Intervenção de Jerónimo de Sousa na Assembleia de República

"Os únicos satisfeitos com estas políticas são os que lucram com a miséria dos povos"

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O Secretário-Geral do PCP afirmou hoje, no debate em torno da reunião do Conselho Europeu, que nesta união europeia, dos 27 milhões de desempregados, dos 125 milhões de pobres, as políticas seguidas não resolvem nenhum destes problemas, mas antes agravam-nos, continuando a encher os cofres ao grande capital financeiro.
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Debate prévio ao próximo Conselho Europeu e debate sobre o estado da União

Sr.ª Presidente,
Sr. Primeiro-Ministro,
Aqui estamos, mais uma vez, a fazer o habitual debate sobre o Conselho Europeu e, mais uma vez, somos obrigados, antes de nos centrarmos nas suas previsíveis conclusões, a confrontá-lo com uma realidade que o Governo tenta esconder por todos os meios.
Ontem e hoje, já muito foi dito sobre as declarações do Presidente do Banco Central Europeu em torno do chamado «novo programa», «programa cautelar» ou o que lhe quisermos chamar para Portugal. Não nos surpreendem tais declarações. É que só quem não quer ver é que poderia acreditar na propaganda da retoma, do quase milagre económico em Portugal e da mal chamada «saída limpa» que ainda anteontem o seu Governo apresentou como bandeira.
Dirá que o Sr. Draghi mais não fez do que pôr hipóteses em cima da mesa, que o Governo nunca a afastou completamente ou, então, que é cedo de mais para falar do assunto. Ou seja, diz: «Pois sim… Mas não… Talvez…», jogando numa tripla e não respondendo a coisa nenhuma.
Mas agora o Governo não tem mais escapatória e por isso coloco-lhe esta questão: que negociações, que contactos, que compromissos é que o Governo assumiu com a União Europeia e com a troica?
Exige-se, neste debate na Assembleia da República, uma clarificação!
Deixe-me que lhe diga, em primeiro lugar, que, mais do que explicações, do que o País necessita é de decisões.
É que, enquanto os senhores, a troica e o Sr. Draghi se envolvem numa cada vez mais comprometedora discussão sobre a forma concreta de prosseguir este rumo de desastre, a realidade, essa, vai evoluindo. É que, enquanto os senhores falam de retoma e, espante-se, de recuperação da soberania, do virar da página, a história que os portugueses vivem é outra: é a de 1,5 milhões de desempregados; é a de 2,7 milhões de portugueses a viverem em risco de pobreza ou já em privação severa; é a de um Governo completamente submetido aos ditames da troica e da União Europeia; é a de um País em que, para além dos 130 000 portugueses que se viram obrigados a deixar Portugal, um terço dos que cá vivem, mais de 3 milhões, põe a hipótese de emigrar por causa da sua situação económica.
Este País que estes senhores irresponsavelmente dizem estar a recuperar é o País onde 40% da população fica sem dinheiro para viver depois de pagar as suas contas, é o País onde 29% da população considera que não tem dinheiro suficiente para uma vida digna.
Falam em milagre e do bom caminho e, no entanto, o FMI, fazendo de «polícia mau» da troica, vem dizer que é preciso baixar os salários no privado por via da destruição da contratação coletiva e da simplificação dos despedimentos. Até exemplificava: dar ao patrão a facilidade de despedir arbitrariamente um trabalhador com um salário de 1000 € para contratar outro por 500 €.
Disse o Sr. Primeiro-Ministro que não estaria de acordo com o rebaixamento dos salários. Muito bem. Mas diga aqui, na Assembleia, que não vai alterar a legislação laboral para enfiar pela janela o que diz não querer que entre pela porta.
(…)
Sr.ª Presidente,
Sr. Primeiro-Ministro,
Pudera, não há de o Sr. Draghi estar satisfeito!! Eu já ouvi banqueiros que estão satisfeitíssimos, já ouvi testas de ferro de grupos económicos que estão satisfeitíssimos, os multimilionários que viram aumentar as suas fortunas estão satisfeitíssimos…
O grande problema, Sr. Primeiro-Ministro, é que a maioria dos portugueses estão profundamente insatisfeitos e preocupados com o resultado da sua política!
Mas, voltando ao tema, como é que o Sr. Primeiro-Ministro vai votar umas conclusões que preveem o aprofundamento dos constrangimentos contra Portugal e que decidem avançar para as chamadas «parcerias», baseadas em acordos contratuais, autênticos pacotes de chantagem económica, em tudo similares ao atual pacto de agressão, sem lhe chamar esse nome?
Deixo-lhe uma última questão sobre uma matéria da qual não falou, mas é importante situar o problema. Esta União Europeia, a dos 27 milhões de desempregados, a dos 125 milhões de pobres, a União Europeia prémio nobel da paz, que tantos, à direita e à esquerda, saudaram, é mesma que neste Conselho pretende aprovar um gigantesco e milionário programa que visa obrigar os Estados-membros a aumentar os gastos em armamento, na indústria de guerra, e que procura concentrar ainda mais o poder do complexo industrial militar nas grandes potências e no grande capital.
Esta União Europeia do desemprego, da crise social, é a mesma que define o enorme conjunto de medidas que, em colaboração com a NATO, vai afirmando, como ela é, um projeto de domínio imperialista, contrário aos interesses dos trabalhadores e dos povos do nosso continente e também de todo o mundo.
Mas nada é imutável, Sr. Primeiro-Ministro. Sendo verdade que os impérios fazem sempre planos para mil anos, maior verdade é que todos eles acabaram por cair, por ser derrotados pela luta e pela vontade dos povos em favor da paz.

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