Declaração de Bruno Dias, Deputado e Membro do Comité Central, Conferência de Imprensa

Sobre os trabalhos da Comissão Parlamentar de Inquérito à Gestão da TAP

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Sobre o processo que levou à criação da CPI já foram apurados factos substanciais. A indemnização paga a Alexandra Reis é ilegal e vai ter de ser devolvida; quem pagou a indemnização ilegal foram o Presidente do Conselho de Administração e a Presidente da Comissão Executiva, e ambos já foram demitidos; quem autorizou a indemnização ilegal foram o Ministro Pedro Nuno dos Santos e o Secretário de Estado Hugo Mendes, e ambos já se demitiram.

Talvez por isso, o foco do tratamento mediático da CPI tem-se deslocado para questões laterais, muitas vezes empoladas, contribuindo em larga medida, não apenas para desvalorizar a TAP e atacar a existência de empresas públicas, mas também para corroer as instituições e o regime democrático, num ambiente tóxico no qual o PCP não só não se revê como tem procurado contrariar.

Para o PCP, é importante falar da TAP, não para a procurar vender depressa e a qualquer preço, mas para defender e desenvolver aquela que é uma das principais empresas nacionais.

E para quem conseguir penetrar através da espuma dos casos mediatizados, é possível tirar importantes conclusões sobre a TAP.

Desde logo sobre a importância da TAP para a economia nacional. Os dados enviados pela Segurança Social, que demonstram que a TAP entregou, nos últimos 10 anos, 1400 milhões de euros à Segurança Social, enquanto no mesmo período, a Ryanair apenas entregou 41 milhões, ilustram bem o quão diferente é termos uma empresa portuguesa a operar ou comprarmos os mesmos serviços a uma multinacional. Uma diferença que também se verifica no IRS pago, nos salários pagos em Portugal, no recurso a compras de produtos portugueses.

A CPI também já permitiu retirar importantes conclusões sobre o processo de privatização de 2015.

Desde logo, que David Neeleman comprou a TAP com dinheiro da própria TAP. O Governo PSD/CDS, conscientemente, ofereceu a TAP, uma das maiores empresas nacionais, a um empresário norte-americano, que usou dinheiro da TAP para fingir que estava a capitalizar a TAP. Esse empresário, que ficou com a TAP sem nela arriscar um tostão seu, retirou vantagens imediatas para si e para as outras companhias de que é proprietário. Quando chegou a pandemia, esse mesmo empresário não só fugiu às suas responsabilidades como ainda foi compensado com 55 milhões de euros que o Governo PS, conscientemente, lhe ofereceu para se ir embora. 

A CPI já demonstrou também que o Governo PS não andou bem. Recuperou a propriedade pública da TAP mas os privados continuaram a mandar.  E mesmo em 2020, quando a pandemia se abate sobre o sector aéreo, o processo foi conduzido de forma errada e pouco transparente. O caminho que o PSD defendia era inaceitável – a falência da TAP. O caminho que a IL tem defendido – o empréstimo de 3 mil milhões a David Neeleman, para este continuar a arriscar o dinheiro dos outros (do Povo português), é inaceitável. O caminho passava, como o PCP defendeu, por um plano de contingência para aguentar e capitalizar a TAP, transformando essa capitalização em capital social. 

Os trabalhos da CPI também já permitiram conhecer melhor muito do que esteve escondido do Povo português sobre o processo de reestruturação que foi imposto pela UE e pelo Governo PS como antecâmara da privatização. Já o tínhamos dito, e hoje sabemos que assim é: a TAP está a ser sobrecapitalizada para permitir que o futuro comprador privado a possa adquirir a preço de saldo. Dos muito badalados 3,2 mil milhões de euros de apoios públicos disponibilizados, 640,5 milhões são para compensar das perdas provocadas pela pandemia. E o restante, cerca de 1,5 mil milhões de euros para tapar dois buracos: o da Manutenção Brasil e o que foi aberto por quatro anos de gestão privada. Sobram cerca de 1000 milhões de euros que servem de especial atrativo para queira comprar a companhia, uma opção não muito diferente de anteriores privatizações que se realizaram no País. 

E sobre a reestruturação há um outro dado que a CPI já colocou toda a gente de acordo. O ataque aos trabalhadores foi até ao osso, para usar a expressão de Manuel Beja. Na TAP, como na generalidade dos grupos económicos privados, existem dois pesos e duas medidas. Para os trabalhadores cortes, para os administradores benesses – indemnização de meio milhão de euros para Alexandra Reis, remuneração mensal de 130 mil a Fernando Pinto na gestão privada, reforma dourada de 1,3 milhões para Max Urbahn da Atlantic Gateway, etc. Ou seja, já toda a gente está de acordo com o que nós aqui dissemos há três anos: este não é o caminho. Há voos atrasados ou que não se fazem por falta de trabalhadores. Há voos a serem subcontratados a companhias aéreas da Bulgária e da Estónia porque faltam trabalhadores.

Por fim, os trabalhos da CPI também já mostraram que um dos problemas da TAP é ter sido gerida – mesmo quando era uma empresa pública – como se fosse uma empresa privada. Não só porque os salários, os prémios, as indemnizações aos gestores, são incompatíveis com o Regime Jurídico do Sector Público. Mas também pela forma como se substitui o saber acumulado pela criação de oportunidades de negócio para escritórios de advogados e grandes multinacionais de consultoria que ganharam milhões à conta da TAP. 

Da parte do Grupo Parlamentar do PCP, continuaremos a intervir na CPI, quer na fase das audições que ainda não terminou, quer perante o relatório que venha a ser produzido.  

Mas quando assistimos todos os dias à necessidade de tirar consequências do que se está a passar na CPI, gostaríamos de sublinhar o seguinte: é preciso tirar consequências. Mas não estamos a falar de demissões. Estamos a falar de mudar as práticas e as políticas.

A coincidência desta CPI com a abertura pelo Governo do processo de privatização da TAP, junta objetivamente o PS com a direita num crime económico que precisa e pode ser evitado. O País não precisa de entregar mais uma empresa estratégica nas mãos do capital estrangeiro. O País precisa de dar condições à TAP para que esta faça o que tem de fazer. Estamos a falar de gerir as empresas públicas como elas devem ser geridas, acabando com a importação dos piores tiques da gestão privada, incluindo as remunerações milionárias dos seus administradores.

Estamos a falar de acabar com o segredo e a confidencialidade na gestão pública, impondo uma total e verdadeira transparência em todos os contratos que envolvam o Estado. Em que negócios como o da Airbus estiveram escondidos na gaveta durante anos. 

Estamos a falar de acabar com os ataques aos salários e aos direitos dos trabalhadores da TAP, verdadeiros salvadores da empresa, repondo o que foi cortado, valorizando carreiras e profissões, contratando – porque fazem falta – os trabalhadores necessários capazes de garantir a operação e o desenvolvimento da TAP.

Estamos a falar da necessidade de se avançar com a construção de um Novo Aeroporto de Lisboa, onde a TAP tenha o seu reduto e o seu Hub, trabalhando em conjunto com mais de 1000 empresas portuguesas que para ela vendem serviços, transportando – como mais nenhuma outra companhia – passageiros para Portugal, ou entre o Brasil e a Europa.

É nisso que estamos empenhados. E é para isso que, neste processo, o País pode continuar a contar com o PCP.

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