Intervenção de Paula Santos na Assembleia de República, Reunião Plenária

Não se resolve o problema da falta de professores atacando os seus direitos

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Sr. Presidente,
Sras. e Srs. Deputados,

São cerca de 60 mil estudantes que iniciam as aulas esta semana sem terem professor a todas as disciplinas. Não há nenhuma razão de regozijo, como revelou o Ministro da Educação, é antes motivo de enorme preocupação. Número que provavelmente irá aumentar quando forem entregues as baixas médicas pelos professores que não dispõem de condições de saúde para lecionar, e à medida que os pedidos de aposentações de professores sejam deferidos.

Mais uma vez inicia-se um novo ano letivo sem estarem garantidas as condições para o adequado funcionamento da Escola Pública, nem para a garantia da qualidade das aprendizagens.

Com o objetivo de combater a carência de professores na Escola Pública, o PCP agendou, hoje na Conferência de Líderes, para discussão no próximo dia 30 de setembro no plenário da Assembleia da República um projeto de lei com vista à adoção de medidas imediatas, nomeadamente a atribuição de um complemento de alojamento e de deslocação aos professores.

Sr. Presidente, 
Sras. e Srs. Deputados,

Há muito que o PCP tem vindo a alertar e a denunciar os inúmeros problemas que afetam a Escola Pública, de entre eles a falta de professores. 

Alertámos para a necessidade de avançar com medidas imediatas e com medidas estruturais para ultrapassar o problema. Medidas propostas pelo PCP, que o Governo recusa, muitas vezes com o apoio de PSD, CDS, IL e CH. 

Recusa a vinculação extraordinária dos professores com três ou mais anos de serviço que comprovadamente asseguram funções permanentes.

Recusa a contabilização de todo o tempo de serviço para efeitos de progressão da carreira docente.

Recusa em pôr fim às quotas no acesso aos 5.º e 7.º escalões da carreira docente.

A falta de professores na Escola Pública é o resultado da desvalorização da profissão e da carreira prosseguida por sucessivos Governos.

Que perspetiva garante o Governo a um jovem que pretenda ser professor? Esperar 15, 20 ou mais anos para ingressar na carreira? E depois de ingressar na carreira, esperar mais uns anos até que tenha vaga para aceder aos 5.º e 7.º escalões? Ser colocado a 200, 300 ou mais quilómetros de distância do seu local de residência ou de tratamento? Ter de suportar os encargos com duas habitações? O Governo não garante qualquer perspetiva de estabilidade, o que motivou o abandono da profissão por muitos professores e que muitos jovens façam outras opções para a sua vida.

Não se resolve o problema da falta de professores atacando os direitos dos professores como o Governo fez com as alterações introduzidas na mobilidade por doença, obrigando os professores com graves problemas de saúde a lecionar longe da área da residência ou de tratamento; com a contratação de licenciados sem habilitação profissional, o que representa um retrocesso e terá consequências na qualidade das respostas pedagógicas, nem com a manutenção de milhares de professores com vínculo precário, quando já deveriam estar na carreira.

Como também não se resolve o problema da falta de professores sem enfrentar as suas causas estruturais.  Assegurar que todos os alunos têm todos os professores exige a valorização da profissão e da carreira, a negociação com os sindicatos para assegurar condições de trabalho, o combate à precariedade e a vinculação dos professores, com efeitos a 1 de setembro, prioritariamente de quem tenha 10 ou mais anos de serviço, o rejuvenescimento da profissão, a criação de apoios à deslocação e à habitação dos professores e a criação de  mecanismos que permitam o regresso à docência de professores que tenham exercido essas funções na condição de contratados e tenham entretanto optado por outras atividades profissionais.

Também não estão asseguradas as condições para a recuperação das aprendizagens. Neste que é o ano 1, considerando que o anterior foi o ano 0 da recuperação das aprendizagens, o Governo não garante os meios necessários para melhorar as aprendizagens dos estudantes, desde logo porque faltam professores e técnicos especializados, mas também porque não se avançou na redução do número de alunos por turma.

Sr. Presidente, 
Sras. e Srs. Deputados,

Só com a intervenção determinada e persistente do PCP foi possível alcançar a gratuitidade dos manuais escolares, mesmo contra a vontade do PS, e que se revelou fundamental para avançar na igualdade entre crianças e jovens. Há que consolidar e dar novos passos, designadamente a gratuitidade dos livros de fichas de exercícios, com o objetivo de contribuir para o sucesso escolar. 

Persistem ainda muitas desigualdades que resultam das condições económico financeiras das famílias. Os custos com os livros de fichas e com o material escolar continua a ter um peso expressivo no orçamento de muitas famílias, sobretudo das famílias com mais baixos rendimentos, circunstância que se agravou neste início de ano letivo com o aumento dos preços, que também se reflete nas despesas com a educação e na perda de poder de compra das famílias. O reforço da ação social escolar, no alargamento dos critérios de acesso e nos montantes é de enorme importância para dar cumprimento ao princípio constitucional - igualdade no acesso, frequência e sucesso escolar para todas as crianças e jovens.

A Escola Pública é a solução para assegurar o direito à educação. É a educação e o conhecimento que contribuem decisivamente para a formação integral do indíviduo, elemento crucial para a emancipação individual e coletiva, para o desenvolvimento da sociedade, e que só é possível com uma outra política de investimento na Escola Pública, de qualidade, de valorização dos seus trabalhadores e da garantia da gratuitidade e da igualdade como o PCP propõe.
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