Intervenção de

Abertura do comércio aos domingos e feriados - Intervenção de Agostinho Lopes na AR

 

Petição solicitando que se proceda no sentido da defesa da abertura do comércio aos domingos e feriados

Sr. Presidente,

Srs. Deputados,

Estamos perante uma petição esquisita (petição n.º 394/X), e não é pelo seu número. Tenho até dúvidas de que se lhe possa chamar petição, porque é pouco conforme com o artigo 52.º da Constituição da República, que estabelece o direito de petição.

A Constituição da República fala dos direitos de os cidadãos, individual ou colectivamente, apresentarem petições. Ora, no caso em apreço não foram os cidadãos que se mobilizaram, organizaram e recolheram as assinaturas, nem sequer uma associação de consumidores - e tal teria alguma lógica. Não! Foi uma associação empresarial de grandes empresas de distribuição que determinou, que ordenou aos seus funcionários que, nas caixas das unidades comerciais, no período em que confirmam a despesa e recebem o pagamento dos clientes, lhes apresentassem uma folha para subscreverem o apoio aos interesses da APED, a abertura ao comércio ao domingo.

Não foi o Sr. Belmiro de Azevedo nem o Sr. Jerónimo Martins, e outros membros dos conselhos de administração, que andaram militantemente a recolher à porta dos hipermercados e dos centros comerciais o apoio à sua petição. Não! Foram os seus funcionários, durante as horas de serviço, e só isso mereceria alguma reflexão por parte desta Câmara!

Julgo que não temos dúvidas sobre o resultado de uma petição apresentada, por exemplo, pelos

funcionários da segurança social aos seus utentes a pedir-lhes que subscrevam uma petição a solicitar que esses serviços estivessem abertos aos sábados e domingos...

Podemos ir fazer ao Areeiro para fazer essa petição...

O «profissionalismo» da APED foi tão longe que pôs uma sociedade de revisores oficiais de contas a escrutinar a legitimidade e a legalidade dos procedimentos e assinaturas da petição. Notável!!

Srs. Deputados, todos sabemos o que a APED quer e os seus argumentos: a liberalização completa do horário do comércio como um dos instrumentos, a par da sua expansão sem limites, na absorção e monopolização total do comércio a retalho. O grave é que o PS e o PSD tenham recuperado o bloco central para lhe fazer o jeito: o PS avançando como uma inaceitável lei do licenciamento e o PSD com um projecto de lei de liberalização dos horários.

Mas nestas manobras em que o Governo do PS e a sua maioria parlamentar se vão envolvendo, sempre do lado do grande capital, algumas coisas são interessantes.

Recordo as palavras do Sr. Deputado David Martins, em 27 de Setembro de 2006: «Pelos motivos expostos, é nosso entendimento que, na actual conjuntura - e julgo que essa conjuntura não mudou assim tanto - não é adequado proceder a qualquer alteração ao diploma legal vigente.»

Por outro lado, o PSD, que, pela voz do Deputado Mendes Bota, tinha defendido o encerramento ao domingo, acabou por, em Abril último, apresentar a lei para a liberalização total. E levou o PS atrás, todo contente, depois do «ámen» do Secretário de Estado do Comércio...!

Entretanto, o PS descobre que, em 2009, haverá várias eleições e que os comerciantes votam!

E, para equilibrar as malfeitorias que já fizeram ao comércio tradicional, uma travagem no processo fica sempre bem... Então resolveram que o projecto de lei do PSD fica a «marinar», à espera de uma avaliação cuidadosa e independente dos «impactos» que dela possam advir!

Mas, Srs. Deputados, esses estudos feitos por universidades já existem: existe pelo menos o da Universidade Católica - aliás, encomendado pela Associação Portuguesa de Centros Comerciais -, existe a do Prof. Ernâni Lopes e também o da empresa de consultores Roland Berger. Os resultados são os que quem encomendou e pagou quer: «sim» à liberalização dos horários!

E ninguém tem dúvidas do que mais estudos, por mais independentes que sejam, produzirão.

Por isso, seria importante que o PS se deixasse de estudos e esclarecesse os portugueses em geral e os comerciantes em particular sobre qual a sua posição quanto aos horários do comércio - e de preferência que o clarificasse antes das eleições de 2009!

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