano da vida democrática três golpes contra-revolucionários, cuja iniciativa as forças fascistas e da direita reaccionária insidiosamente remetiam para o PCP, com a colaboração do PS, numa evidente manobra de alijamento de responsabilidades e de quem faz o mal e a caramunha.

Uma colaboração há muito verificada e que resultava do seu posicionamento político referenciado por Álvaro Cunhal quando afirmava numa entrevista à Capital “Desde o 25 de Abril, o PS tem procurado entravar o processo revolucionário (…)”, mas que se tornou mais evidente, quando o PS, derrotadas e desacreditadas as forças golpistas mais reaccionárias, deixando cair a máscara do partido revolucionário que proclamava e dos fingimentos unitários, passa a liderar uma campanha provocatória e anti-comunista contra o MFA e o PCP que passou a ser uma arma importante de uma nova ofensiva da contra- revolução, acentuada com a sua premeditada saída do governo que vai conduzir a uma grave crise político-militar e, pelo meio, a uma ofensiva anticomunista sem precedentes com assaltos e destruição de Centros de Trabalho do PCP e de outras organizações políticas e sociais progressistas.

A amplitude desta campanha e dos seus objectivos desenhava-se já antes do 11 de Março e estão patentes nas palavras de Álvaro Cunhal numa entrevista de 6 de Fevereiro a dois jornais de partidos irmãos: “As recentes campanhas de dois partidos da coligação, o PS e o PPD, contra o perigo imaginário de um golpe comunista absolutamente inventado, foram objectivamente a base de uma nova e vasta ofensiva da reacção, fortemente apoiada pela reacção internacional, visando o estrangulamento das forças revolucionárias e mudanças para a direita das estruturas de poder”.

As intervenções políticas e entrevistas que agora se incluem neste Tomo são elucidativas na desmontagem dos objectivos da contra-revolução e das suas pérfidas tramas, mas também do papel das massas populares, dos militares progressistas e do nosso Partido, nesses momentos mais dramáticos para a vida da democracia nascente e na defesa da Revolução, como ficou bem patente, por exemplo, nas acções de desarticulação da “Marcha sobre Lisboa”, no golpe que ficou conhecido como da “maioria silenciosa” ou no golpe do 11 de Março, que têm respectivamente nos discursos de Álvaro Cunhal de 5 de Outubro em Sacavém e de 29 de Março em Setúbal um tratamento desenvolvido.

Estes textos estão datados e produzidos em cima dos acontecimentos, mas com proveito de quem procura a verdade podem e devem ser completados com a leitura dessa importante e esclarecedora obra de Álvaro Cunhal – “A Verdade e a Mentira na Revolução de Abril”.

Esse ensaio onde Álvaro Cunhal põe a contra-revolução a confessar pela sua própria boca e os seus escritos a verdade sempre afirmada pelo PCP, e se desmontam as colossais práticas de dissimulação, de mentira e de ocultação dos planos, compromissos e comportamentos daqueles que desde cedo conspiraram contra a revolução a coberto da sua pretensa defesa.

Práticas de dissimulação, de descarado engano do povo português, que podemos encontrar nos dias de hoje, apesar das diferenças de contexto, quando se faz o contrário do que se anuncia e se encobrem os verdadeiros objectivos das opções políticas que se põem em prática.

Foi enfrentando resistências e perigos imensos que a Revolução deu passos larguíssimos na alteração das condições de vida e nas estruturas socio-económicas do País.

Uma Revolução onde os trabalhadores e o povo, juntamente com os militares progressistas, materializando sonhos, aspirações e reivindicações, iam paulatinamente abrindo as portas de um País encarcerado ao mundo, libertando outros povos que também lutavam para se libertarem do jugo do colonialismo, pondo fim à guerra e propondo a paz e a cooperação entre os povos.

Uma Revolução que concretiza, pela acção das massas, direitos laborais, sociais e culturais: - liberdade sindical, direito à greve, a não ser despedido sem justa causa, protecção na infância e na velhice, direitos ao ensino, à saúde, à protecção social, direito à igualdade das mulheres no trabalho, na família, na sociedade, direitos da juventude.

Direitos políticos essenciais, nomeadamente liberdade de imprensa, de associação, de reunião, de manifestação.

Direito a decidir sobre os problemas das suas terras e sobre o seu desenvolvimento, concretizado no reconhecimento do Poder Local democrático,

Importantes transformações progressistas foram primeiro concretizadas na prática e só posteriormente legitimadas pelo poder.
Uma Revolução que pôs em marcha um original processo de nacionalizações e de ocupação de terras e de Reforma Agrária, realizadas para responder a necessidades imediatas de defesa da economia e de defesa das próprias liberdades, mas também o original processo de controlo operário e de gestão, em centenas de empresas, pelos trabalhadores.

Grandes conquistas e profundas transformações que permitiram criar uma nova estrutura económica liberta do poder dos monopólios e dos latifundiários.

Neste quadro, as nacionalizações constituíram um acto patriótico que contou com a insubstituível intervenção dos trabalhadores de resposta às manobras dos grupos económicos para liquidar o regime democrático. Um acto de construção de um instrumento capaz de suportar as necessidades de um desenvolvimento ao serviço de uma justa distribuição de riqueza e de elevação das condições de vida do povo, e uma sólida alavanca de desenvolvimento económico do país.

O mesmo acontecia com a Reforma Agrária que havia de ser conduzida pelo proletariado agrícola alentejano e ribatejano.

Pela primeira vez na História do nosso país, os trabalhadores tomaram a decisão de tomar as terras do latifúndio e com elas nas suas próprias mãos o seu destino, desbravando terras incultas e concretizando um inovador programa de transformações económicas e de justiça social que iria resolver os problemas da produção e do emprego nos campos do Sul do País, através das suas mais de 500 UCP/Cooperativas.

Ilustrativo do novo e empolgante ambiente vivido na nova realidade de Abril, que não era apenas na zona Reforma Agrária, mas em todos os sectores onde os trabalhadores e o povo eram chamados a assumir a responsabilidade de transformar os novos instrumentos em alavancas do desenvolvimento, é a descrição da nova realidade evidenciada por Álvaro Cunhal no Discurso na Cooperativa Estrela Vermelha em Santiago do Cacém de 30 de Março.

Afirmava então: “Há dois meses, estas terras em que nos encontramos estavam ao abandono, as árvores por tratar e o gado morria de fome. Como bem se lembram os homens desta terra, essa era a agricultura dos grandes agrários, dos exploradores dos trabalhadores alentejanos, dos sabotadores da economia nacional. Hoje, as terras começam a ser cultivadas, as árvores limpas e o gado alimentado e tratado. (…) Ainda há dois meses, visitavam esta terra pessoas que queriam ver o espectáculo da desolação e da morte. Hoje vimos aqui dezenas de milhar de pessoas, (…) que vêm ver como trabalham os camponeses da Estrela Vermelha e como se pode arrancar os campos ao abandono, como se pode arrancar o gado à morte e se pode construir uma nova agricultura.”

Todas estas realizações e conquistas que se traduziram em significativas melhorias das suas condições de vida não foram o resultado de um qualquer voluntarismo revolucionário, antes corresponderam a necessidades objectivas, aos interesses e vontade do nosso povo.
Mas o que revela igualmente esta obra que agora se dá à estampa são as razões que nos afirmam como Partido de Abril.

Não apenas pelo contributo dado na definição e concepção do projecto de Revolução Democrática e Nacional que a Revolução de Abril traduz nas profundas alterações que produziu e na sua assumida natureza amplamente democrática, anti-monopolista e anti-imperialista, mas pelo que a cada página volvida deste V Tomo se pode encontrar de intervenção e acção empenhada na defesa da Revolução e de defesa e aprofundamento das suas conquistas, de dedicação à causa da liberdade e da democracia e da sua institucionalização, de proposta de solução em todos os domínios da vida colectiva, no plano político, económico e social, na dinamização e organização da participação dos trabalhadores e do nosso povo na defesa dos seus legítimos interesses e do País.

No folhear destas páginas encontramos um Partido que se desdobrava em todas as frentes de batalha.

Na batalha pela unidade da classe operária, dos trabalhadores nas empresas e locais de trabalho, mas também grande batalha pela unidade sindical e contra o divisionismo, na batalha pela concretização de amplas alianças sociais das classes e camadas não monopolistas, das forças democráticas à volta da instauração de um regime democrático construído pelo próprio povo e com profundas reformas sociais.

Uma batalha titânica que teve que enfrentar não apenas os obstáculos sistematicamente colocados pela acção divisionista e anti-comunista do PS e da sua contínua deslocação para a direita, mas igualmente a acção desagregadora e desestabilizadora dos esquerdistas pseudo-revolucionários. Grupos externos ao movimento operário e democrático que tomaram como alvos da sua acção de intriga e provocação, particularmente o PCP e o MFA. O seu papel na Revolução caracterizou-o Álvaro Cunhal ao afirmar “As suas actividades inserem-se não na luta do povo e das forças revolucionárias, para fazer progredir o processo democrático, mas na ofensiva da contra-revolução para liquidar as liberdades”.

Mas encontramos igualmente nestas páginas um Partido empenhado na grande batalha de combate à crise económica e financeira vinda da pesada herança do fascismo e que a sabotagem aprofundou. Uma batalha na solução da qual respondeu o VII Congresso do PCP de Outubro de 1974 com uma proposta de “plataforma de emergência” propondo medidas eminentemente nacionais, no plano económico, social e político.

Na batalha da verdade – uma das grandes batalhas da revolução – contra as falsas ideias, as reservas, os preconceitos, os ódios semeados pela reacção contra as forças progressistas que atingiu uma parte significativa do território nacional e impediam o exercício dos direitos e liberdades democráticas.

Na batalha em defesa dos interesses imediatos dos trabalhadores e das populações, pela elevação da sua qualidade de vida, no governo e fora dele, e de apoio às grandes conquistas da Revolução.

Na importantíssima batalha de consolidação e reforço da aliança do Povo/MFA e no encontrar solução para a magna questão do Poder político. Um Poder que desde a primeira hora, tanto nos órgãos superiores civis, como militares, se apresentou heterogéneo e contraditório, dando origem à criação e multiplicação de centros de decisão que tornaram determinante a correlação de forças a nível militar e popular, na superação dos inevitáveis conflitos.

Problema que resultou numa fragilidade da revolução portuguesa, explorado pelas forças mais reaccionárias e por todos aqueles que haveriam de liderar posteriormente, através dos seus governos, o processo de recuperação capitalista e monopolista a partir de 1976 – o PSD e o PS.

Forças que, de forma concertada, fizeram da liquidação do MFA e do seu afastamento da vida política o centro de todas as suas actividades e da sua intriga que este V volume bem documenta, com particular destaque na parte da evolução da crise político-militar que culminaria no golpe do 25 de Novembro.

Forças que conspiraram contra a Revolução. Conseguiram dividir o MFA e neutralizar a intervenção dos militares democratas. Conseguiram interromper o curso da Revolução que ficou inacabada e lançaram-se ao contra-ataque.

A política de direita conduzida por sucessivos governos do PS e PSD com o apoio do CDS, que desde há mais de 38 anos vimos combatendo, são parte essencial deste já longo processo contra-revolucionário.

Governos de política de direita e restauração monopolista que realizaram políticas que se traduzem num sério retrocesso nas condições de vida do povo e no desenvolvimento do País.

Mais de trinta e oito anos de políticas de recuperação capitalista que permitiram que novos e velhos grupos económicos e financeiros passassem a dominar de novo a economia e o País, num processo de crescente subordinação do poder político ao poder económico com graves e brutais consequências económicas, sociais e políticas.

Uma prolongada acção política e governativa orientada para promover uma escandalosa centralização e concentração da riqueza a favor do capital monopolista.

Governos que condenaram com a sua política de enfeudamento aos grandes grupos económicos nacionais e estrangeiros os sectores produtivos nacionais, que fragilizaram o País, agravando os seus principais défices estruturais, que conduziram, com essa sua política, a uma situação de prolongada crise que se expressa em prolongadas situações de estagnação e recessão económica, em desemprego massivo, agravamento da dívida externa e dos problemas sociais, ampliando as injustiças e as desigualdades sociais.

Governos que se lançaram de forma contínua contra os direitos laborais, o sistema de protecção social, os serviços públicos e as funções sociais do Estado com a política de privatizações.

Uma ofensiva que, nestes últimos três anos, assumiu uma dimensão nunca antes vista, tendo como pano de fundo e pretexto o Pacto de Agressão que PS, PSD e CDS firmaram com o FMI, a União Europeia e o BCE e que agravou ainda mais os problemas do País e ampliou a grave crise resultante de anos de políticas de direita.

Por isso o País vive hoje um dos mais graves e dolorosos períodos da sua longa história. Um período onde é patente um total confronto com o que Abril representou de conquista, realização, avanço e transformação progressista da sociedade portuguesa.

Um período em que a política de desastre nacional assumiu uma nova dimensão destruidora que está a levar ao contínuo e generalizado empobrecimento dos portugueses, nomeadamente com o ataque aos salários e reformas, desemprego massivo, exploração do trabalho sem precedentes, precariedade, aumento brutal e desmedido dos impostos sobre o trabalho, emigração e empobrecimento crescente e em massa, destruição das funções sociais do Estado, regressão acentuada da produção nacional, uma dívida incomensuravelmente maior, submissão ao imperialismo, amputação do regime democrático.

Um período de sofrimento do povo e de afundamento do País que pretendem prolongar por longos anos.

Há pouco, com a saída formal da troika, garantiam que a política de austeridade, extorsão e sacrifícios para o povo estava a chegar ao fim e que Portugal recuperaria a sua autonomia e soberania.

Mas a verdadeira realidade é que o País continua amarrado a uma situação de dependência e às mesmas políticas de desastre destes últimos anos.

A verdade irrefutável é que o governo se prepara, com a cumplicidade do PS, para prosseguir e perpetuar a mesma política de empobrecimento que tem sido seguida até hoje e que impede o desenvolvimento soberano de Portugal.

O que têm em preparação, e pretendem, é um vasto programa de novas medidas de extorsão, de destruição de direitos sociais e laborais e de ruína do País.

O que têm em curso é a eternização da política de concentração de riqueza e destruição. Mais 7 mil milhões de cortes até 2019 estão aí anunciados que significam novos rombos em serviços essenciais para as populações na saúde, na educação, na protecção social e mais desemprego. Mais cortes de salários. Mais cortes nas reformas e pensões. Mais aumentos de impostos sobre quem trabalha. Novas medidas de esvaziamento de direitos laborais. Mais privatizações para alimentar a gula do grande capital.

Uma política que fechou todas as portas à esperança de uma vida melhor e de um País livre, soberano e desenvolvido.

A saída desta situação não se resolve com o consenso entre as forças que conduziram o País à degradação económica e social e ao abismo.

A saída exige ruptura com as políticas de direita e de recuperação capitalista até hoje seguidas por PS, PSD e CDS.

Exige dar força à luta de massas, enquanto factor de valor estratégico no caminho da transformação social.

Exige a convergência de todos os democratas e patriotas, das forças e sectores que verdadeiramente se disponham a assumir a ruptura com a política de direita.

A vida continua a confirmar que a resposta aos dramáticos problemas com que o povo e País estão confrontados, só pode ser encontrada invertendo o rumo contra-revolucionário, pondo termo a quase quatro décadas de políticas de direita e de recuperação capitalista, e com um governo patriótico e de esquerda.

Um governo capaz de concretizar uma nova política, uma política que tenha como referência o Programa de “Uma Democracia Avançada – os valores de Abril no futuro de Portugal” que o PCP apresentou e propôs ao povo Português no seu último congresso. Um programa que, tal como o era o da Revolução Democrática e Nacional, é parte integrante e inseparável da luta pelo socialismo.

Um programa para responder aos novos problemas da vida de hoje e, inequivocamente, retomar o caminho interrompido de Abril e libertar o País do domínio do capital monopolista e da submissão ao estrangeiro.

Um programa estratégico para a concretização de um verdadeiro programa de desenvolvimento do País e cuja realização é igualmente indissociável da luta que hoje travamos pela concretização da ruptura com a política de direita e da materialização de uma política patriótica e de esquerda.

Uma política patriótica e de esquerda também ela partindo dos valores de Abril, esses mesmos valores em que a Democracia Avançada está inspirada, alicerçando-se na sua projecção, consolidação e desenvolvimento no futuro de Portugal.

Valores que são simultaneamente revolução, ideais, conquistas, participação e intervenção de massas, essa mesma intervenção que se revelou uma imensa força de transformação e avanço.

Valores da liberdade, emancipação social, do Estado ao serviço do povo e não da exploração, do desenvolvimento social, da soberania e independência nacional.

Valores que são património e realização como o são a experiência da liquidação do capital monopolista, a edificação da Reforma Agrária ou a efectivação das políticas de valorização do trabalho e dos trabalhadores e dos direitos sociais universais.

Valores que são inspiração para a acção de mais e mais portugueses que aspiram a uma vida melhor numa sociedade mais justa.

Uma política patriótica e de esquerda que, afirmando os interesses do povo e do País e a decisão soberana do povo português, se baseie em seis opções fundamentais nas quais se incluem: - a renegociação da dívida que se torna cada vez mais uma necessidade para relançar a economia do País; a defesa e o aumento da produção nacional; a valorização dos rendimentos das populações, nomeadamente dos trabalhadores e dos reformados; a defesa e recuperação dos serviços públicos, em particular nas funções sociais do Estado; uma política orçamental de combate ao despesismo, à despesa sumptuária, baseada numa componente fiscal de aumento da tributação dos dividendos e lucros do grande capital e de alívio dos trabalhadores e das pequenas e médias empresas; uma política de afirmação do primado dos interesses nacionais nas relações com a União Europeia.

Uma política patriótica e de esquerda para dar cumprimento ao projecto de progresso e justiça social que a Constituição da República Portuguesa consagra!

Perto do fim deste V Tomo e perante a perigosa e sombria perspectiva da liquidação do processo revolucionário de Abril e a ameaçadora perspectiva de uma prolongada ofensiva contra as suas conquistas, naquele grande Comício de 7 de Dezembro de 1975, Álvaro Cunhal afirmava:

“O povo português pode estar seguro. Quaisquer que sejam as circunstâncias, o PCP luta e lutará sempre em defesa das classes trabalhadoras, em defesa de todos os explorados e oprimidos, em defesa das vítimas da injustiça social, em defesa de todos quantos sofrem a miséria, os arbítrios, as violências, as humilhações, as ofensas impostas pela sociedade capitalista.

Fazendo frente aos temporais, o PCP luta e lutará sempre e sempre pela liberdade, pela liquidação da exploração capitalista, pela vitória do socialismo em Portugal.

O PCP é o Partido da verdade, é o Partido da esperança.

O PCP tudo fará para estar à altura da confiança que nele depositaram a classe operária e as massas populares.”

Foi assim até hoje e assim será no futuro!

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