Exposição de motivos
As condições higio-sanitárias e o seu controlo, no que respeita à produção, distribuição e comercialização de moluscos bivalves vivos, equinodermes, tunicados e gastrópodes marinhos vivos destinados ao consumo humano, visando a proteção da saúde pública, encontram-se estabelecidas em diversos diplomas no direito da União Europeia e no Direito Nacional.
Estes diplomas legais, centrando-se fundamentalmente na fixação de teores máximos admissíveis de contaminação e na aplicação de restrições à atividade produtiva baseada nos limiares fixados e demais orientações, não preveem a análise das causas e origem das contaminações que impõem a suspensão dessas atividades nem a adoção de soluções com vista a ultrapassar essas causas, nomeadamente quando estas são alheias aos produtores e à própria atividade produtiva, nem promove a resolução destas situações de forma célere e eficaz.
A este facto acresce que a legislação referida também não contempla a análise das consequências que as restrições impostas à produção, apanha e comercialização de moluscos bivalves vivos, podem implicar, quer em termos económicos, quer em termos sociais, com destaque para a perda de rendimentos dos profissionais, o encerramento de empresas e unidades de produção e o desemprego.
A este respeito, é de salientar o desinvestimento, ao longo de décadas, na proteção destes territórios, por parte de sucessivos governos, incluindo a falta de intervenção nos âmbitos do tratamento adequado de águas residuais, das dragagens e dos apoios à renovação dos viveiros.
É preciso ter em conta que este sector de actividade assegura o emprego e o rendimento a milhares de famílias, sendo a sua actividade sustentável, contribuindo para combater o défice da balança alimentar ao substituir importações.
A inexistência de um regime para apoiar a perda de rendimentos dos trabalhadores que se dedicam à produção de moluscos bivalves para consumo humano nas situações em que ocorram, por extensos períodos, alterações na qualidade do meio que impliquem a alteração da classificação das zonas de produção e a suspensão da atividade, é uma questão que requer resolução, no sentido de permitir a manutenção do emprego e a sustentabilidade futura da atividade.
Neste sentido, para além da definição de medidas e orientações que assegurem a salvaguarda da saúde pública, é necessário identificar a origem das contaminações que põe em causa a segurança alimentar, avaliar as suas repercussões em termos sócio-económicos e atuar no sentido de resolver os problemas, quer no que respeita à eliminação ou mitigação de contaminações, quer no apoio à perda de rendimento dos trabalhadores, defendendo a capacidade produtiva nacional, os trabalhadores e o emprego e combatendo o abandono da atividade e a desertificação dos territórios.
Importa também referir que os mariscadores e produtores de moluscos bivalves vivos para consumo humano constituem um dos grupos que mais interessados estão na preservação destes ecossistemas que lhes asseguram o rendimento, mas são estes que acabam por ser as primeiras vítimas da falta de investimento a que se tem vindo a assistir nesta matéria.
Com o presente Projeto de Lei, o PCP procura dar resposta à necessidade de assegurar a qualidade do meio em que as espécies de moluscos bivalves são produzidas, de atuar sobre as origens de contaminação que conduzem à fixação de restrições no âmbito da sua produção, apanha e comercialização e proteger a produção nacional, os rendimentos e o emprego dos trabalhadores do sector.
Assim, ao abrigo da alínea b) do artigo 156.º da Constituição e da alínea b) do n.º 1 do artigo 4.º do Regimento, os Deputados do Grupo Parlamentar do PCP apresentam o seguinte Projeto de Lei:
Artigo 1.º
Objeto
A presente Lei estabelece regras a aplicar no âmbito da regulação da produção e comercialização de moluscos bivalves, equinodermes, tunicados e gastrópodes marinhos vivos, complementares ao Regulamento de Execução (UE) 2019/627 da Comissão, ao Decreto-Lei n.º 113/2006, de 12 de junho e à Portaria n.º 1421/2006, de 21 de dezembro e cria um regime de apoio à perda de rendimento de mariscadores em caso de imposição de suspensão da atividade por períodos superiores a 30 dias.
Artigo 2.º
Atualização da classificação das zonas de produção de moluscos bivalves vivos
- O Instituto Português do Mar e da Atmosfera, I. P. (IPMA), a quem estão acometidas as atribuições do extinto Instituto Nacional de Investigação Agrária e das Pescas (INIAP), no domínio das pescas, aquicultura e mar, é responsável pela classificação das zonas de produção de moluscos bivalves vivos em Portugal continental.
- A classificação das zonas de produção de moluscos bivalves vivos em Portugal continental, referida no número anterior, é atualizada e publicitada, pelo menos, semestralmente.
Artigo 3.º
Zonas de produção, apanha e comercialização de moluscos bivalves para consumo humano integradas em Classe C ou Classe D
- Quando a atualização da classificação das zonas de produção de moluscos bivalves vivos referida no artigo 2.º da presente Lei resultar na definição de novas áreas incluídas nas classes C ou D, esta atualização é acompanhada de um estudo detalhado com a indicação dos elementos que estão na origem da alteração da classificação, a avaliação dos impactos económicos e sociais das novas restrições impostas às atividades de produção, apanha e comercialização de moluscos bivalves para consumo humano e das medidas a tomar para a sua mitigação.
- A classificação de zonas de produção de moluscos bivalves vivos incluídas em Classe C ou Classe D, é acompanhada do estudo de identificação das causas e origem de contaminações que justificam esta classificação e das medidas e ações a adotar para melhorar a qualidade dessas zonas, permitindo que passem a incluir-se, pelo menos, em Classe B
- Os estudos referidos nos números anteriores do presente artigo são coordenados pelo IPMA, I.P., em articulação com a Agência Portuguesa do Ambiente, o Ministério da Economia, o Ministério do Trabalho, Solidariedade e Segurança Social e com as associações representativas dos produtores e trabalhadores.
Artigo 4.º
Regime de apoio ao rendimento dos trabalhadores em caso de suspensão de atividade
- É criado um regime de apoio à perda de rendimento dos trabalhadores, no caso da imposição da suspensão da atividade de produção e apanha de moluscos bivalves para consumo humano, por períodos superiores a 30 dias, ou resultante de alterações na classificação das zonas de produção e de afinação.
- São elegíveis para efeito de apoio à perda de rendimento referido no número anterior, os produtores e trabalhadores cujas áreas de produção se integrem totalmente em áreas reclassificadas como C ou D, ou que se integrem em áreas sujeitas a interdição da atividade de produção e apanha de moluscos bivalves por período igual ou superior a 30 dias anuais.
- O apoio referido no número 1 do presente artigo é concedido pelo período em que vigore a imposição da suspensão da atividade de produção e apanha de moluscos bivalves para consumo humano, não podendo exceder os 180 dias contínuos.
- O valor do apoio a conceder é determinado em função dos rendimentos declarados dos dois anos anteriores, afetos à atividade exercida na área sujeita à imposição de restrições no âmbito da produção e apanha de moluscos bivalves para consumo humano, não podendo o valor a receber ser inferior a uma vez e meia o valor do Indexante dos Apoios Sociais em vigor.
Artigo 5.º
Formalização de candidaturas ao apoio
- As candidaturas ao apoio são formalizadas mediante preenchimento de formulário próprio disponível nos serviços descentralizados do Ministério do Mar e no portal das DRAP territorialmente competentes, indicando os elementos relacionados com a perda de rendimentos a ser objeto de apoio.
- O prazo para a apresentação das candidaturas é de até 30 dias após a ocorrência da circunstância que está na origem do pedido de apoio.
Artigo 6.º
Financiamento
O presente apoio é suportado pelo orçamento do Instituto de Financiamento da Agricultura e Pescas, I. P. (IFAP, I. P.).
Artigo 7.º
Período transitório
Compete ao Governo, no prazo de 60 dias, aprovar a regulamentação e proceder às alterações legislativas necessárias à execução da presente lei.
Artigo 8.º
Entrada em vigor e produção de efeitos
- A presente lei entra em vigor no dia seguinte à sua publicação e produz efeitos com o Orçamento do Estado subsequente, sem prejuízo do disposto no número seguinte.
- Compete ao Governo a criação de condições para que a presente lei produza efeitos em 2021, considerando a disponibilidade orçamental para o ano económico, incluindo a possibilidade de recurso a financiamento comunitário.