Nota da Comissão Nacional do Ensino Superior do PCP

É necessário pôr fim aos «turbo-professores»

É grave que o Ministério da Educação não esteja a respeitar e a fazer respeitar a legislação respeitante aos regimes de trabalho dos docentes do Ensino Superior e às condições em que podem acumular serviço. A existência de professores que se desmultiplicam ilegalmente por diferentes escolas e cursos - os conhecidos "turbo-professores" - constitui um dos factores que condiciona de forma mais negativa a qualidade do Ensino Superior. A Comissão Nacional do Ensino Superior do PCP denuncia este escândalo, e reclama a urgente reposição da legalidade e a correcção desta situação por parte do Ministério da Educação.

1. O Estatuto de Carreira Docente Universitária (ECDU), que consta do Decreto-lei n.º 488/79 ratificado pela Lei n.º 19/80, prevê e regula os regimes de tempo integral (Artº 68º) e de dedicação exclusiva (Artº 70º) dos docentes do ensino universitário público. Legislação análoga é aplicável aos docentes do ensino superior politécnico.

O ECDU e legislação posterior (Decretos-lei n.º 378/86 e n.º 145/87) estabelecem condições e limites à prestação de serviço em outras instituições de ensino superior, público ou particular e cooperativo, para docentes tanto em tempo integral como em dedicação exclusiva. Essa egislação prevê, inclusivamente, procedimento disciplinar em situações de incumprimento de normas estabelecidas, embora tal seja anterior à Lei da Autonomia Universitária que veio a consagrar a vertente disciplinar da autonomia.

Tais dispositivos legais não têm sido respeitados, verificando-se a proliferação de situações ilegais, clandestinas ou toleradas. Estas situações têm servido de suporte formal e operacional à multiplicação de estabelecimentos de ensino superior particular e cooperativo e respectivos cursos, muitos dos quais não preenchem requisitos de qualidade, cuja existência e funcionamento têm sido viabilizados por docentes do ensino superior público em regime de acumulação excessiva e ilegal de funções. E têm prejudicado seriamente também a qualidade do ensino superior público.

Este estado de coisas, instrumental na expansão desordenada da oferta de ensino superior particular e cooperativo, tem contado com a inaceitável cumplicidade do próprio Ministério da Educação. E tem contribuído para a degradação do estatuto social e remuneratório dos docentes do ensino superior e da qualidade do ensino ministrado.

2. Esta situação é tanto menos compreensível quanto o actual Governo, através do Decreto-lei n.º 15/96 de 6 de Março, reconheceu que "a dignificação da actividade docente no ensino superior, o conhecimento público da situação real dos estabelecimentos de ensino superior neste domínio, a necessidade de transparência das relações de colaboração dos docentes de uma instituição noutras instituições, motivam a publicação do presente diploma, através do qual se introduz a obrigatoriedade da publicitação anual da composição do corpo docente de todas as instituições de ensino superior".

Ora apesar das regras técnicas já terem sido fixadas, e de caber expressamente ao Ministério da Educação fazer publicar as listas nominativas elaboradas por cada instituição em Diário da República até 31 de Março de cada ano; apesar de terem sido fixadas as penalizações decorrentes do incumprimento desta legislação - "às instituições de ensino superior particular e cooperativo... não será ... autorizado o funcionamento de qualquer curso ou a alteração de qualquer plano de estudos..." e "serão suspensas ... todas as formas de apoio financeiro que lhes venham sendo concedidas". - verifica-se que no corrente ano de 1997 não foram publicadas quaisquer listagens, embora já tenha sido largamente ultrapassado o prazo legal.

Sendo que o mesmo diploma estabelece que "compete ao Departamento do Ensino Superior proceder ao controlo do cumprimento do disposto no presente diploma..:" e que "compete à Inspecção Geral da Educação... proceder... ao controlo das listas (nominativas)...", configura-se uma situação de grave ilegalidade cuja responsabilidade não pode deixar de ser assacada ao próprio Ministério da Educação.

A notícia vinda a público de que a não publicação das listas terão a ver com a falta de verbas para o Governo custear a sua edição no Diário da República, configura uma situação que em nenhumas condições pode ser aceite num Estado de direito democrático. Pode pois legitimamente presumir-se que muitas instituições não cumpriram o preceito a que a lei as obriga; ou que, tendo-o feito, numerosas serão as situações de escandalosa irregularidade que se pretende ocultar.

É esclarecedor que o próprio Inspector Geral da Educação afirme existirem "estabelecimentos de ensino superior particular e cooperativo a funcionar sem autorização, isto é, ilegalmente, e até sem conhecimento da tutela que, por vezes, só os identifica quando surge a denúncia"; e recorda que o ano passado foram detectados mais de uma dúzia de cursos não autorizados... (Semanário, 5 de Julho de 1997).

É por isso de recear que poderosos interesses, que não os interesses da generalidade dos docentes e da totalidade dos estudantes nem da qualidade do ensino superior, estejam a determinar mais a actuação no Ministério da Educação do que a legislação existente inclusive da aprovada pelo actual Governo quando ainda estavam frescas as promessas eleitorais.

3. A Comissão Nacional do Ensino Superior do PCP ao mesmo tempo que denuncia esta escandalosa situação, reclama a urgente reposição da legalidade e a correcção desta situação por parte do Ministério da Educação.

E exige, nomeadamente, a rápida publicação das listagens produzidas, a identificação das instituições em falta e dos docentes em situação de acumulação irregular, e a efectiva aplicação das medidas legalmente estabelecidas.

  • Educação e Ciência
  • Central
  • Ensino Superior
  • Estatuto de Carreira Docente Universitária