Decorre na CP há cerca de um mês uma greve ao trabalho extraordinário, ao trabalho em dia de folga e em dia feriado. Ontem, a Administração da CP enviou uma carta aos trabalhadores da Empresa informando que a partir de dia 20 de Março passaria a considerar a greve como ilegal e a ameaçar com acções disciplinares e cíveis contra quem se mantivesse em greve.
Ora, estando esta greve a decorrer há tanto tempo, colocar-se-ia sempre a questão de saber quais as razões para só agora a empresa ter "descoberto" esta ilegalidade. Mas, mais grave ainda, sabemos agora que, para esta mesma greve (e antes do seu início), a CP solicitou ao Ministério do Trabalho a definição de serviços mínimos, e que estes foram objecto de decisão pelo Tribunal Arbitral constituído no quadro do CES. Ou seja, independentemente das razões – falsas – invocadas pela administração da CP para considerar a greve ilegal, o facto é que ela está a declarar ilegal uma greve sobre a qual existe uma deliberação do CES!
Estamos claramente face a um comportamento completamente ilegal e inaceitável da Administração da CP, que viola os direitos, liberdades e garantias constitucionalmente garantidos.
Por outro lado, sublinhamos o facto espantoso de uma greve ao trabalho extraordinário se estar a traduzir na supressão de milhares de comboios. E de que as medidas decretadas pelo Governo, que ilegalmente suspenderam as regras livremente definidas na contratação colectiva, estão a provocar, só pela sua aplicação, os prejuízos que a administração da CP reconhece – isto, apesar de tentar imputar essas responsabilidades aos trabalhadores e não a quem decidiu estas medidas: o Governo. Seria do mais elementar bom senso o governo abandonar este caminho da confrontação com os ferroviários, e respeitar a contratação colectiva que foi livremente assinada.
E o argumento invocado para o confronto com os ferroviários – a lei do Orçamento de Estado – não é aceitável. Em primeiro lugar, porque essa lei é ela própria ilegal na forma como altera a contratação colectiva. Em segundo lugar, porque a própria lei, por decisão da Assembleia da República, determina a possibilidade de excepções, o que teve já como consequência o facto de na TAP o Governo ter retirado a pretensão de congelar todas as progressões, de na REFER o governo ter recuado na intenção de reduzir um conjunto de pagamentos, de na Carris o Governo ter autorizado o pagamento dos prémios aos trabalhadores, etc.
Esta situação concreta, das implicações e das circunstâncias desta greve na CP ao trabalho extraordinário, ao trabalho em dia de folga e em dia feriado, foi suscitada pelo Grupo Parlamentar do PCP no dia 1 deste mês, na passada reunião com o Ministro dos Transportes na Comissão Parlamentar – mas o Governo nada respondeu sobre a matéria. Com esta chantagem e intimidação, o caso é ainda muito mais grave e exige uma resposta urgente do Governo.
Assim, ao abrigo do disposto na alínea d) do Artigo 156.º da Constituição da República Portuguesa e em aplicação da alínea d), do n.º 1 do artigo 4.º do Regimento da Assembleia da República, pergunto ao Governo, através do Ministério das Obras Públicas, Transportes e Comunicações, o seguinte:
1. O Governo assume a responsabilidade política por este comportamento completamente ilegal e anti-democrático da Administração da CP, de declarar «ilegal» a greve em curso e mover represálias contra os trabalhadores? Se não pactua com esta situação, vai demitir a Administração da CP?
2. Não entende o Governo que está na altura de reconhecer os prejuízos que a estratégia em curso, de promoção do confronto com os ferroviários (e que só pode ter o aval do Governo), está a trazer ao país?
3. Quando vai afinal o Governo reconhecer esta elementar realidade, de que o único caminho para a resolução deste problema que o Governo criou é a reposição do direito à contratação colectiva, e não a multiplicação das operações de chantagem, pressão e repressão sobre os trabalhadores e as suas organizações?