Projecto de Resolução N.º 2049/XIII

Recomenda ao Governo que inicie o processo de desvinculação de Portugal do Tratado Orçamental

Recomenda ao Governo que inicie o processo de desvinculação de Portugal do Tratado Orçamental

O Tratado sobre Estabilidade, Coordenação e Governação na União Económica e Monetária (Tratado Orçamental), imposto pelo eixo franco-alemão e assumido em Portugal pelo PS, PSD e CDS, é um dos instrumentos reveladores da designada 'construção europeia', direcionada e concebida em função dos interesses dos grandes monopólios transnacionais, orientada para a concentração de poder em instituições supranacionais dominadas pelas principais potências capitalistas da Europa e distantes do controlo dos povos, à custa da perda de soberania e da erosão da democracia e das condições de vida dos trabalhadores e dos povos.

Não tendo colhido a unanimidade, a solução encontrada foi a assinatura de um tratado intergovernamental subscrito por 25 Estados Membros, com o compromisso de o seu conteúdo integrar a legislação europeia no prazo de cinco anos.

Passados cinco anos, o relatório sobre a proposta de Diretiva da Comissão Europeia relativa “ao reforço da responsabilidade orçamental e da orientação orçamental de médio prazo dos Estados-Membros” – onde se propunha a transposição das regras do Tratado Orçamental para o ordenamento jurídico da União Europeia - foi rejeitado na Comissão dos Assuntos Económicos e Monetários do Parlamento Europeu. Perante isto, o processo foi suspenso no Parlamento Europeu.

O facto e as razões evocadas que levaram à rejeição da transposição do conteúdo, regras e imposições do Tratado Orçamental para o quadro jurídico da União Europeia deveriam, em coerência, suscitar e corresponder à sua revogação. Mas não é nessa direção que segue este processo. O Tratado Orçamental não foi transporto, e bem, para o quadro jurídico da União Europeia, mas continua em vigor para os Estados-Membros que o subscreveram, onde se inclui Portugal.

O Tratado Orçamental foi criado com o objetivo de ir mais longe no condicionamento da política orçamental dos Estados da zona Euro, institucionalizando limitações e constrangimentos orçamentais à custa dos salários, dos direitos e do investimento público, ao mesmo tempo que acentuou mecanismos de chantagem, pressão e ingerência associados à União Económica e Monetária, ao Euro.

Em Portugal, PS, PSD e CDS como “bons alunos” trataram logo de transpor para a ordem jurídica interna regras e procedimentos, incluindo no plano orçamental, expressos no Tratado Orçamental.

As consequências da aplicação das regras do Tratado Orçamental no nosso país são bem visíveis na obsessão pela redução do défice das contas públicas. Ao invés de se investir na valorização dos rendimentos dos trabalhadores, no reforço dos direitos ou no investimento público para ultrapassar os défices estruturais que persistem, como é claramente exemplo o défice produtivo.

Muitos se perguntam, qual o impacto destas regras e tratados na vida quotidiana de milhões de portugueses. Pois bem, se não há recursos financeiros para a valorização dos salários e pensões, para a valorização das carreiras, para a contagem do tempo de serviço nas carreiras especiais, para a contratação de trabalhadores em falta no Serviço Nacional de Saúde ou na Escola Pública, para a requalificação do parque escolar, de centros de saúde e hospitais ou a construção de novos equipamentos, para o reforço de material circulante ferroviário e de navios para assegurar transportes públicos de qualidade, para o necessário investimento público capaz de potenciar a coesão territorial e o incremento da produção nacional, tudo isso se deve também, para além das opções de cada governo, às limitações e constrangimentos impostos pelas regras orçamentais do Tratado Orçamental. Regras essas que têm dois pesos e duas medidas em função do tipo de interesses em presença. Aos direitos dos trabalhadores e dos povos são negados os recursos que são desviados para tapar os buracos da corrupção e da especulação na banca privada, alimentar parcerias público privadas ou desviar milhares de milhões de euros para o sorvedouro dos juros da dívida pública.

A aplicação do Tratado Orçamental serviu para impedir e condicionar o desenvolvimento económico, para impor o ataque aos direitos laborais e sociais e, condicionou, de forma inaceitável, o direito de os portugueses optarem e decidirem de forma soberana sobre o seu futuro coletivo, através de crescentes limitações à soberania orçamental da Assembleia da República, prevista e salvaguardada na Constituição da República Portuguesa. Tais imposições vieram acentuar ainda mais as consequências da adesão de Portugal à União Económica e Monetária e a consequente submissão às suas regras de funcionamento. Nos 20 anos antes da adesão ao Euro, Portugal teve um crescimento médio do PIB superior ao dos países da UE e ao do PIB mundial, nos 20 anos após a adesão, o que o País conheceu foi a recessão e estagnação económicas, com um crescimento médio anual do PIB inferior a 1%. Foi também com o Euro e as regras que lhe estão associadas que a dívida pública disparou para uma das maiores do mundo (atualmente 121,5% do PIB), que o desemprego duplicou, que se acentuou a debilitação dos sectores produtivos da economia e que a dependência externa do País se acentuou.
Sujeitar o País às regras do Tratado Orçamental é amarrar Portugal a constrangimentos e limitações, é estrangular o presente e condicionar o futuro do País.

O PCP rejeita liminarmente o caminho de abdicação e submissão nacional, de retrocesso económico e social, de eternização das políticas de empobrecimento, de liquidação de conquistas e direitos democráticos, de amputação significativa da soberania nacional. O futuro do País passa pela recuperação de instrumentos de soberania, designadamente a desvinculação de Portugal do Tratado Orçamental.

Pelo exposto, nos termos da alínea b) do artigo 156.º da Constituição e da alínea b) do n.º 1 do artigo 4.º do Regimento, os Deputados do Grupo Parlamentar do PCP propõem que a Assembleia da República adote a seguinte resolução:

Resolução

A Assembleia da República resolve defender a desvinculação de Portugal do Tratado sobre Estabilidade, Coordenação e Governação na União Económica e Monetária (Tratado Orçamental) e nos termos do n.º 5 do artigo 166.º da Constituição, recomendar ao Governo que:

1. Inicie um processo de desvinculação de Portugal do Tratado Orçamental;

2. Adote as diligências necessárias, no âmbito da União Europeia, ao início de um processo de revogação do Tratado Orçamental e à promoção de um programa de apoio a países pelos prejuízos decorrentes do Pacto de Estabilidade e Crescimento e da concretização da União Económica e Monetária.

Assembleia da República, 15 de março de 2019

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