Intervenção de Honório Novo na Assembleia de República

"Basta de enganar os portugueses e o país"

Procede à primeira alteração à Lei do Orçamento do Estado para 2013, aprovado pela Lei n.º 66-B/2012, de 31 de dezembro
(proposta de lei n.º 151/XII/2.ª)
Sr.ª Presidente,
Sr. Ministro de Estado e das Finanças,
Sobre o Documento de Estratégia Orçamental (DEO), passo a citar-lhe algumas observações do parecer do Conselho Económico e Social (CES).
Primeira citação: «Na sua introdução, o DEO introduz um diagnóstico sem uma contextualização adequada e com juízos de valor que poderão ser considerados ofensivos da dignidade dos portugueses». E conclui o CES: «O DEO não apresenta qualquer estratégia de compatibilização da política orçamental com a política económica. O DEO ignora que a questão fundamental é o crescimento económico e uma correta distribuição da riqueza».
Sr. Ministro, até o Conselho das Finanças Públicas e a Dr.ª Teodora Cardoso, sempre tão carinhosos com o Governo que lhes paga milhões por ano, abandonam de vez a sua companhia e afirmam: «Não ser possível perceber a lógica das suas projeções nem quais os seus possíveis resultados».
Sr. Ministro de Estado e das Finanças, diga-me uma coisa: está tudo maluco à sua volta e o senhor é o único iluminado, porventura, por uma luz do além ou do gabinete do Ministro das Finanças alemão, ou qual é a explicação que o senhor dá para isso?
Quanto ao Orçamento retificativo, tenho duas questões a colocar, Sr. Ministro.
Primeira questão: que manigâncias quer fazer o Governo quando passa o deflator do PIB de 1,3% para 1,8%?
Será que, desta forma, o Governo quer fazer com que a queda nominal do PIB possa ser de apenas 0,5%?
O objetivo do Governo não será conseguir diminuir os valores do défice e da dívida em percentagem de um valor do PIB nominal, artificialmente aumentado com esta manigância?
Segunda questão, Sr. Ministro: que comentários lhe merece (e ao Governo) o facto de, nos últimos dias, a OCDE e o INE terem destruído literalmente todas as projeções macroeconómicas do Documento de Estratégia Orçamental e do Orçamento retificativo?
Como reage à previsão de uma recessão de 2,7%, a previsões de défice superiores a 6% e a previsões da dívida superiores a 126% do PIB, em 2013?
Sr. Ministro, como comenta o facto de o PIB já ter recuado 4%, no 1.º trimestre? E não são previsões, Sr. Ministro, são dados!
Como reage ao facto de as exportações estarem estagnadas há seis meses? São dados, não são previsões! E como pensa que alguém dê credibilidade a um Governo que projeta uma diminuição do investimento em 7,6% quando — e este é mais um dado, Sr. Ministro —, no 1.º trimestre, ele já afundou 17%?
Basta, Sr. Ministro.
Basta de enganar os portugueses e o País! Ao menos, exige-se a si e ao seu Governo um pingo de seriedade!
(…)
Sr.ª Presidente,
Srs. Ministros,
Srs. Deputados:
Dias depois de o Ministro da Economia, Álvaro Pereira, ter apresentado a sua estratégia para o crescimento económico e o fomento industrial do País, o Sr. Ministro das Finanças deste mesmo Governo veio dar o dito por não dito e entregou no Parlamento e aos seus tutores de Bruxelas um documento de estratégia orçamental que arrasa qualquer estratégia de crescimento do País e que amarra Portugal a uma estratégia orçamental que dá continuidade e que reforça a austeridade obsessiva da troica e do seu Memorando de Entendimento.
Tal como o PSD dizia em março de 2011, e passo a citar: «O Governo não só foi responsável pela situação de grave crise económica e social que se criou no País, como falhou os objectivos de consolidação orçamental…» …
«… Circunstância a que acresce uma incapacidade clara do executivo (…) em promover as bases de um crescimento económico sustentado.
A essa realidade junta-se ainda a incapacidade em suster o aumento galopante do desemprego e do endividamento do país» — fim de citação do texto do PSD.
Parafraseando agora o CDS, dizia este partido, também em março de 2011: «(…) o cenário macro-económico assumido pelo Governo era visivelmente desajustado. (…) as medidas do Governo não alcançaram o efeito previsto. (…) tiveram efeitos recessivos da economia e não trouxeram (…) confiança aos mercados.
Os juros da dívida continuaram a sua escalada, insensíveis a quaisquer medidas apresentadas e impulsionados pela muito deficiente execução orçamental (…)» — fim de citação do texto do CDS.
Depois da citação integral destas claríssimas afirmações dos partidos da maioria, que fazer hoje com o Documento de Estratégia Orçamental que o Governo remeteu a Bruxelas e que não só dá inteira e plena justificação à justeza de todas aquelas acusações do PSD e do CDS, como afinal as agrava de forma absolutamente insuportável? A resposta, Srs. Deputados, não pode deixar de ser a da recusa e rejeição de um documento tão perverso e de consequências tão graves para o País.
É por isso que apresentamos, hoje, a debate um projeto de resolução que rejeita o DEO 2013-2017, que o Governo apresentou à Assembleia da República e que não deverá, supomos nós, deixar de ser também aprovado pelo PSD e pelo CDS, atendendo a todas as razões e muitas outras que atrás foram transcritas de textos destes partidos, de março de 2011.
Sr.ª Presidente, Srs. Deputados: O Governo apresenta, hoje, um Orçamento do Estado retificativo — o primeiro Orçamento retificativo do ano em curso.
Como estava previsto desde que, em novembro passado, aprovaram o Orçamento do Estado para 2013, o descalabro da execução orçamental determinou a sua revisão. E tudo isto sucede por causa da chuva, que afinal justifica a queda do investimento no 1.º trimestre deste ano, conforme acabámos de ver explicado pelo Sr. Ministro de Estado e das Finanças! A situação do País, afinal, tem uma explicação: é do mau tempo! É da chuva!
É das condições meteorológicas do País!
Sr.ª Presidente,
Srs. Deputados,
O aumento brutal da carga fiscal teve os efeitos esperados que só a irracionalidade de um Governo e a incompetência lunática de alguns dos seus membros não admitia. Por isso a revisão em baixa de 1600 milhões na receita fiscal feita no retificativo e, neste aspeto, julgamos mesmo que a procissão pode ainda não ter saído do adro da igreja, Sr. Deputado Miguel Frasquilho!…
Outro tanto sucedeu nas receitas contributivas a afundarem-se no oceano das falências e com os encargos com o desemprego a dispararem 270 milhões de euros por conta da catástrofe social provocada por este Governo e pelas políticas da troica.
Mas, se este retificativo seria sempre fruto de um novo falhanço orçamental do Governo — já se sabe, por causa da chuva!… — e consequência inevitável da receita recessiva e liquidacionista dos direitos que a troica e o seu Memorando impuseram ao País, a verdade é que este Orçamento retificativo é também um ajuste de contas do Governo com o Tribunal Constitucional.
O Tribunal Constitucional confirmou e tornou claro, perante o País e os portugueses, tudo o que o PCP e tantos outros há muito afirmavam: este Governo vive de forma repetida e insistente à margem da Constituição e da lei.
O respeito pelas decisões do Tribunal deveria ter imposto ao Governo — se de um Governo verdadeiro e patriótico se tratasse — a negociação imediata do programa orçamental, impondo o alargamento do défice no exato valor e medida das medidas inconstitucionais que o Governo quis ilegalmente impor ao País.
Sr.ª Presidente,
Srs. Deputados:
O Orçamento retificativo não é apenas fruto da derrapagem orçamental, isto é, não é apenas fruto da chuva e do mau tempo!, nem do ajuste de contas com o Tribunal Constitucional. Este retificativo é também a antecâmara orçamental para o despedimento de milhares de funcionários públicos.
Ao cativar as despesas com os salários da função pública, o Governo está a dizer que não vai dar dinheiro para pagar aos atuais funcionários até ao final do ano e está a fazer chantagem sobre as direções e sobre os serviços para que indiquem as vítimas para serem remetidas para o desemprego e mobilidade.
Este retificativo também serve para todos nós, contribuintes, pagarmos, já em 2013, cerca de 400 milhões de euros dos prejuízos decorrentes dos contratos swaps.
Como se vê, há dinheiro, há sempre dinheiro para pagar os prejuízos da banca.
Sr.ª Presidente, vou concluir dizendo que o Orçamento retificativo mantem o rumo do País na rota do Memorando, reforça os cortes e a austeridade, promove despedimentos, degrada e encerra serviços públicos, reforça o ataque ao direitos dos trabalhadores e do povo e insiste na destruição do setor empresarial do Estado.
Sr.ª Presidente, termino dizendo que o PCP não se limitará a votar contra, prosseguirá a sua luta na denúncia das suas consequências, na luta contra as medidas, até que seja criada uma verdadeira alternativa que rompa com o Memorando e imponha uma política patriótica ao serviço do povo e dos trabalhadores.

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