Projecto de Lei N.º 100/XV/1.ª

Altera a Lei n.º 32/2008, de 17 de Julho sobre conservação de dados gerados ou tratados no contexto da oferta de serviços de comunicações electrónicas

Exposição de motivos

Como é do conhecimento geral, através do Acórdão n.º 268/2022, o Tribunal Constitucional declarou inconstitucionais, com força obrigatória geral, os artigos 4.º em conjugação com o artigo 6.º e o artigo 9.º da Lei n.º 32/2008, de 17 de julho, sobre conservação de dados gerados ou tratados no contexto da oferta de serviços de comunicações eletrónicas.

Considerou, em síntese, o Tribunal Constitucional, que a conservação generalizada, pelo período de um ano, dos dados de tráfego e de localização (os chamados metadados) de todos os utilizadores de comunicações eletrónicas ultrapassa os limites da proporcionalidade na restrição de direitos fundamentais à reserva da intimidade da vida privada e à autodeterminação informativa, violando assim os n.ºs 1 e 4 do artigo 35.º e o n.º 1 do artigo 26.º em conjugação com o n.º 2 do artigo 18.º da Constituição.

Mais decidiu o Tribunal Constitucional declarar a inconstitucionalidade do artigo 9.º da referida Lei .º 32/2008, de 17 de julho, por não prever, em momento algum, a necessidade de informar o titular dos dados que foram transmitidos no âmbito de um processo criminal da existência desse procedimento, comprometendo a sua possibilidade de conhecer a informação a que a autoridade pública acedeu a seu respeito mas ainda a faculdade de defesa e reação contra eventuais acessos ilegítimos a essa informação, por violação do n.º 1 do artigo 35.º e do n.º 1 do artigo 20.º, em conjugação com o n.º 2 do artigo 18.º da Constituição.

As consequências desta decisão, cuja bondade constitucional não se questiona, não deixam de ter consequências relevantes em matéria de investigação da criminalidade mais grave, como foi salientado publicamente Procuradora-Geral da República e por outras entidades intervenientes na investigação criminal.

A questão que se coloca então ao legislador é a de procurar conciliar os objetivos de eficácia da investigação da criminalidade mais grave, para a qual o acesso aos metadados se afigura muito relevante, com a salvaguarda dos valores constitucionais violados pela lei em causa.

A proposta que o PCP apresenta assume o propósito de tentar resolver apenas os problemas suscitados pelo Tribunal Constitucional, não se propondo rever globalmente a Lei n.º 32/2008, de 17 de julho.

Assim, propõe-se uma limitação temporal significativa da conservação dos dados de tráfego e de localização dos utilizadores de comunicações eletrónicas, que é atualmente de um ano, para um prazo de 90 dias, após o qual devem ser destruídos pelos operadores. Apenas durante esses 90 dias, após as comunicações, podem os respetivos dados ser facultados às autoridades judiciárias nos termos da lei.

Relativamente à questão da comunicação aos interessados da transmissão dos seus dados às autoridades judiciárias, propõe-se que o juiz de instrução que autorizou a transmissão notifique os interessados desse facto logo que considere que tal comunicação não seja suscetível de comprometer as investigações nem a vida ou integridade física de terceiros.

Mais se propõe que a conservação de dados para efeitos da Lei n.º 32/2008, de 17 de julho sejam conservados pelos operadores em território nacional e que a respetiva transmissão a autoridades de outros Estados seja feita estritamente em conformidade com o regime legal aplicável em matéria de cooperação judiciária internacional.

Nestes termos, ao abrigo da alínea b) do artigo 156.º da Constituição e da alínea b) do n.º 1 do artigo 4.º do Regimento, os Deputados da Grupo Parlamentar do PCP apresentam o seguinte Projeto de Lei:

Artigo 1.º

Objeto

A presente lei procede à segunda alteração à Lei n.º 32/2008, de 17 de julho, alterada pela Lei n.º 79/2021, de 24 de novembro, sobre conservação de dados gerados ou tratados no contexto da oferta de serviços de comunicações eletrónicas

Artigo 2.º

Alteração à Lei n.º 32/2008, de 17 de julho

Os artigos 6.º e 9.º da Lei n.º 32/2008, de 17 de julho, na sua redação atual, passam a ter a seguinte redação:

“Artigo 6.º

[…]

As entidades referidas no n.º 1 do artigo 4.º devem conservar em Portugal os dados previstos no mesmo artigo pelo período de 90 dias a contar da data da conclusão da comunicação.

Artigo 9.º

[…]

  1. […];
  2. […];
  3. […];
  4. […];
  5. […];
  6. […];
  7. A transmissão de dados previstos no artigo 4.º da presente lei a autoridades de outros Estados só pode ser efetuada de acordo com as regras de cooperação judiciária internacional estabelecidas na lei.

Artigo 3.º

Aditamento à Lei n.º 32/2008, de 17 de julho

É aditado à Lei n.º 32/2008, de 17 de julho, na sua redação atual, um novo artigo 9.º-A com a seguinte redação:

Artigo 9-º-A

Notificação aos titulares de dados

O juiz de instrução que autorizou a transmissão de dados previstos na presente lei no âmbito de um processo criminal notifica o titular dos dados dessa transmissão a partir do momento em que considere que essa comunicação não seja suscetível de comprometer a investigação criminal ou de constituir risco para a vida ou integridade física de terceiros.

Artigo 4.º

Entrada em vigor

A presente lei entra em vigor no dia imediato ao da sua publicação.

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