Projecto de Resolução N.º 1093/XIV-2ª

Reforço da resposta dos Centros Públicos de Procriação Medicamente Assistida

Exposição de motivos

As dificuldades no acesso às técnicas de procriação medicamente assistida já eram uma realidade que a epidemia veio agravar de forma muito expressiva. Tal como os demais cuidados de saúde prestados no Serviço Nacional de Saúde, os tratamentos de infertilidade também registaram inúmeros atrasos. Se antes da epidemia as listas de espera dos Centros Públicos de Procriação Medicamente Assistida atingiam 12 a 16 meses, hoje as listas de espera podem atingir cerca de dois anos.

Os atrasos nas listas de espera, no acesso aos tratamentos de procriação medicamente assistida são bastante penalizadores para as mulheres, porque à medida que o tempo vai passando reduz a probabilidade de taxa de sucesso dos tratamentos e o relógio biológico não para. Com o aproximar da idade limite de acesso aos tratamentos, 39 anos e 364 dias, muitas mulheres são excluídas das listas depois de atingirem os 40 anos.

Infelizmente muitas mulheres que já têm 40 anos já não têm acesso às técnicas de procriação medicamente assistida, porque os centros públicos suspenderam a atividade entre março e maio/junho e quando retomaram não foi a 100% o que teve como consequência o aumento do tempo de espera no acesso aos tratamentos. No final do ano voltou a registar-se uma redução da atividade dos centros públicos, porque os diversos serviços foram alocados aos doentes com covid 19, tendo consequências num novo aumento das listas de espera.

É uma corrida contra o tempo e uma situação extremamente injusta e desumana para as mulheres que ficaram excluídas porque fizeram 40 anos, quando a suspensão e a quebra da atividade dos serviços não são da responsabilidade destas mulheres.

A quebra da atividade dos centros públicos de procriação medicamente assistida ronda entre 30% a 40% segundo as declarações do presidente da Sociedade Portuguesa de Medicina Reprodutiva.

A situação é ainda mais grave quando há necessidade de recorrer a doações de gâmetas, seja de ovócitos ou de espermatozoides. Nestes casos, os tratamentos estão praticamente parados. Nos centros públicos praticamente não houve doação de gâmetas, apenas oito ovócitos.

Perante esta situação o Conselho Nacional de Procriação Medicamente Assistida (CNPMA) emitiu uma recomendação a 26 de junho de 2020 e passa-se a citar De maneira a que seja garantido o direito de acesso aos tratamentos programados a todas as beneficiárias que, por força da perturbação da atividade dos Centros, ultrapassaram o limite de idade para acesso aos tratamentos de PMA a partir do dia 18 de março de 2020 (data em que foi decretado o estado de emergência em Portugal, através do Decreto do Presidente da República n.º 14-A/2020, de 18 de março), o CNPMA determinou prolongar em 6 meses este limite, devendo ser o acesso a estes tratamentos garantido até ao final do presente ano (31 dezembro de 2020).”

Mais recentemente o CNPMA requereu “ao Ministério da Saúde a suspensão imediata, e por um prazo não inferior a um ano, do critério da idade para efeitos de admissão a técnicas de PMA de 2.ª linha, nos termos fixados pela Circular Normativa n.º. 15/2019/DPS/ACSS”, considerando o agravamento da situação.

O CNPMA realizou um inquérito junto dos Centros de Procriação Medicamente Assistida, referente ao período entre 8 de março e 15 de agosto. Os principais resultados do inquérito indicam que:

«- a maioria dos Centros de PMA reduziu a atividade em 75 a 100%, estimando-se que possam ter sido cancelados/adiados aproximadamente 2900 ciclos;

- no caso dos centros públicos, a estimativa é de que a suspensão ou redução da atividade em PMA se repercuta em até 8 meses adicionais de tempo de espera;

- quando comparada a atividade registada pelos Centros de PMA em 2020 com os últimos anos no período homólogo (de março a agosto), verifica-se uma quebra brutal da atividade assistencial, com uma variação no último ano de -48% no sector público e de -33% no sector privado.»

A epidemia da Covid 19 teve impactos profundamente negativos no acesso às técnicas de procriação medicamente assistida, piorando as dificuldades já existentes pré-pandemia. Neste último ano, muitos beneficiários viram adiado o sonho de ter um filho devido à suspensão e/ou redução da atividade dos Centros Públicos de Procriação Medicamente Assistida. Para a esmagadora maioria das famílias o recurso ao setor privado não é solução, porque não dispõem das condições económicas que permitam suportar os elevados custos associados. Deste modo, o SNS é a solução para dar concretização ao legítimo desejo de muitas famílias de poderem ter um filho.

Tal como em muitos serviços, os Centros Públicos de Procriação Medicamente Assistida foram também bastante afetados pelo desinvestimento no Serviço Nacional de Saúde, que se reflete no reduzido número de centros públicos, na carência de profissionais de saúde, nas elevadas listas de espera. Também nesta área é necessário o reforço de meios financeiros e humanos para aumentar a capacidade de resposta dos Centros Públicos de Procriação Medicamente Assistida. São necessárias medidas excecionais face aos impactos negativos da epidemia e medidas que permitam recuperar e reforçar a atividade dos Centros Públicos de Procriação Medicamente Assistida.

É neste sentido que o PCP apresenta a presente iniciativa em que recomenda ao Governo que adote um programa excecional de recuperação de listas de espera e de reforço da atividade dos Centros Públicos de Procriação Medicamente Assistida integrados no Serviço Nacional de Saúde.

Assim, tendo em consideração o acima exposto, e ao abrigo da alínea b) do n.º 1 do Artigo 4.º do Regimento, os Deputados abaixo assinados do Grupo Parlamentar do PCP apresentam o seguinte Projeto de Resolução:

Resolução

A Assembleia da República recomenda ao Governo, nos termos do n.º 5 do Artigo 166.º da Constituição, que tome medidas para reforçar a resposta pública na área da Medicina Reprodutiva, designadamente através da adoção de um programa excecional de recuperação de listas de espera e de reforço da atividade dos Centros Públicos de Procriação Medicamente Assistida integrados no Serviço Nacional de Saúde que, entre outros, contemple:

  1. O alargamento da idade das mulheres no acesso às técnicas de procriação medicamente assistida, abrangendo as mulheres que constavam das listas de espera e que foram excluídas ou que lhes foram negados os tratamentos porque fizeram 40 anos, tendo em conta o aumento das listas e do tempo de espera na sequência da redução da atividade dos Centros Públicos de Procriação Medicamente Assistida devido à epidemia do SARS-Cov-2;
  2. A criação de um regime excecional de atribuição de incentivos aos profissionais de saúde para recuperar as listas de espera, nomeadamente na realização de consultas e de tratamentos em atraso;
  3. O efetivo reforço de recursos materiais e humanos necessários, designadamente com a contratação de profissionais de saúde para reforço das equipas dos Centros Públicos de Procriação Medicamente Assistida, dispensando a prévia autorização dos membros do Governo;
  4. Adoção de medidas para reforço da captação de doadores de gâmetas nos bancos públicos, com vista ao aumento significativo de dádivas.
  5. Concretização de um plano de alargamento do número de bancos de recolha de doações de gâmetas.
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