Pergunta ao Governo N.º 1455/XIV/1

Sobre a situação dos doentes hemodialisados no actual contexto de surto da COVID-19

Destinatário: Ministra da Saúde

Estima-se que haja em Portugal cerca de 12.500 doentes hemodialisados. São doentes que têm de sair das suas casas ou dos lares para fazer a hemodiálise três vezes por semana. Normalmente são transportados em viaturas de transporte de doentes não urgentes em grupos de 7/8 doentes.

Estes doentes integram-se, claramente, nos critérios definidos para os grupos de risco, principalmente pela sua condição clínica que os deixa em maior dificuldade de enfrentar a doença COVID 19. As recomendações da DGS para conter o surto, nomeadamente manter o distanciamento social de segurança não são cumpridas.

Na verdade, aos doentes hemodialisados é impossível fazer quarentena uma vez que precisam mesmo de sair de casa para fazer os tratamentos de diálise. É por isso muito importante que se reduza ao máximo o risco de poderem vir a ser infetados pelo coronavírus. A Sociedade Portuguesa de Nefrologia propõe que os doentes sejam transportados individualmente e não em grupos de doentes, para evitar o contacto social com outros doentes.

Só agora a Direção Geral de Saúde publicou a Orientação n.º 17/2020, de 25/03/2020, referente aos Doentes com Doença Renal Crónica em Hemodiálise. Até ao momento, não havia medidas de contingência definidas para as clínicas de hemodiálise, deixando os doentes expostos ao risco.

Chegou também ao Grupo Parlamentar do PCP, através da Associação Portuguesa de Deficientes, a preocupação quanto ao funcionamento das clínicas de hemodiálise privadas. Mais de 90% dos doentes com insuficiência renal fazem hemodiálise em clínicas privadas, no fundamental detidas por dois grandes grupos privados.

No concreto, uma clínica de hemodiálise no concelho de Almada, esta semana, informou os doentes que as sessões de hemodiálise passariam de 4 para 3 horas e que eventualmente o habitual lanche poderia vir a ser cancelado, alegando a falta de enfermeiros e de auxiliares. Foi ainda dito que estas alterações estariam a ser implementadas pelas clínicas pertencentes aos dois grupos privados na área da hemodiálise em Portugal.

Segundo a Circular Normativa da DGS sobre Gestão Integrada da Doença Renal Crónica – Metas e Objetivos para Monitorização de Resultados em Diálise Nº: 03/DSCS/DGID, de 22 de fevereiro de 2008, refere claramente que o tempo de diálise deve corresponder a 3 sessões semanais com um total de horas igual ou superior a 12 horas.

O Regulamento n.º 533/2014, que determina a Norma para o cálculo de Dotações Seguras dos Cuidados de Enfermagem, da responsabilidade da Ordem dos Enfermeiros, estipula que deve haver um enfermeiro por 4 camas/lugares. Nesta clínica em Almada há 180 doentes, tendo apenas 4 a 5 enfermeiros com vínculo permanente e mais cerca de 40 enfermeiros contratados, que realizam esta função como segundo trabalho.

A atitude destes grupos privados com clínicas na área da hemodiálise revela que a sua preocupação não é assegurar o bem-estar dos doentes, mas a obtenção de lucro. Por isso é que é tão importante alargar a resposta pública, no Serviço Nacional de Saúde, dos tratamentos de diálise.

Considerando as necessidades especificas destes doentes e os riscos a que estão expostos o Governo tem de assegurar o cumprimento das normas e orientações existentes no país, para garantir a qualidade dos tratamentos prestados pelas clínicas privadas de hemodiálise e desde já avançar com orientações e medidas claras para proteger estes doentes da COVID-19.

Ao abrigo das disposições legais e regimentais aplicáveis, solicitamos ao Governo que por intermédio do Ministério da Saúde, nos sejam prestados os seguintes esclarecimentos:

  1. Que fiscalização é realizada pelo Governo às clínicas de hemodiálise privadas, para assegurar que os cuidados prestados são de qualidade?
  2. Que medidas pretende o Governo tomar para garantir que as clínicas de hemodiálise privadas cumprem com as normas e orientações, que permitam assegurar a qualidade do tratamento?
  3. Caso as clínicas de hemodiálise privadas não cumpram com as recomendações e normas emanadas, incluindo a orientação referente aos doentes hemodialisados e considerando que o SNS não tem capacidade para assegurar o tratamento de todos os doentes hemodialisados do país, pondera o Governo assumir a gestão das clínicas onde e quando for necessário, para garantir a qualidade dos tratamentos prestados aos doentes e a proteção do seu bem-estar?