Intervenção de Alma Rivera na Assembleia de República, Reunião Plenária

São precisas medidas de reforço das Comissões de Protecção de Crianças e Jovens

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Um país com presente e com futuro é um país que coloca as crianças, o cumprimento dos seus direitos num lugar central das suas opções políticas. Para o PCP este objetivo é absolutamente central no projeto e alternativa política que defendemos.

A Constituição da República Portuguesa traduz essa prioridade e diz-nos que as crianças têm direito à proteção da sociedade e do Estado, para o seu desenvolvimento integral, especialmente contra todas as formas de abandono, de discriminação e de opressão e contra o exercício abusivo da autoridade na família e nas demais instituições. E que ao Estado compete assegurar especial proteção às crianças por qualquer forma privadas de um ambiente familiar adequado.

O direito à proteção e a cuidados especiais, o direito ao amor e ao afeto, ao respeito pela sua identidade, o direito à diferença e à dignidade social, o direito a serem desejadas, à integridade física e a uma alimentação adequada, ao vestuário, à habitação, à saúde, à segurança, à instrução e à educação, são direitos de toda e da cada criança.

Mas a política que serve os grandes e poderosos, a política que chantageia, que invoca e usa cinicamente os papões do mercado e das regras desumanas das instituições que o servem, a política que não protege o tempo para a família e a vivência coletiva, a política que tira as casas às famílias em nome dos juros e dos lucros dos bancos, a política que não coloca o combate às desigualdades como aspeto primeiro e fundamental do horizonte de uma sociedade faz com que, na verdade, os direitos fundamentais não cheguem a todas as crianças que nascem no nosso país e no mundo.

E assim, mesmo com direitos fundamentais firmados, mesmo tendo-se evoluído muito face ao que se vivia há 5 décadas no fascismo, a vida quotidiana de milhares de crianças no nosso país é bem diferente da letra da lei e nem todas conhecem os mesmos direitos. A vida de tantas crianças é hoje marcada por múltiplas formas de negligência, discriminação, exclusão social e efetiva violência.

A vida de inúmeras crianças não é a vida a que têm direito e os dados da promoção e proteção de crianças e jovens demonstram uma realidade que tem de ser um grito de alerta:

No ano de 2022 as CPCJ acompanharam 74.191 crianças, das quais 28.396 tiveram processo de promoção e proteção. Há, uma vez mais, um aumento face ao ano anterior, assim como a tendência quanto às categorias de perigo, em que a maioria das situações são de violência doméstica, seguidas da negligência e, em terceiro lugar, os comportamentos de perigo.

O aumento do número de processos abertos e de crianças acompanhadas, bem como a complexidade e urgência de cada caso para cada criança, exige que a resposta do Estado seja célere, atenta, cuidada e de qualidade. Exigências que nem sempre são compagináveis com o estrangulamento dos serviços e a sobrecarga dos profissionais que compõem as CPCJ.

É preciso adequar os meios disponíveis para intervir ao tempo das crianças e o tempo das crianças não é igual ao tempo do adultos: o tempo para intervir junto de uma criança em risco é sempre curto e todas as crianças têm direito àproteção e a um projeto de vida digno.

Apesar do trabalho dedicado dos elementos das CPCJ, do trabalho realizado na área da prevenção e dos esforços para um trabalho coordenado e articulado com as instituições da comunidade, a situação económica e social e a falta de meios humanos acaba por esmagar a sua capacidade de intervenção.

Por isso, neste debate que se centra principalmente em crianças que já não se encontram em meio natural de vida, queremos também trazer a intervenção a montante, de 1ª linha.

Porque para uma verdadeira possibilidade de intervenção que previna ou ponha termo a situações suscetíveis de afetar a segurança da criança, a sua saúde, formação, educação ou desenvolvimento integral é preciso dar possibilidade de facto às CPCJ para apoiarem e acompanharem as famílias a porem em prática o plano de intervenção definido.

E por isso o projeto que aqui trazemos insta o governo a adotar as medidas necessárias à resolução da carência de técnicos nas Comissões de Proteção de Crianças e Jovens, para que os técnicos no âmbito da Segurança Social e da Saúde sejam designados a tempo inteiro. Para que o governo defina, em articulação com as CPCJ, as medidas necessárias para resolver com carácter prioritário as carências de estruturas de acolhimento temporário e de emergência, tal como as medidas necessárias para assegurar a existência de condições para o trabalho integrado com as famílias de origem das crianças e jovens sinalizados.

Hoje estamos a discutir um conjunto de projetos que se dirigem a diferentes âmbitos e que na generalidade acompanhamos.

Mas temos de dar mais passos. Tem de ser feito mais.

Recentemente aumentamos (ou estamos em vias de o fazer) para os 18 anos a idade até à qual o jovem pode ser adotado.

Foi aprovado o projeto de lei do PCP que permite a retoma das medidas de acolhimento e a implementação de programas de autonomização.

Estão em cima da mesa também vários projetos sobre a adoção e que merecem um cuidado trabalho na especialidade.

Mas é preciso muito mais. Meios, investimento, valorização dos técnicos e profissionais que trabalham com as crianças e nesta área.

É preciso aumento o acolhimento familiar e ajudar as famílias de acolhimento.

É preciso elevar as condições de acolhimento residencial, elevar as condições das instituições, formar e fixar pessoal.

É preciso que o governo publique a portaria do acolhimento residencial que está por fazer desde 2019.

Srs deputados, quando falamos de direitos, e de direitos das crianças, não são aceitáveis argumentos que subalternizem as necessidades ao défice, à dívida ou às regras dos compromissos internacionais.

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