Declaração de Bernardino Soares, Membro do Comité Central, Conferência de Imprensa

Romper com a política em curso – defender o SNS

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Os principais problemas do Serviço Nacional de Saúde, em especial no que diz respeito aos seus profissionais, arrastam-se sem solução.

A divulgação pela Entidade Reguladora da Saúde (ERS) dos dados sobre a actividade hospitalar, em particular relativa a cirurgias e a consultas de especialidade por solicitação dos cuidados primários de saúde, mostra duas realidades fundamentais: que é o SNS que continua a assegurar a larga maioria dos cuidados de saúde às populações e que perante as crescentes necessidades se agravam os tempos de espera, incluindo na área oncológica.

Segundo a ERS há quase 600 mil pessoas a aguardar uma primeira consulta de especialidade, considerando apenas as enviadas pelos centros de saúde, quase metade das quais (47%) acima dos Tempos Máximos de Resposta Garantidos (TMRG); há cerca de 190 mil pessoas à espera de uma cirurgia, 23% das quais com tempo de espera superior ao TMRG; na oncologia 1258 utentes estão à espera de primeira consulta e quase 7 mil aguardam por uma cirurgia, dos quais, respectivamente, 70 % e 24% ultrapassaram já o TMRG; na cardiologia mais de 15 mil pessoas aguardam uma primeira consulta, 85% das quais acima do TMRG, e quase 3 mil aguardam por cirurgia cardíaca, 51% acima do TMRG.

Entretanto agrava-se a situação dos cuidados primários de saúde, em particular no que diz respeito à falta de médicos de família, que atingia já 1,6 milhões de pessoas no final de Março. O anúncio recente pelo Governo da abertura de concursos com 900 vagas para os centros de saúde e 1500 vagas para especialidades hospitalares - alguns dos quais ainda por iniciar ou em processo distante de conclusão - mostra  que o Governo optou por deixar os cerca de 1300 recém especialistas que terminaram a formação até Março, à mercê da ofensiva do sector privado para a sua contratação.

É inaceitável que quer o Ministro da Saúde, quer o Director Executivo do SNS, venham, em contraste com os números de vagas anunciados, considerar que já será um sucesso contratar 250 especialistas em Medicina Geral e Familiar – os médicos de família – e 600 ou 700 especialistas hospitalares, isto é, pouco mais de um quarto e menos de metade das vagas respectivamente anunciadas. Como o PCP tem denunciado a opção pela não valorização dos profissionais de saúde está a retirar atractividade ao SNS com prejuízo para o acesso de todos ao direito à saúde como a Constituição consagra.

Em simultâneo multiplica-se a criação de Unidades Locais de Saúde (ULS). É uma evidência que os resultados das ULS já em funcionamento não se traduziram em geral por uma melhor articulação dos cuidados, mas sim por uma gestão orientada para a concentração de serviços, desvalorizando ainda mais os Cuidados de Saúde Primários. O que está em curso, sob a capa de reorganização, é o encerramento de mais serviços, e o abrir de caminho para a crescente contratação a nível local de prestadores privados. 

Ao mesmo tempo o Governo continua a protelar a aprovação dos orçamentos e planos de actividades da grande parte dos hospitais e centros hospitalares, sujeitos a veto de gaveta do Ministério das Finanças - uma verdadeira cativação orçamental -, agravando a já escassa autonomia e impedindo a concretização de medidas de gestão que necessitam desses instrumentos. 

O Governo continua assim a sua política de limitação da capacidade do SNS, para transferir ainda mais recursos públicos para o sector privado. Continua a não valorizar os profissionais de saúde, prossegue na política de encerramento e concentração de serviços, mantém uma política de desinvestimento, bem patente no facto de, dos 914 milhões de euros inscritos no Orçamento do Estado, só ter executado no primeiro trimestre do ano 67 milhões de euros (cerca de 7%). Trata-se de uma política que converge com as orientações do PSD e dos partidos da direita em geral e corresponde objectivamente à estratégia em curso para uma crescente privatização dos cuidados de saúde e aos interesses dos grupos económicos que intervêm neste sector e vêem na doença uma fonte de negócio.

O PCP reafirma a necessidade de inverter esta política de destruição do SNS, apostando na valorização dos seus profissionais, no aumento do investimento e numa maior autonomia das unidades do SNS, única forma de garantir o direito à saúde das populações.

O PCP sublinha a importância das acções de luta dos profissionais de saúde nos últimos meses, em defesa dos seus direitos e do próprio Serviço Nacional de Saúde e valoriza a convocação, pelo movimento sindical unitário e pelos movimentos de utentes, para 20 de Maio, da Marcha pelo Direito à Saúde, em Lisboa, Porto e Coimbra, importante iniciativa para exigir uma política que garanta o direito à saúde de toda a população.