Intervenção de

Antigos combatentes - Intervenção de António Filipe na AR

 

 

Regulamentação dos efeitos jurídicos dos períodos de prestação de serviço militar de antigos combatentes para efeitos de atribuição dos benefícios previstos na Lei n.º 9/2002, de 11 de Fevereiro, e na Lei n.º 21/2004, de 5 de Junho

Sr. Presidente,
Sr. Ministro da Defesa Nacional,

A questão que lhe quero colocar diz respeito a uma parte particular do universo abrangido por esta proposta de lei (proposta de lei n.º 220/X), os cidadãos ex-combatentes residentes no estrangeiro.

A aplicação da legislação relativa aos antigos combatentes portugueses residentes no estrangeiro tem sido um folhetim interminável e tenho as maiores dúvidas que este diploma resolva o problema que estes cidadãos emigrantes que combateram na guerra colonial têm vindo a ter desde há muitos anos.

A questão que eles colocam não é uma questão de dinheiro, não tem a ver com as pensões, tem antes a ver com a situação daqueles que, não trabalhando quando viviam em Portugal, foram mobilizados para a guerra e, depois, emigraram, só se tendo inscrito na segurança social e feito descontos nos países de acolhimento, nos países onde passaram a viver.

Aquilo que reivindicam é que o tempo que passaram na guerra possa ser considerado para efeitos das reformas que hão-de obter, ou que obtiveram, nos países onde vivem.

Portanto, o reconhecimento que pedem ao Estado português é esse, ou seja, que possam fazer valer esse tempo para o exercício do seu direito à reforma nos países de acolhimento.

Pela leitura dos pareceres a que tivemos acesso, dados pelas associações representativas destes cidadãos relativamente a esta proposta de lei, verificámos que continuam a considerar que este problema não é resolvido por esta legislação e que o actual Governo, através do Sr. Secretário de Estado António Braga, há já mais de um ano discutiu com eles uma solução que permitiria dar resposta a esta reivindicação.

Por isso lamentam não ter sido a mesma acolhida nesta proposta de lei. Gostaria de saber qual é a posição do Governo a este respeito e como é que vê este problema e a respectiva resolução, dado que, segundo parece, esta proposta de lei não resolve a questão considerada essencial por parte destes cidadãos.

(...)

Sr. Presidente,
Srs. Membros do Governo,
Sr.as e Srs. Deputados,

Há ironias. Ontem, estivemos a discutir, nesta Câmara, a disponibilização de 20 000 milhões de euros para salvar os bancos e hoje estamos a discutir a forma de poupar 13 milhões de euros à custa dos antigos combatentes.

Há, repito, ironias!

Isto porque, manifestamente, aquilo que de mais palpável caracteriza esta proposta de lei é reduzir direitos adquiridos.

E que direitos são esses?

São direitos que foram adquiridos através da já célebre Lei n.º 9/2002, aprovada nesta Assembleia por unanimidade, como já foi dito.

Foi feita muita demagogia à custa dos antigos combatentes e muitas promessas, algumas delas até incumpríveis, o que fez com que a própria Lei n.º 9/2002 tenha sido, para muitos deles, uma frustração, porque nem sequer correspondeu àquilo que lhes tinha sido - e mal! - prometido.

Foi, porém, o direito que conseguiram obter para que muitos deles pudessem ter algum acréscimo nas suas pensões.

Como se sabe, esta lei tem tido uma vigência atribulada, porque foi necessário alargar o respectivo âmbito de aplicação, o que só veio a acontecer muito mais tarde.

E aquilo a que estamos a assistir agora é a que este Governo, em nome «do combate aos privilégios» - porque entende que, no âmbito da aplicação da lei, algumas pessoas saem mais favorecidas do que outras -, em nome de uma falsa justiça social, vai lesar direitos adquiridos de cidadãos que não estão manifestamente entre aqueles que são os privilegiados da nossa sociedade.

Portanto, no fundo, o Governo aplica aos antigos combatentes o princípio que tem vindo a aplicar para lesar os direitos da grande maioria dos portugueses: o direito das suas reformas, do seu acesso à saúde, enfim, nos vários domínios da acção social do Estado, e que também têm afectado de sobremaneira os militares, como todos nós sabemos.

Temos tido a oportunidade, inclusivamente, ao longo destes últimos anos, de discutir aqui, nesta Assembleia, diplomas do Governo que têm lesado, efectivamente, a condição militar em várias vertentes.

Com este diploma estamos a ver que é dado um escassíssimo benefício a alguns cidadãos de menores recursos, o que obviamente, do nosso ponto de vista, bem que poderia ser dado, mas sem estar a lesar direitos adquiridos por muitos outros e que não são direitos desproporcionados, não são injustificados, correspondem a um elementar dever de justiça. Portanto, não entendemos esta forma de fazer pseudo-justiça social, que é prejudicar a situação de cidadãos que, longe de serem privilegiados, estavam a beneficiar de um direito que foi penosamente adquirido através de legislação aprovada por unanimidade nesta Assembleia.

Estamos, manifestamente, perante um retrocesso e, como é evidente, esse retrocesso não pode contar o nosso apoio!

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