Apreciação Parlamentar

Apreciação Parlamentar n.º 89/X - Mobilidade especial dos docentes declarados incapazes para o exercício da actividade docente

 

Do Decreto-Lei n.º 124/2008, de 15 de Julho: Segunda alteração ao Decreto-Lei n.º 224/2006, de 13 de Novembro, estabelecendo as condições de colocação em situação de mobilidade especial dos docentes declarados incapazes para o exercício da actividade docente e um regime excepcional de acesso à colocação em estabelecimento de educação ou ensino, bem como a possibilidade de colocação em situação de mobilidade especial para os docentes com ausência de componente lectiva

(publicado em Diário da República, I Série, n.º 135, de 15 de Julho de 2008)

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A publicação do Decreto-Lei n.º 124/2008, de 15 de Julho vem estabelecer o regime de passagem à situação de mobilidade especial, entre outras soluções, para os docentes declarados incapazes para o desempenho da função docente. Assim, desrespeitando compromissos assumidos, o Governo demonstra uma vez mais a sua face desumana no que toca à gestão de recursos humanos.

O desrespeito pela função docente conheceu, de facto, com este Governo, momentos de exacerbação absolutamente inconcebível, aos quais não tardou uma resposta expressiva e poderosa dos professores de todo o país, através de intensas demonstrações de protesto, de lutas e manifestações de grande significado. No entanto, o Ministério da Educação não desarma, tal como o restante aparelho do Governo, a ofensiva contra os trabalhadores. Neste caso, contra os professores e educadores.

Depois de ter afirmado por mais de uma vez, mesmo nesta Assembleia, que não seria colocado nenhum professor em situação de mobilidade especial, o Ministério da Educação, faz publicar agora o diploma que coloca nessa situação professores declarados incapazes para a função docente, sob pena de serem submetidos a processos de reconversão e reclassificação profissional, que são um verdadeiro salto no escuro, ou a serem remetidos para uma situação de licença sem vencimento.

Ao invés de criar condições para uma avaliação caso a caso das situações, permitindo a continuação, nas escolas, dos docentes com capacidade para o desempenho de funções docentes, ainda que não lectivas, o Governo coloca-os perante uma situação em que a sua passagem para a mobilidade especial, mesmo que com carácter voluntário, não o é de facto, pois ao docente não sobram alternativas que permitam antever um futuro com estabilidade. É, assim, criada uma bolsa de supranumerários para os docentes de que se quer livrar, aliviando as suas responsabilidades para com eles, desprezando a componente humana e ignorando a devoção e o contributo que estes docentes trouxeram ao Sistema Educativo, às Escolas, durante grande parte das suas vidas. Ignorará o Governo que muitos docentes declarados incapazes para a função docente são pessoas que entregaram também parte da sua saúde ao Sistema Educativo e à actividade de ensinar? Ignorará que muitos destes docentes apresentam problemas de saúde, muitas vezes grave, e que, por isso mesmo, não podem em muitos casos ser colocados em qualquer parte do país, longe dos seus locais de residência.

Ao contrário do afirmado pelo Secretário de Estado Adjunto e da Educação, a Mobilidade Especial não será a solução de fim de linha, mas sim a primeira das hipóteses colocadas a estes docentes, sendo que as seguintes o não o são de facto, excepto se, requerendo a aposentação esta lhe for concedida pela CGA. Na verdade, estabelece este Decreto-Lei (Decreto-Lei nº 124/2008, de 15 de Julho) que devem esses docentes requerer a passagem à situação de mobilidade especial e que, caso o não façam, será despoletado um processo de reconversão profissional e de reclassificação de carreira.

De acordo com esta orientação do Governo, a aposentação acontece apenas após a reconversão e reclassificação, o que significa que um professor incapacitado que não requeira a passagem à mobilidade especial é encaminhado para um processo de reconversão profissional em relação ao qual desconhece a sua utilidade, pois não lhe é garantida qualquer nova colocação em serviço que escolha e seja compatível com a sua nova situação profissional, pois basta que este declare indisponibilidade para o receber.

Estabelece o n.º 4 do artigo 64º do Estatuto da Carreira dos Educadores de Infância e dos Professores do Ensino Básico e Secundário (ECD) que o regime e as regras de mobilidade especial aplicada aos docentes dos quadros sem componente lectiva atribuída serão as definidas em diploma próprio. Ora esse diploma não existe e, no entanto, já o Governo anuncia as condições de passagem à situação de mobilidade especial para diversos professores, onde incluem, igualmente, aqueles que não tenham componente lectiva distribuída. É certo que as situações previstas são de carácter voluntário, mas o ECD não faz qualquer distinção quanto ao carácter da transferência.

O suposto regime de "voluntariado" em que este diploma coloca a passagem à mobilidade especial é um engodo na medida em que, na verdade, muitos professores não terão de facto outra hipótese senão requerer tal passagem. É certo que a negação da aposentação pela Caixa Geral de Aposentações pode reencaminhar o professor para funções não docentes nas escolas, mas nem isso se compreende, caso sejam docentes capazes de desempenhar funções docentes, ainda que não lectivas.

O Decreto-Lei nº 124/2008, de 15 de Julho constitui mais uma expressão da forma burocrática e economicista como o Governo entende os recursos humanos que deve gerir. A componente humana e mesmo aspectos elementares do respeito pela saúde dos trabalhadores em causa, são completamente colocados de parte para dar lugar a uma política de desprezo pelos problemas dos professores, particularmente daqueles que se encontram fragilizados pela doença. Por isso mesmo, urge confrontar o Governo com esta sua política de desrespeito.

Nestes termos, ao abrigo do disposto na alínea c) do artigo 162.º e do artigo 169.º da Constituição da República Portuguesa e ainda da alínea h) do n.º 1 do artigo 4.º e do artigo 189.º do Regimento da Assembleia da República, os Deputados abaixo assinados do Grupo Parlamentar do PCP, vêm requerer a Apreciação Parlamentar do Decreto-Lei n.º 124/2008, de 15 de Julho, «Segunda alteração ao Decreto-Lei n.º 224/2006, de 13 de Novembro, estabelecendo as condições de colocação em situação de mobilidade especial dos docentes declarados incapazes para o exercício da actividade docente e um regime excepcional de acesso à colocação em estabelecimento de educação ou ensino, bem como a possibilidade de colocação em situação de mobilidade especial para os docentes com ausência de componente lectiva».

Assembleia da República, em 17 de Julho de 2008

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