O Grupo Parlamentar do Partido Comunista Português tomou conhecimento do relato de uma família (Arminda Gonçalves Azevedo e Joaquim Dias Queirós, casados, com 79 e 77 anos de idade, respetivamente, e utentes da Unidade de Cuidados de Saúde Personalizados do Carvalhido - UCSPC) quedenuncia as crescentes dificuldades no acesso aos cuidados de saúde, que passamos a citar:
«Durante aproximadamente 30 anos, Arminda Azevedo e Joaquim Queirós foram acompanhados pela Dra. Amélia Moreira, médica de família que em Julho deste ano se reformou e não foi, nem será, segundo informações dadas no local, substituída. Foram ainda acompanhados por um assistente da Dra. Amélia que cremos ser estagiário que, em articulação com a médica até à sua aposentação, os acompanhou e em meados de Agosto, saiu também da UCSPC. Ficaram, ao fim de 30 anos, sem médico de família. Agora que estão velhos e com problemas de saúde acrescidos e que recorrem com maior frequência à UCSPC, perderam o apoio personalizado que tinham e do qual usufruíam na UCSPC.
A Arminda Azevedo é diabética, faz regularmente controlo dos diabetes, tem tido necessidade de rever a medicação crónica com a médica e vai regularmente ainda à consulta do pé diabético. Recentemente, a 1 de Outubro, foi operada a um joelho no Hospital da Prelada (HP), estando ainda em fase de recuperação, a fazer fisioterapia, e o papel que trouxe do seu médico ortopedista do HP, Dr. Alberto Lemos, dirigido ainda à Dra. Amélia, recomenda “fazer vigilância do estado geral pelo médico assistente”. Quando se dirigiu à UCSPC, não pode ter consulta de recurso porque estas só poderiam acontecer a partir de 14 de Outubro, sem ter sido possível perceber a razão de tal facto, nem pode deixar a referida carta dirigida à médica que ficará guardada com a Arminda até `a consulta de recurso. Ainda abordou uma outra médica que conhece arriscando perguntar se “não queria ficar consigo”, mas foi-lhe explicado pela médica que não podia tomar essa decisão. Está previsto, tanto pela sua antiga medica, como pelo ortopedista, fazer a mesma operação ao joelho direito, sob pena de deixar de andar se tal não acontecer. Até Julho deste ano, havia articulação entre a médica de família e o ortopedista e neste momento só restam incertezas quanto à forma como se processarão futuras articulações.
O Joaquim Queirós, relativamente saudável até há bem pouco tempo, embora hipertenso,começou a ter dificuldades em andar desde Março e com o apoio da médica de família, fez vários exames de diagnóstico, fisioterapia e foi encaminhado para a consulta de neurocirurgia do Hospital de Santo António que aconteceu no passado dia 8 de Outubro. Esta consulta não foi conclusiva, só lhe foi transmitido que não precisava de ser operado e agora que a fisioterapia terminou e que o problema de locomoção persiste, precisa que se continue a avaliar o seu problema para poder resolvê-lo ou, pelo menos, garantir alguma qualidade de vida no dia-a-dia.
Estão ambos sem médico de família, sujeitos a estarem com médicos diferentes e sem poder antecipar a marcação de consulta, mas só arriscar, com o tempo de espera que se sabe e sem garantia de consulta, a “vaga”.
Outros problemas de outra ordem vão surgindo com cada um deles, sobre os quais não irei pronunciar-me nesta carta, mas acreditem que só numa relação de alguma continuidade, confiança e segurança, se sentirão à vontade para falar de tudo o que é necessário para o médico os conhecer e fazer uma avaliação global e pertinente. Não é fácil serem atendidos hoje por um médico, amanhã por outro, apresentar a cada um uma parcela de si e das doenças, aquela doença que naquele dia os leva a marcar consulta e que traz acoplado informações associadas à doença e por isso, parcelares e lacunares. Não é fácil serem eles “responsáveis” por saber quando devem tentar uma consulta de recurso, afinal nenhuma consulta fica marcada:
estará na altura de voltar a fazer análises por causa dos diabetes? Estará na altura de rever a medicação? Haverá outro exame qualquer que os médicos assistentes mandem os seus pacientes com estas idades fazer?...
Sabemos que os problemas da Arminda e do Joaquim se vão agravando e atropelando uns aos outros com a idade e, paradoxalmente, estão menos amparados. Perderam o apoio (legitimamente) de quem já os conhecia mas viram-se impedidos de continuar a ter o apoio de um outro médico de família que desse continuidade ao trabalho feito até à data. Sem desprimor para cada médico da UCSPC, sem médico de família não serão acompanhados da mesma forma nem terão o olhar atento e preventivo de quem os poderia conhecer daqui para a frente.
Sabemos também que é muito fácil desistir de pequenas grandes coisas nestas idades e, em concreto, a Arminda e o Joaquim tinham por parte da Dra. Amélia um papel ativo e motivador que perdem sem a atribuição de um médico de família. Da sua rede social fazia parte também a médica de família, espaço que fica agora vazio. Acrescento que este casal não tem filhos nem outro tipo de apoio familiar.
Pelo exposto, solicito apreciação desta situação e a atribuição de médico de família a ambos, nesta UCSPC ou na Unidade de Saúde Familiar de Serpa Pinto (bastante mais perto da residência do casal), e peço resposta a esta carta.
Consciente de que este problema – perda de médico de família - não se esgota neste “caso” da Arminda Azevedo e do Joaquim Queirós, e que tem um enquadramento político bem atual - a brutal contenção de custos, de perda de direitos dos utentes e de progressivo ataque ao serviço nacional da saúde - darei conhecimento desta carta aos grupos parlamentares da Assembleia da República.»
Ao abrigo das disposições legais e regimentais aplicáveis, solicitamos ao Governo que por intermédio do Ministério da Saúde, nos sejam prestados os seguintes esclarecimentos:
1.Face ao exposto, o Governo não considera urgente a atribuição de médico de família concretamente a esta família, como garantia do acesso aos cuidados de saúde de que necessitam?
2.Quando será atribuído médico de família a estes utentes, para assegurar o pleno direito à saúde?
Pergunta ao Governo N.º 266/XII/2
Crescentes dificuldades de acesso aos cuidados de saúde na Unidade de Cuidados de Saúde Personalizados do Carvalhido
