Intervenção de João Dias na Assembleia de República, Reunião Plenária

O Governo tem em curso um verdadeiro processo de encerramento e concentração de serviços

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Sr. Presidente, Srs. Deputados,

Os problemas de acesso aos cuidados de saúde não são conjunturais ou episódicos, são antes estruturais e crónicos

Problemas que se agravam todos os dias, por falta de respostas, em certa medida respostas elementares, mas fundamentais, das quais se destaca a desvalorização intencional de todos os profissionais de saúde.

Sim, a desvalorização dos profissionais de saúde é intencional por fazer parte da “espinha dorsal” da estratégia que os grupos económicos, com a conivência dos sucessivos Governos, têm de fazer do setor da saúde um negócio

Para o PCP o caminho é claro e inverso ao que tem sido seguido. Ou seja, só com um verdadeiro e considerável reforço do investimento no Serviço Nacional de Saúde, será possível acabar com o elevado número de utentes sem médico de família, com os elevados tempos de espera para consultas, cirurgias, tratamentos e exames, pôr fim à indigna desvalorização dos profissionais de saúde e aos equipamentos obsoletos e à degradação ou desadequação das instalações. Que não respondem às dificuldades sentidas no SNS.

Srs. Deputados,

Podemos mesmo afirmar com toda a segurança que se prevê para 2023 um agravamento da situação da saúde em Portugal a avaliar pelo que se conhece das medidas implementadas e anunciadas pelo Governo.

Se não vejamos, em resposta às enormes dificuldades sentidas nos serviços de urgência de obstetrícia e ginecologia e nos blocos de partos, que por todo o país encerram temporariamente por falta de recursos humanos, o Governo anunciou, recentemente, que irá proceder à reorganização das urgências de Ginecologia e Obstetrícia. Aliás, solução que quer estender a outras especialidades, tememos que a praticamente todas as especialidades uma vez que as carências são generalizadas e não apenas de uma ou outra especialidade médica.

Para além dos problemas que os serviços de urgência de especialidades enfrentam, não se pode ainda deixar de atender aos problemas que se colocam nos serviços de urgência geral, onde de uma forma geral os utentes são confrontados com tempos de espera muito superiores aos desejados. A este respeito o Governo equaciona aplicar o mesmo modelo de rotatividade das urgências de ginecologia e obstetrícia aos serviços de urgência geral, deixando antever que também aqui se prepara uma reorganização das urgências gerais o que garantidamente não irá no sentido do aumento da resposta mas sim numa redução dos serviços de urgência disponíveis.

Trata-se de soluções que além de não resolverem os problemas ainda deixa que se agravem mais, uma vez que não resolve o que está na sua origem que é a enorme carência de profissionais de saúde em particular de médicos. Por isso mesmo a principal solução passa por garantir a contratação e colocação de mais profissionais de saúde.

O que na verdade o Governo tem em curso é um verdadeiro processo de encerramento de serviços e de concentração que não serve de maneira nenhuma as necessidades da população. Pode até o Governo afirmar que são medidas temporárias, contudo o que se vai percebendo é que de facto têm por de trás um claro objetivo de as tornar definitivas. O que só beneficia os interesses dos grupos privados.

Sr. Presidente, Srs. Deputados,

O Governo anunciou, por estes dias, alguns apoios à fixação de jovens médicos internos apenas em algumas das zonas carenciadas do país – Bragança, Guarda, Covilhã, Castelo Branco, Portalegre, Santiago do Cacém e Beja, não diz, mas é por de mais evidente muito à custa das autarquias, contudo o Governo continua a passar, como “cão por vinha vindimada”, ao lado das questões de fundo que são os salários e as carreiras, aliás como se pode comprovar pelo adiamento das negociações com os sindicatos sindicais dos médicos. Foge às soluções.

Mas também não se percebe por que razão deixa de fora outras zonas fortemente carenciadas – como as regiões do Tâmega e Sousa, de Aveiro, de Lisboa e Vale do Tejo ou do Algarve. É que as dificuldades na fixação de médicos é um problema que atravessa o país e todo o SNS, de Norte a Sul e do litoral ao interior!

Outra questão que importa resolver diz respeito à aplicação das regras de descongelamento da carreira de enfermagem, onde se verificam imparidades e injustiças que urge resolver. É o caso dos enfermeiros que foram promovidos à categoria de especialista por concurso, a quem lhes foram anulados os pontos anteriores à transição para a categoria, ao passo que aos enfermeiros que transitaram automaticamente para a categoria de especialista ao abrigo do Dec. Lei nº 80-B/2022 de 28 de Novembro, vêem acauteladas a relevância das avaliações de desempenho anteriores a essa alteração de posicionamento remuneratório e ingresso na categoria de especialista sendo lhes contados todos os pontos. Importa também responde às posições virtuais igualmente resultantes das regras de descongelamento da carreira de enfermagem que estão a impedir a justa progressão na carreira.

A contagem de pontos foi reposta, no entanto a sua retroatividade é a 2018 e não a 2022 como fez o Governo.

Não é só de médicos e enfermeiros que o SNS está carenciado precisamos de mais Técnicos Superiores de Diagnóstico e terapêutica, Assistentes Operacionais, Assistentes Técnicos etc, com as respetivas carreiras valorizadas devidamente remunerados.

Srs. Deputados,

No que à saúde pública diz respeito mantêm-se as condições de grande debilidade da estrutura de saúde pública, depauperada nos seus meios, nomeadamente humanos. Durante anos, permitiu-se que a estrutura de saúde pública fosse profundamente desvalorizada, contudo a pandemia veio também comprovar a importância da estrutura de saúde pública, porém o Governo ignorou olimpicamente a comissão para a reforma da saúde pública e o relatório que a mesma entregou, o Sr. Ministro nunca reuniu com a comissão o que, naturalmente, levou à sua demissão em bloco. Não podemos aceitar que só se lembrem da saúde pública aquando de uma pandemia ou de um surto de legionela. Os problemas na área da saúde pública urgem em ser resolvidos seria importante que o Governo começasse por ouvir os profissionais de saúde pública.

Garantir um SNS de qualidade e para todos é possível, é necessário, é o que melhor serve os portugueses e é o mais barato! Por isso mesmo é preciso corresponder às necessidades dos profissionais de saúde e das populações.

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