Comunicado da Comissão Política do Comité Central do PCP

O PCP apoia a manifestação de estudantes e exige a revogação da nova lei de financiamento do ensino superior

1. Os protestos de estudantes que se têm verificado em várias instituições do ensino superior colhem largo apoio e expressam o descontentamento mais geral que atravessa os meios do ensino superior.

Estes protestos são a expressão mais visível das preocupações que se espalham na sociedade portuguesa quanto ao futuro do ensino superior.

2. Este descontentamento tem-se acentuado após anos de sub-investimento do Estado através do não cumprimento sistemático de anteriores compromissos de financiamento e na ausência de saídas profissionais. E confirma-se na recente propostas de Orçamento do Estado para 2004.

A aprovação recente de uma nova lei de financiamento, que o Governo está a obrigar as instituições do ensino superior a aplicar, acarreta aumentos substanciais dos valores das propinas e remete a sua fixação para os órgãos de gestão das instituições. Sintomaticamente, uma recente portaria deduz nos orçamentos de funcionamento o valor das propinas das devidas comparticipações do Estado. E as instituições são objecto de chantagem ao serem penalizadas em termos orçamentais se não aplicarem o valor máximo das propinas.

O remeter a fixação do valor das propinas para as instituições é uma habilidade com que o Governo pretende deslocar a conflitualidade criada pelas suas próprias decisões e da sua maioria de direita para confrontos entre estudantes e órgãos de gestão.

Por outro lado, a proposta de nova Lei de Bases da Educação, consagrando a equiparação de direitos e apoios públicos ao ensino público e privado, articula outras decisões no sentido de se poder afirmar que o que se pretende, a prazo, é a liquidação do ensino superior público e, para já, afastar dele muitos estudantes e provocar a perda de autonomia real e uma crescente governamentalização e dependência mais extensa do Governo.

3. O acréscimo das propinas soma-se a uma série de outros encargos que estudantes e famílias têm que enfrentar para assegurarem a frequência do ensino superior (alimentação, alojamento, transportes, material, etc.).

Desta forma acabam por se atingir custos de frequência que atingem valores insuportáveis para grande número de famílias a que pertencem os estudantes, que tiveram que vencer a selectividade económica e social para chegarem ao ensino superior.

Ao contrário do que o Governo quer fazer crer, a generalidade dos estudantes não anda propriamente a nadar em dinheiro nem numa “borga” permanente.
Este tique de demagogia populista, muito típico da extrema direita, prolonga-se na mentira segundo a qual nenhum estudante deixaria de estudar por razões económicas. São conhecidos os baixos valores das bolsas que nem chegam para se equivalerem a isenções de propinas, o baixo número de estudantes que a elas têm acesso e as incorrecções resultantes da deficiente avaliação dos rendimentos familiares para se ter acesso às várias modalidades de uma Acção Social Escolar cujos aumentos nominais não chegam para cobrir os efeitos dos aumentos de propinas e que, nomeadamente no que respeita a cantinas e residências, é atingida por concessões e privatizações que aumentam os seus custos, diminuem a sua qualidade e alienam a eficaz fiscalização pelos seus utentes.

4. Por outro lado, a redução de verbas e o atraso da sua transferência para as unidades de investigação e projectos aprovados distancia-nos cada vez mais, também neste campo, da situação média na União Europeia e remete os nossos jovens investigadores para a precariedade.

5. Este descontentamento transcende as questões do financiamento e reflecte também os perigos que pairam sobre a gestão que deveria ser mais democrática, participada e eficaz.

A Lei da Autonomia que tem estado em debate parlamentar, e que passou recentemente por audições de diferentes instituições que expressaram essas discordâncias e propuseram alternativas, aumentaria a conflitualidade se viesse a conformar-se com os projectos do Governo.

De facto, a tentativa de impor, através de figurinos rígidos, órgãos unipessoais, estranhos à dinâmica interna das instituições, a pretexto de uma “profissionalização” da gestão - que tem existido mas numa base mais democrática -, a não garantia de fiscalização e controlo por órgãos eleitos e a redução da representação de estudantes e outros corpos, favoreceriam o desenvolvimento de conflitualidades internas.

A perda do sentido pela referência da paridade e do equilíbrio interno na composição dos órgãos afectaria a efectividade da participação em funções executivas e de fiscalização. A definição das prescrições, numa base de responsabilidade individual exclusiva dos estudantes pelo insucesso escolar, seria o prolongamento lógico da política de asfixia financeira das instituições cuja perda de qualidade inevitavelmente disso se ressente. A alteração de competências dos Conselhos Pedagógicos, a troco de uma mais favorável representatividade, nunca deveria pôr em causa, por exemplo, a capacidade de aprovação de regulamentos de avaliação de conhecimentos e de calendários escolares, de emissão de pareceres sobre planos estratégicos ou de criação e extinção de cursos.

6. Por todas estas razões e porque o País não se pode conformar com a degradação que o governo está querer provocar no sistema público do ensino superior, o PCP:

- Apoia a manifestação nacional de estudantes do ensino superior de amanhã, dia 5;

- Reafirma o seu apoio ao sentido das movimentações que se têm realizado;

- Exige a revogação da nova Lei de Financiamento do Ensino Superior;

- Propõe a reconsideração global das alterações em curso na política educativa e um percurso alternativo que eleve a qualidade do sistema público, instrumento insubstituível para assegurar a realização do direito constitucional à Educação, fundamental para a qualificação da juventude e para permitir um desenvolvimento económico sustentável do nosso País.

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