Intervenção de Jerónimo de Sousa, Secretário-Geral, XI Assembleia da Organização Regional de Viana do Castelo

O aumento dos preços exige combate à especulação e produção nacional que garanta o abastecimento

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Quero começar por sublinhar a importância da realização da Assembleia da Organização Regional de Viana do Castelo e todas as intervenções que aqui tivemos oportunidade de ouvir. Ela demonstra mais uma vez que temos um Partido vivo e actuante, que procura analisar a situação em que intervimos e definir as condições para reforçar a nossa organização e a nossa intervenção.

Um Partido ligado aos trabalhadores e ao povo português, traço fundamental da sua identidade e da sua história de mais de 100 anos.

Um Partido que conta com o contributo e o empenho de cada camarada, construindo com todos uma orientação colectiva capaz de nos dar os instrumentos para as duras batalhas políticas que enfrentamos.

Um Partido que conhece profundamente a realidade social, económica e cultural do nosso País e também aqui do distrito de Viana do Castelo. E que tem as propostas e as soluções para ultrapassar os graves problemas estruturais que o nosso País enfrenta, em consequência de décadas de política de direita.

Estamos num novo enquadramento político, marcado pela obtenção da maioria absoluta do PS, em que se confirma o que dissemos nos últimos seis anos: o PS nunca abandonou as suas opções fundamentais, os seus compromissos com o grande capital e o poder económico dominante. E se nos últimos anos foram alcançados avanços, importantes para a vida dos trabalhadores, dos reformados e pensionistas, foi pela luta dos trabalhadores e porque o PCP os colocou como imprescindíveis e o Governo PS teve de os aceitar. Por isso o PS queria tanto fugir da influência, intervenção e proposta do PCP para voltar em pleno ao que sempre foi.

Se dúvidas houvesse, bastaria ouvir o indisfarçável contentamento dos representantes do capital, dos dirigentes das confederações dos grandes patrões, dos banqueiros e da chusma de comentadores com eles alinhados, para perceber a quem serve esta maioria absoluta. Aí estão já com as suas exigências, a sua cartilha da exploração, apontando para mais desregulação da legislação laboral, para a travagem na valorização dos salários, para a redução dos impostos sobre os lucros, para mais privatizações dos serviços públicos e preparando-se para embolsar tranches cada vez maiores de recursos públicos, do Orçamento do Estado ou dos milhões do PRR e outros mecanismos da União Europeia.

Esta semana ficámos a conhecer o novo Governo do PS de António Costa. O que é importante e mais do que saber da composição do Governo, é aferir do seu programa e da sua política. Mais que conhecer este ou aquele ministro é saber se o PS, como tudo indica, continua a resistir a dar resposta aos problemas dos salários e dos direitos dos trabalhadores, da legislação laboral, do SNS, das creches, do custo de vida, da defesa da produção nacional e dos muitos outros problemas adiados.

É particularmente grave a situação que se vive com a guerra na Ucrânia, uma guerra que nunca devia ter começado e que urge terminar. Uma guerra que se iniciou em 2014 e que coloca na primeira linha a luta pela paz, a exigência de um cessar-fogo e de uma solução política para o conflito, garantam a segurança colectiva dos povos e rejeitem a escalada belicista e a corrida aos armamentos tão perigosa como negativa para a Europa e o mundo.

Não é nesse caminho que vão as conclusões das recentes Cimeiras da NATO e da União Europeia que, tendo sido há muito delineadas, continuam a acentuar a linha militarista, armamentista e de confrontação, em lugar de se orientarem para a solução do conflito, para um caminho de paz e cooperação na Europa. Não se promove a paz com mais propaganda de guerra, com mais confrontação, com mais ameaças, com mais sanções. Não serve os povos da Europa o afastamento de uma solução negociada, percorrendo o caminho do diálogo, do desanuviamento e do desarmamento.

É uma guerra, como todas as guerras, com consequências humanas, económicas, sociais. Mas como nunca antes sucedera vemo-la aproveitada para uma cruzada de condicionamento da livre expressão, de criminalização de opiniões distintas das que os centros de dominação imperialista determinam, de imposição do pensamento único e ataque a todos os que procuram contextualizar de forma mais ampla a sua análise da situação existente. Trata-se de uma realidade que exige a todos os democratas uma particular atenção e a defesa da liberdade.

Mas é preciso dizer que, a propósito da guerra e de todas as suas envolventes, enquanto os povos sofrem as suas consequências, sejam as que resultam directamente do conflito, sejam as que derivam particularmente das sanções que foram impostas, estão em curso movimentos, designadamente especulativos, com vista a maximizar os lucros dos grandes grupos económicos e das multinacionais, à custa do ataque aos direitos e do agravamento das condições de vida dos trabalhadores e das populações e da situação das MPME.

O sector da energia e dos combustíveis é disso exemplo. A imposição de inaceitáveis aumentos, sem qualquer correspondência com o efectivo custo das matérias-primas agora a serem consumidas, num sistema em que as próprias petrolíferas controlam a definição dos preços de referência e determinam como lhes convém as suas margens de lucro, é um esbulho descarado a que o Governo assiste sem grande sobressalto.

É verdade que há decisões a tomar em matéria fiscal. É preciso acabar com o adicional do Imposto sobre os Produtos Petrolíferos e com a dupla tributação do IVA. Mas não basta. É que se não forem tomadas medidas para controlar a formação dos preços, corremos o sério risco de o que se deixa de cobrar em impostos reverter, não para as populações e o tecido económico, mas sim para aumentar os lucros das petrolíferas.

O mesmo em relação aos produtos alimentares, também eles alvo de especulação e do abandono da produção nacional, situação que exige combate à especulação e produção nacional que garanta o abastecimento.

O mesmo se diga em relação a outros bens e serviços essenciais, como a electricidade ou o gás, em que a par da indispensável redução do IVA para 6%, deve ser estabelecida uma tabela de preços máximos, que garanta a contenção da especulação, tal como aliás deve acontecer nos combustíveis. O Governo foge a encarar este problema; está à espera de autorização de Bruxelas para baixar o IVA destes bens essenciais, em vez de tomar a decisão de forma autónoma e soberana; e nada faz para garantir que a perda de receita do Estado não se transforme em mais um maná para as grandes empresas deste sector.

Muitos portugueses lembrar-se-ão de toda a propaganda que ouviram quando se tratou de privatizar as empresas públicas do sector – a EDP, a GALP, a REN – ou de liberalizar estes mercados. Era toda a falsa teoria de que a concorrência garantiria preços justos, de que com os privados as empresas seriam mais eficientes, com benefícios para todos. A realidade aí está para desmentir a propaganda. A livre concorrência só aparece como essencial quando serve para afastar o Estado e já pouco importa quando se trata de garantir lucros e distribuir dividendos através de práticas cartelizadas e contrárias ao interesse nacional, da economia e das populações.

Por isso reafirmamos a exigência da intervenção do Estado na definição das regras fundamentais destes sectores. Por isso reafirmamos que só com o controlo do Estado nestes sectores estratégicos é possível pô-los ao serviço do interesse comum, do desenvolvimento e da justiça social e que essa questão é central para uma política que ponha fim aos problemas estruturais que o nosso País continua a enfrentar.

O grande capital esfrega as mãos de contente com as oportunidades que vê para alavancar os seus interesses, mesmo numa situação tão grave, dramática e perigosa como é a da guerra e das suas consequências. Ei-los a pensar já no manancial de exploração de trabalhadores que isso lhes pode proporcionar. Houve até quem, com despudor, se regozijasse com a esperada disponibilidade dos trabalhadores refugiados e imigrantes para trabalhar muitas horas sem as receberem e sem qualquer contestação. Assim se espezinhariam os direitos dos que chegam e ao mesmo tempo dos que já cá estão.

Mas desenganem-se os que pensam que o Governo de maioria absoluta e a pressão da comunicação social a propósito da guerra chegam para calar os trabalhadores. Eles aí estão em dezenas de empresas e sectores, defendendo direitos e lutando por avanços e melhorias. Eles aí estão, os jovens trabalhadores, que não se resignam perante a suposta normalidade do trabalho precário, do baixo salário ou da desregulação e aumento dos horários e que vão participar na manifestação dos jovens trabalhadores, promovida pela Interjovem no próximo dia 31 de Março em Lisboa, lutando por uma vida digna.

Uma luta que estará presente por todo o mês de Abril e que terá encontro marcado com as comemorações da Revolução dos Cravos, reafirmando aquilo que o 25 de Abril e a Constituição de 1976 consagraram: que os direitos dos trabalhadores são direitos fundamentais e sem o seu respeito não haverá sociedade justa e desenvolvida. Abril será mês de luta e de esperança, abrindo a porta a Maio, em que as comemorações do Dia do Trabalhador, organizadas pela CGTP-IN, assumem grande centralidade e importância no presente quadro político nacional e internacional.

Os trabalhadores saberão dar a resposta ao ataque aos seus direitos, à degradação das condições de vida, ao aumento das desigualdades. E podem contar com o PCP!

A situação do País continua a exigir uma política alternativa que enfrente e resolva os problemas estruturais do nosso tecido económico e social. Se a pandemia já o tinha demonstrado, as consequências da situação de guerra e das sanções confirmam-no: o País precisa de produzir mais, de se reindustrializar a assim reduzir a sua dependência externa e de promover a soberania alimentar. Para isso precisa de se libertar das amarras dos critérios do Euro, valorizar salários, reformas e pensões, e investir fortemente nos serviços públicos, seja na saúde ou na educação, nas creches ou nos transportes.

O País não pode estar subjugado aos interesses dos grupos económicos que engordam os seus accionistas à custa do sacrifício das populações e da economia nacional. As principais cotadas na Bolsa de Lisboa preparam-se para bater o recorde dos dividendos distribuídos aos seus accionistas em 2022, sendo que já em 2021 foram de cerca de 2 mil milhões de euros. Em várias dessas empresas, como é o caso da GALP, os dividendos superaram até os lucros obtidos. São lucros obtidos à custa do domínio de sectores estratégicos e da espoliação das populações e dos micro e pequenos empresários, em particular no sector energético, na banca, nas telecomunicações ou na grande distribuição. Algumas delas, como a SONAE, dão-se ao luxo de receber dezenas de milhar de euros do Governo para compensar o aumento do Salário Mínimo, ao mesmo tempo que registam lucros de cerca de 270 milhões de euros em 2021. É um escândalo!

É cada vez mais clara a necessidade do controlo público de sectores estratégicos. É que estes sectores – como a banca, a energia, os transportes ou as comunicações - condicionam fortemente todo o desenvolvimento da actividade económica, para além de infernizarem a vida das populações. A sua orientação para o desenvolvimento do País, para o interesse colectivo, não se compadece com a actual sujeição à lógica da obtenção do lucro e aos interesses dos accionistas.

Na pequena e média agricultura, sujeita a um aumento brutal dos custos de produção e à escassez do apoio do Estado, que apesar disso não falta ao grande agro-negócio, as dificuldades acentuam-se e as margens reduzem-se a níveis que põem em risco a sobrevivência das explorações.

Veja-se o caso da produção do vinho verde na região em que estamos, em que a acrescentar à falta de apoios e ausência de controlo da especulação dos preços dos factores de produção, se vêem agora fechar mercados de exportação, por via das conhecidas sanções, que afinal também têm efeitos por cá. É indispensável que o Governo intervenha para criar condições para o escoamento dos produtos, sob pena de ruína de várias explorações.

Uma política alternativa que não dispensa, antes exige, uma valorização dos salários – do salário mínimo e do salário médio – bem como das pensões e reformas. Trata-se de, não só promover uma mais justa redistribuição da riqueza produzida, como de incentivar o consumo interno, essencial para o desenvolvimento económico e particularmente para as pequenas e médias empresas. Que não abdica de uma legislação laboral que garanta os direitos na contratação colectiva, que combata a precariedade, a desregulação dos horários e todas as formas de desregulação das relações laborais.

Uma política alternativa que exige o fortalecimento dos serviços públicos, da saúde, da educação, da Segurança Social, garantindo o acesso a toda a população em condições de igualdade. Que rejeite a cavalgada em curso para os grupos económicos abocanharem mais pedaços do sector público, particularmente evidente neste momento na área da saúde, com uma cada vez maior transferência de recursos para os grupos privados, ao mesmo tempo que se subfinancia o Serviço Nacional de Saúde e se degradam as condições para os seus profissionais.

Uma política alternativa que assegure a resolução do problema da habitação em Portugal, regulando efectivamente o arrendamento, aumentando a habitação de propriedade pública em condições acessíveis à generalidade das famílias e garantindo a jovens e menos jovens condições para uma vida autónoma numa habitação digna e adequada.

Uma política que garanta um forte investimento público na construção e modernização de infra-estruturas, como é o caso dos transportes, que não pode ficar dependente das prioridades da União Europeia e dos seus regulamentos, mas que tem de ter no Orçamento do Estado uma fonte fundamental e recursos.

Uma política fiscal que assegure a tributação efectiva do grande capital e do património mobiliário, desagravando os impostos sobre as micro e pequenas empresas e os impostos indirectos, particularmente injustos para a generalidade da população.

Uma política ambiental que rejeite as perniciosas soluções do comércio de quotas de poluição ou a chamada fiscalidade verde com impacto desigual em face dos rendimentos da generalidade da população e promova uma política que conjugue a mitigação e a adaptação às alterações climáticas com objectivos de desenvolvimento e justiça social, sem os quais aquela não será possível. Que preserve a gestão pública da água e dos recursos naturais, promova a produção local e invista nos transportes públicos, para além de aproveitar os recursos do País e promover a eficiência energética.

Vivemos tempos em que procuram convencer o povo de que não há alternativa à política de direita, à exploração, tal como aliás ao militarismo e à guerra. Mas a vida prova todos os dias que não só essa alternativa existe, como ela é indispensável para o progresso do País e a melhoria da vida dos portugueses.

Para lutar por essa alternativa o povo português conta com o PCP. Este Partido que nunca virou a cara à luta, nem desistiu de construir um futuro melhor.

Um Partido que terá tanto mais força quanto mais reforçarmos a sua organização, com mais recrutamentos, com a integração dos novos militantes, com a atribuição de tarefas a mais camaradas. Um Partido que tem de continuar a reforçar a sua acção nas empresas e nos locais de trabalho, aí onde se trava o combate mais determinante e que ao mesmo tempo tem de estar com as populações, lutando por melhores serviços de saúde, por melhores acessibilidades, por mais habitação.

Um Partido que é insubstituível na luta dos pequenos agricultores, dos micro e pequenos empresários, que em nenhum outro encontram as propostas políticas que defendam os seus interesses.

Um Partido que dá ao direito à cultura – à criação, à fruição, ao acesso – um papel central na sociedade que queremos construir.

Este Partido, o Partido Comunista Português, este grande colectivo partidário que é a força motora da luta, dos avanços e das conquistas. Sempre assim foi e assim continuará a ser.

  • Economia e Aparelho Produtivo
  • 11.ª Assembleia da Organização Regional de Viana do Castelo