Exposição de motivos
A falta de professores e educadores na Escola Pública tem vindo a ser sinalizada e vivida de uma forma particularmente preocupante em determinados grupos de recrutamento de docentes.
O PCP tem dado voz a esta justa preocupação em múltiplas ocasiões, tendo apresentado soluções concretas, como o Projeto de Lei 631/XIV/2, rejeitado em Plenário da Assembleia da República por PS, PSD e CDS-PP em 20 de janeiro de 2021.
É certo e sabido que, face aos custos de vida, à permanente instabilidade e aos baixos salários, muitos destes trabalhadores acabam por não aceitar a colocação em horários incompletos de escolas que ficam longe das suas residências. Apesar disso, o Governo PS, na senda de governos anteriores, nada tem feito para resolver efetivamente esta situação.
Aliás, considerando o número de horários em concurso de contratação de escola no dia 21 de setembro, dos 1855 publicitados, 1694 correspondem a grupos de recrutamento. Destes, 1517 são constituídos por 8 ou mais horas e deveriam ter sido preenchidos através da Reserva de Recrutamento. Isto não aconteceu por falta de candidatos ou não aceitação, em muitos casos devido ao baixo número de horas.
A contratação de escola dificilmente será a solução para este problema se não existem professores no sistema ou se os poucos disponíveis não aceitarem horários a que correspondem salários inferiores às despesas de deslocação e fixação fora da área de residência familiar.
Refira-se que o número total de horas a concurso (só dos grupos de recrutamento), à mesma data, era de 24 456 e o número médio de horas dos horários correspondentes a grupos de recrutamento era de 14,4 horas.
A FENPROF, a partir destes dados, estima que mais de 100 000 alunos ainda não tenham os professores todos. Os grupos que previsivelmente terão mais problemas em matéria de falta de professores, considerada a dimensão relativa das necessidades de cada um, serão os seguintes: 550 (Informática), 420 (Geografia), 410 (Filosofia), 510 (Física e Química), 520 (Biologia e Geologia) e 400 (História). À semelhança dos últimos anos, as regiões de Lisboa e Algarve são as mais afetadas pela escassez de docentes.
No entanto, o Ministro da Educação tem vindo a público afirmar que há mais professores. Este retrato idílico pouco tem a ver com a realidade, pois tudo aponta para que as escolas estejam a receber os alunos, no início do ano letivo 2021/22, com menos professores que no início do ano anterior.
É de notar que, apesar do número de vinculações ter crescido mais do que o número de aposentações, tal não se traduz em aumento do número de docentes no sistema: os que vinculavam já nele se encontravam, embora em regime de contratação a termo. Além disso, pesam ainda duas questões: em primeiro lugar, mesmo havendo um aumento no número de docentes dos quadros, com o envelhecimento aumenta também o número dos que já estavam e continuam nos quadros, mas estarão em situação de doença; em segundo lugar, o número de aposentações tem vindo a crescer, com ritmo acelerado a partir de 2019. A previsão é que o número aumente de ano para ano e que, até final da década, saiam mais de metade dos atuais professores.
A carência de professores e educadores é um problema para o qual contribuem múltiplos fatores, relacionados, designadamente, com formação inicial, acesso à profissão e valorização da carreira, num quadro de necessidade de criação de condições de atratividade para a profissão docente. O rejuvenescimento da profissão docente é urgente e necessário, bem como a existência de medidas que possam suprimir carências que serão geradas pela aposentação de milhares de professores e educadores a breve trecho.
O PCP reafirma que há questões de fundo que apenas serão superadas por via da valorização da profissão docente e da alteração do Regime de Seleção e Recrutamento do Pessoal Docente da Educação Pré-Escolar e Ensinos Básico e Secundário.
No entanto, podem e devem ser tomadas medidas concretas, no imediato – como a possibilidade de completar os horários incompletos ou a criação de incentivos para a deslocação e fixação de docentes em áreas carenciadas.
Nestes termos, ao abrigo da alínea b) do artigo 156.º da Constituição e da alínea b) do n.º 1 do artigo 4.º do Regimento, os Deputados da Grupo Parlamentar do PCP apresentam o seguinte Projeto de Lei:
Artigo 1.º
Objeto
A presente lei aprova um conjunto de medidas de combate à carência de professores, educadores e técnicos especializados nos estabelecimentos públicos de educação e ensino.
Artigo 2.º
Âmbito subjetivo
A presente lei aplica-se a todos os professores, educadores e técnicos especializados, com contrato a termo resolutivo, nos termos previstos no Decreto-Lei n.º 132/2012, de 27 de julho, na sua redação atual, que aprovou o novo regime de recrutamento e mobilidade pessoal docente do ensino básico e secundário e de formadores e técnicos especializados.
Artigo 3.º
Reforço do crédito horário
É autorizado o reforço do crédito horário, de acordo com as necessidades sinalizadas pelas escolas, de acordo com as suas reais necessidades, com vista entre outros, ao apoio educativo, à coadjuvação de aulas, a tutorias e a atividade a desenvolver no âmbito do EMAEI, a considerar na componente letiva.
Artigo 4.º
Preenchimento dos horários incompletos
As escolas podem, sem necessidade de autorização superior, completar todos os horários incompletos que não foram preenchidos, com a atribuição de atividade letiva, designadamente a prevista no artigo anterior.
Artigo 5.º
Fusão das horas decorrentes da aplicação do n.º 2 do artigo 79.º do
Estatuto da Carreira Docente
- As escolas podem, sem necessidade de autorização superior, fundir num só horário, até ao limite das 25 horas semanais, os horários de 5 horas decorrentes da aplicação do n.º 2 do artigo 79.º do Estatuto da Carreira Docente.
- O previsto no presente artigo aplica-se aos horários correspondes à educação pré-escolar e ao 1.º ciclo do ensino básico.
Artigo 6.º
Limites mínimos para a vigência dos horários temporários
Os horários temporários passam a ser celebrados com uma vigência mínima de 3 meses ou 90 dias, sem necessidade de autorização superior para o efeito.
Artigo 7.º
Complemento de alojamento
A todos os docentes contratados e técnicos especializados cuja escola de provimento esteja localizada a uma distância igual ou superior a 50 km da residência habitual é atribuído um complemento mensal de alojamento, correspondente a 50% do encargo efetivamente pago pelo alojamento e comprovado por recibo ou, em alternativa, o disposto no artigo seguinte.
Artigo 8.º
Complemento de deslocação
A todos os docentes contratados e técnicos especializados cuja escola de provimento esteja localizada a uma distância igual ou superior a 50 km da residência habitual é atribuído um complemento de deslocação, efetuado com recurso ao reembolso, de acordo com o previsto na Portaria n.º 1553-D/2008, de 31 de dezembro:
- Do valor das passagens, no caso da utilização de transportes coletivos, ou
- Do valor do número de quilómetros percorridos, no caso da utilização de viatura própria.
Artigo 9.º
Entrada em vigor e produção de efeitos
- A presente lei entra em vigor no dia seguinte à sua publicação e produz efeitos com o Orçamento do Estado subsequente, sem prejuízo do disposto no número seguinte.
- Compete ao Governo a criação de condições para que a presente lei produza efeitos em 2021, considerando a disponibilidade orçamental para o ano económico, incluindo a possibilidade de recurso a financiamento comunitário.