Intervenção de Bruno Dias na Assembleia de República

«Afirmar a soberania e resistir à guerra económica da globalização capitalista»

Senhor Presidente,
Senhores Deputados,
Senhores Secretários de Estado,

O PCP tem vindo a alertar e a denunciar as implicações e as ameaças destes verdadeiros “tratados das transnacionais”, que colidem directamente com os ordenamentos jurídicos, o bem-estar e o desenvolvimento dos povos. E este acordo (CETA) é bem o exemplo disso mesmo, com todas as consequências para Estados como Portugal, nomeadamente na produção industrial e agrícola, na segurança alimentar, na legislação laboral.

Perguntas objetivas que queremos colocar: que garantias podem ser dadas pelo Governo relativamente às matérias que deixam completamente em aberto as ameaças à produção e à comercialização de produtos regionais? As ameaças à pequena e média agricultura? Quando o CETA apenas reconhece centena e meia das mais de duas mil denominações geográficas existentes, isto é aceitável para o Governo? Para o PCP não é!

Nomeadamente em relação à importação de carne de suíno e de bovino, qual é concretamente a estimativa do aumento de importações face ao quadro atual, que este acordo torna possível?

Ao nível da segurança alimentar, designadamente no que toca aos organismos geneticamente modificados, aos fatores de crescimento ou às hormonas, as diferenças entre o Canadá e a UE são enormes. No acordo não é explícito quem fará e como será feito o controlo das toneladas de carne de bovino que entrarão nos diversos países da União Europeia. Isto não levanta preocupações ao Governo?

O CETA visa promover a privatização dos serviços públicos, bloqueando a possibilidade de estes voltarem para a esfera pública, caso um Estado decida soberanamente que determinados serviços devem ser prestados e geridos de forma pública e universal. Ou seja, os serviços públicos que foram já privatizados ou funcionam numa lógica de concessão, ficam abrangidos pelo CETA e à disposição das transnacionais e dos seus interesses. O Governo assume estas opções políticas e responde por elas?

O Governo aceita que neste acordo não exista um único mecanismo para defender os direitos dos trabalhadores, para impedir que se baixe os níveis de protecção, para evitar um mais do que previsível dumping legislativo em matéria laboral? Referiu que o Canadá ratificou agora uma convenção da OIT. Mas não eram perto de 190 convenções que estavam por ratificar? Incluindo no tocante à contratação colectiva?

O Governo subscreve esta negação do princípio da igualdade de todos perante a Lei que o acordo consagra? É isso que se coloca, ao prever-se a criação de um dito tribunal arbitral para resolução de litígios [ICS], e que tem – mesmo com as alterações de cosmética introduzidas na fase final em resposta aos protestos generalizados – o poder para proteger os interesses das transnacionais, colocando-os acima da soberania dos Estados e do bem-estar dos trabalhadores e dos povos. A Sra. Secretária de Estado fala em “solução transitória”, mas é essa a que entra em vigor se o CETA não for rejeitado!

Senhor Presidente,
Senhores Deputados,
Senhores Secretários de Estado,

Portugal precisa de combater os seus défices, energético, alimentar, tecnológico e demográfico. Precisa de afirmar a sua soberania e resistir à guerra económica da globalização capitalista, defender o seu mercado interno e a sua produção nacional. Não para comerciar menos, mas para comerciar mais; não para fechar Portugal ao mundo, mas para desenvolver relações comerciais e de cooperação mutuamente vantajosas. Por isso, Sra. Secretária de Estado, não é aceitável essa generalização das “derivas isolacionistas”.

Este país não está condenado ao declínio e a uma posição cada vez mais subalterna na divisão internacional do trabalho, não está condenado à estagnação e ao empobrecimento. Mas para isso precisa de crescer e de se desenvolver. Precisa de investimento para promover a produção e a produtividade, a competitividade, o crescimento, o emprego e o bem-estar social e precisa de ganhar margem de manobra para afirmar o seu projecto soberano de desenvolvimento. E não é com acordos como este, defendidos pelo PS, PSD e CDS, que esses objectivos são alcançados, bem pelo contrário.

Disse.

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