Intervenção de Jerónimo de Sousa, Secretário-Geral do PCP, Sessão Pública «PCP - Contigo todos os dias»

«Um falso voto útil dado ao PS em nome do combate à direita traduzir-se-à num voto inútil para a melhoria das condições de vida dos trabalhadores e do povo»

Acabámos de sair de uma importante batalha eleitoral para a Assembleia da República e aqui estamos, a analisar e avaliar a situação dela decorrente e a perspectivar a nossa intervenção e os combates do presente e do futuro.

Foi uma batalha eleitoral que exigiu uma grande entrega na mobilização e esclarecimento para o voto na CDU de todo o nosso Partido e do conjunto de activistas da CDU, do PEV, da ID e de muitas pessoas sem filiação partidária e se traduziu numa expressiva campanha de massas.

Campanha que contou com o particular contributo da Juventude CDU que, com a sua participação militante, deram a esta campanha uma grande energia, alegria e combatividade.

A todos uma fraterna saudação!

Saudação extensiva a todos e a cada um dos eleitores que depositaram na CDU a sua confiança e, particularmente, os que o fizeram pela primeira vez, assegurando que esse apoio e esse voto se prolongam para lá do dia das eleições na defesa dos seus direitos.

O quadro político e a relação de forças que resultou destas eleições legislativas ficam marcados, com a obtenção pelo PS de uma maioria absoluta, pelo avolumar das dificuldades e das resistências de dar solução e resposta aos problemas do povo e do País. Dificuldades e resistências que vinham em crescendo e se acentuaram a partir de 2019, com o segundo governo do PS de António Costa. Dificuldades e resistências inseparáveis das suas opções a favor dos grandes interesses económicos e financeiros e sua submissão à União Europeia.

O querer fugir à solução dos principais problemas do País e à influência do PCP e do PEV que o grande capital exigia, estão na origem da convocação das eleições que agora se realizaram. Uma decisão para a qual convergiu a vontade do Presidente da República e do PS que há muito desejava encontrar e criar as condições propícias a essa fuga e a uma há muito ambicionada maioria absoluta.

O Orçamento do Estado foi o pretexto para quem aspirava ficar de mãos livres para regressar à sua política de sempre.

O posicionamento do PS, os argumentos eleitorais a que recorreu e o resultado obtido não deixam hoje margem para dúvidas de que, verdadeiramente, foi em função desse objectivo que o PS conduziu a discussão do Orçamento do Estado para 2022.

Antes já o PS o havia indiciado com a mesma posição de chantagem face à solução do problema da contagem do tempo de serviço dos professores, depois com o IVA da energia, perseguindo o objectivo que havia sido apontado, quando na última sessão da anterior legislatura e à beira das eleições, o PS proclamava na Assembleia da República querer “governar sem empecilhos”.

De ameaça em ameaça, de chantagem em chantagem, o PS deliberadamente criou as condições para o fazer, vitimizando-se.

A chantagem que o PS fez para não dar resposta aos problemas que a situação do País exigia, apesar de haver meios, confirma a sua opção por dar satisfação às persistentes exigências do grande capital que reclamava a ruptura com qualquer solução de convergência com o PCP e a CDU.

É ver hoje alguns dos principais dirigentes do PS, num indisfarçável contentamento, sublinharem a libertação do PS dos condicionamentos da acção do PCP. Afinal de contas o PS quer é libertar-se da exigência de soluções para os problemas do País, que o PCP de facto sempre protagonizou, para voltar às políticas que agravam esses mesmos problemas. Se não fosse com a maioria absoluta, haveria de ser com os arranjos com o PSD.

Basta ver o foguetório que por aí vai a saudar a maioria absoluta do PS e, vindo dessas paragens do grande capital, seja do patrão dos patrões da CIP, seja dos banqueiros, como o do presidente do BPI, no mesmo momento que acabava de anunciar ter triplicado os seus lucros em 2021, diz-nos a quem serve de facto essa ambicionada maioria e quanta confiança expressam nela os senhores do dinheiro.

Não é por acaso que tenha sido este o momento escolhido para os principais grupos privados da saúde beneficiários dos contratos de PPP virem engrossar a voz a exigir ressarcimento pelos prejuízos atribuídos à epidemia. Nesta como noutras áreas, a lógica é sempre a mesma: o Estado paga para dar lucro e quando dá prejuízo o Estado paga mais para cobrir o prejuízo. Para os grandes grupos privados não há risco; para o Estado a única certeza é de que paga sempre mais.

Esta maioria absoluta, que beneficiou de uma extrema promoção da bipolarização e da dramatização do perigo da direita, deixa o PS com condições de levar mais longe o seu compromisso com a política de direita e manter as suas opções de subordinação aos grandes interesses económicos que dominam o País.

No que diz respeito à CDU, o resultado obtido nestas eleições legislativas traduz, com a eleição de 6 deputados, uma significativa perda de deputados, incluindo a representação parlamentar do PEV.

Um resultado que, ficando aquém do trabalho que realizou e do determinante contributo que deu para os avanços e conquistas nos últimos anos, do valor das soluções que apresentou para os problemas nacionais e da ampla campanha de esclarecimento e mobilização para o voto que realizou, representa um elemento negativo na vida nacional.

Mas se os resultados não excluem uma análise mais aprofundada, sem deixar de olhar para as nossas próprias insuficiências e deficiências, eles estão marcados por um conjunto de factores que os influenciaram decisivamente e que se tornaram cada vez mais evidentes à medida que a campanha eleitoral avançava.

Desde logo pela operação levada a cabo a partir da dissolução da Assembleia da República para favorecer a construção de um bloco central com as mesmas forças políticas que lideraram à vez a governação do País nas últimas décadas, o PS e o PSD, agora numa versão de apoio mútuo, e que o PS chegou a explicitar como uma governação à Guterres, lei a lei e tendo como pano de fundo os “acordos de regime” que unem PS a PSD. Uma operação que assentou na estimulação de uma dinâmica bipolarizadora, deliberada e artificialmente construída à volta daqueles dois partidos, e enfunada pelas sondagens e por uma opinião mediática, dominada por quem estava empenhado no êxito de tal estratégia.

Nesta operação teve um papel de relevo e complementar o crescente agigantamento do medo da direita e da influência numa solução de poder que uma direita ainda mais reaccionária como a Iniciativa Liberal, mas também da influência de uma direita racista e xenófoba, que viveram sempre no seio dos principais partidos da direita e que têm vindo a autonomizar-se à boleia de tendências internacionais, e apoiada e promovida por certos sectores do capitalismo dominante que a sopram e enfolam, como elemento complementar de pressão e de diversão ideológica e política.

O que muitos não viram ou não compreenderam naquele dia da votação, o irão compreender amanhã, estamos certos, quando um falso voto útil dado ao PS em nome do combate à direita se traduzir num voto inútil para a melhoria das condições de vida dos trabalhadores e do povo e do combate a essa mesma direita!

Com peso significativo na influência dos resultados está também a insistente mentira de responsabilização do PCP e do PEV pela realização de eleições, a propósito da não aprovação da proposta do Orçamento do Estado para 2022 e a abusiva apropriação pelo PS dos avanços alcançados na defesa, reposição e conquista de direitos, que resultaram sempre da acção determinada das forças da CDU.

Trabalhamos e agimos agora num quadro mais difícil, mas cá estamos e cá continuamos determinados em prosseguir com confiança a intervenção em defesa dos interesses e aspirações dos trabalhadores e do povo, das soluções para os problemas nacionais.

Cá estamos e cá continuamos a agir para recuperar posições perdidas, tal como já aconteceu no passado, dando mais força à luta pela política alternativa patriótica e de esquerda de que o País precisa e que estas as eleições não resolvem, nem vão resolver.

Cá estamos e cá continuamos com a força da expressão eleitoral agora obtida, mas sobretudo com essa força maior de um Partido que pela sua intervenção, enraizamento e projecto é, e confirmar-se-á, como força essencial para defender os interesses dos trabalhadores e do povo.

A realização das eleições não iludiu os problemas e dificuldades que estão colocados aos trabalhadores, ao povo e ao País. Como o PCP afirmou, o que o País precisava era de soluções, não de eleições.

A vida tem-no vindo a mostrar e continuou a mostrar nestes meses que nos separam do momento em que elas se decidiram.

Os problemas que pesam na vida de cada dia dos que vivem e trabalham no País e constrangem o desenvolvimento nacional permanecem, avolumando as marcas negativas na realidade económica e social do País, onde pesam crescentes desigualdades e injustiças resultantes de décadas de política de direita e que as orientações e opções já assumidas pelo PS não estão em condições de alterar, antes podem ser agravadas pela acção revanchista do grande capital e dos seus projectos retrógrados e reaccionários.

Agora com tendência para se agravarem ainda mais, quando a inflação continua a subir muito acima dos 3%, como aconteceu em Janeiro, comendo poder de compra de salários e pensões que não crescem e rendimentos das camadas intermédias. E quando se avizinha a retoma em força das regras do Pacto de Estabilidade e crescem as pressões e as chantagens, dos mercados financeiros e da subida das taxas de juro, alguns querem aproveitar esse pretexto para levar a cabo a política da ditadura do défice, com mais cortes nos serviços públicos, nos salários e no investimento público – inviabilizando o crescimento económico.

Uma situação que exige resistir e ampliar a luta, promover a convergência dos democratas, afirmar uma política alternativa.

Este é o momento de reafirmar que o País não está condenado às desigualdades, à estagnação económica e ao retrocesso social. Não está condenado a um modelo de baixos salários e pensões de reforma, à precariedade no trabalho e na vida, à desregulação dos horários, ao aumento da exploração, à dependência externa por razão da destruição da sua capacidade produtiva, à degradação dos serviços públicos e à liquidação do Serviço Nacional de Saúde, à dificuldade no acesso à habitação, à alienação de instrumentos e recursos indispensáveis ao desenvolvimento soberano do País e que estão hoje entregues, sobretudo, a grupos monopolistas estrangeiros.

É preciso uma política alternativa que responda cabalmente aos problemas do povo e do País, que liberte Portugal de constrangimentos e imposições contrários aos interesses nacionais.

Uma resposta que exige a ruptura com a política de direita e a adopção de uma política patriótica e de esquerda. Uma resposta que enfrente e rompa com os interesses do grande capital e que assuma a necessidade da libertação do País da submissão ao Euro e às imposições da União Europeia. Uma resposta que reclama o controlo público dos sectores e empresas estratégicas.

A situação que o País enfrenta coloca na ordem do dia a concretização de respostas e soluções que avancem na promoção de um desenvolvimento económico sustentado, para o aumento geral dos salários, assegurando a revogação das normas gravosas da legislação laboral e o combate à precariedade.

Avancem na valorização das reformas e as pensões para todos e das longas carreiras contributivas. Na garantia dos direitos das crianças e dos pais, nomeadamente assegurando a gratuitidade das creches, desenvolvendo uma rede pública, bem como o direito a viver numa habitação digna, o que exige o aumento de habitação pública, a estabilidade e regulação dos preços de arrendamento, o combate à especulação.

Não é suportável a situação de aumento contínuo do preço das casas que ficaram 50% mais caras em cinco anos, como nos diz o INE!
Mas respostas e soluções também que avancem decididamente na defesa e reforço do Serviço Nacional de Saúde, fixando e atraindo profissionais, garantindo mais consultas, exames, cirurgias, médico e enfermeiro de família para todos.

Respostas e soluções para a Educação, a Ciência, a Cultura e para a melhoria dos serviços públicos capazes de responder às necessidades das populações.

Respostas e soluções para aliviar os impostos sobre o trabalho e as micro pequenas e médias empresas.

Assegurar o direito a um ambiente saudável e ao equilíbrio ecológico, com o combate à mercantilização da natureza e a prevenção e mitigação dos efeitos das alterações climáticas.

Os tempos que vivemos reclamam e exigem um Partido Comunista Português forte, determinado e convicto. Reclamam firmeza ideológica e uma grande disponibilidade revolucionária para assegurar com êxito as exigentes as tarefas que a actual situação coloca ao PCP.

No imediato e no âmbito da análise, da iniciativa e da resposta necessárias, impõe–se concretizar a decisão do nosso Comité Central da realização de reuniões e plenários de militantes, sobre a situação, os problemas dos trabalhadores e do povo, a luta de massas, a mobilização de forças e a adopção de acções e medidas para o reforço da intervenção do Partido.

Sim, analisar, debater, traçar caminhos e ao mesmo tempo agir aqui e agora para dar resposta à exigente evolução da vida nacional, eis o que é imperioso fazer, levando para frente todo um programa de trabalho e de reforço de organização partidária, porque do seu reforço dependerá a garantia da defesa dos trabalhadores, dos interesses populares e do País.

Estar onde estão as massas, organizar e dinamizar a luta dos trabalhadores e do povo, elemento decisivo e central para defender o que se conseguiu e para avançar nas respostas e soluções necessárias à vida do povo e do País.
É este o caminho que precisamos de aprofundar e pôr em marcha, assegurando uma acção que tenha como preocupação fundamental dar resposta aos problemas, às aspirações, às reivindicações dos trabalhadores e do nosso povo. E tomar a iniciativa para promover a sua unidade e luta, articulada com a afirmação e o reforço do Partido. Reforço com mais camaradas a assumirem responsabilidades e tarefas regulares, com o recrutamento de novos militantes e a consideração das centenas de pessoas que nas últimas semanas mostraram a intenção de aderir ao Partido, integrando e responsabilizando cada um deles. Reforço na intervenção e organização nas empresas e locais de trabalho alargando a influência nos trabalhadores e a sua mobilização, fonte de energia e capacidade. Reforço da JCP e da acção junto da juventude e do trabalho das organizações locais com as populações. Reforço em todas as dimensões e áreas de intervenção.

Neste tempo de luta assume desde já uma particular importância a realização do comício de 6 de Março, no Campo Pequeno, em Lisboa. Iniciativa que constituirá uma grande acção de massas inserida na luta pela resolução dos problemas nacionais, pela melhoria das condições de vida dos trabalhadores e do povo, contra a exploração e o empobrecimento, pela ruptura com a política de direita, por uma política alternativa, pela liberdade, a democracia e o socialismo.

Temos um Partido como nenhum outro, com uma história, força, valores e projecto sem igual. Um Partido que afirma e reafirma a sua natureza e identidade comunista na concretização de uma política patriótica e de esquerda, em ruptura com a política de direita, por uma democracia avançada, por uma sociedade nova, liberta da exploração e da opressão - o socialismo e o comunismo.

Os trabalhadores e o povo podem contar com o PCP e a sua intervenção decisiva na defesa e afirmação dos seus direitos.

Hoje, como sempre, é no PCP que se encontrará essa força de todos os dias para os combates e a luta dos trabalhadores e do povo em defesa dos seus interesses e aspirações.