Intervenção de Paulo Raimundo, Secretário-Geral, Almoço comemorativo do 102.º aniversário do PCP

«Tudo serve de desculpa e justificação para o aumento das desigualdades, para a concentração de riqueza»

Uma saudação a todos os presentes, camaradas e amigos, e em particular a todos quantos contribuíram com o seu tempo, o seu esforço, a sua militância, para este belo almoço.

Uma grande iniciativa deste nosso Partido, deste extraordinário colectivo partidário que responde à altura dos tempos exigentes que enfrentamos.

A política de direita não dá descanso aos trabalhadores e ao povo, mas é verdade que também não lhe damos descanso.

PS, PSD, CDS, IL e Chega alinham-se em tudo o que é central e decisivo.

Mais berro, mais esbracejar ou teatro, menos abstenção, ora vais tu, ora vou eu, no essencial lá vão concretizando os objectivos de quem efectivamente determina e decide por eles - os grupos económicos. Cada um cumpre o seu papel nesta orquestra que inferniza a vida da grande maioria da população.

Uma orquestra que toca sempre a mesma melodia afinada pelo diapasão de uma pequeníssima minoria.

Uns cumprem o turno da governação, outros anseiam por ela, outros batem os pratos e outros tocam violino. Uns mais acelerados, outros mais contidos, mas a música é a mesma, e as condições de vida para a esmagadora maioria da população degradam-se.

Mas há cada vez mais gente a perceber que isto não vai lá com as alternâncias e que isto é musica para os nossos ouvidos.

Veja-se a especulação nos preços, para a qual alertamos há muito e que eles já não conseguem esconder. Veja-se as opções do PS, alinhadas com a matriz de PSD, Chega e IL, para enfrentar este problema.

Passam olimpicamente ao lado dos lucros da grande distribuição, nem um cêntimo sequer se propõem ir buscar.

IVA zero para os bens essenciais, admitimos, ainda que saibamos que essa medida por si só não vai resolver o problema central da especulação. Foi já assim na redução do ISP nos combustíveis, foi assim aqui ao lado em Espanha no IVA dos alimentos.

Afirma o Governo que está em negociação com a distribuição, é caso para dizer que o Governo está com uma grande fezada na sensibilidade social da grande distribuição.

Uma fezada que não tem nenhuma sustentação na sua prática relativamente aos preços e muito menos no que toca aos salários dos seus trabalhadores. A medida que enfrenta a especulação, a medida que enfrenta os lucros obscenos, a medida que trava o aumento dos preços é o controle e a fixação de preços.

Mas se o Governo está disponível para avaliar esse imposto cego que é o IVA então concretize, tal como o PCP propõe há muito, a redução do IVA na electricidade, no gás e nas telecomunicações, vamos ver se o Governo dá esse passo. Avança ainda o Governo com mais apoios aos mais vulneráveis. Apoios limitados, mas que são naturalmente importantes para quem os recebe.

Mas há desde logo dois problemas, o primeiro é que as contas cada vez maiores, da água, da luz, da renda, dos alimentos, da creche, e por aí fora, não se pagam de 3 em 3 meses, são pagas todos os meses e depois a questão central, que quem põe o País a funcionar, quem produz a riqueza, quem determina o andamento da economia são os trabalhadores e se assim é, não precisam de apoios, precisam, isso sim, é de mais salários, mais salários é o que se impõe, é, como temos dito, uma emergência nacional.

Não há sector de actividade que não tenha justamente razões de queixa.

Que trabalhador, que pensionista, que jovem, que micro, pequeno e médio empresário ou produtor é que não sente na pele as dificuldades a crescerem, o fim do mês a ficar cada vez mais distante?

O grau de injustiça e desigualdade em que vivemos é tal que enquanto 3 milhões de trabalhadores, 70% do total dos trabalhadores, ganham menos de mil euros brutos por mês, e 2 milhões de pessoas estão na pobreza, dos quais mais de 300 mil crianças, os 5% mais ricos concentram 42% de toda a riqueza criada no País.

Não admira que alguns tenham apelidado o ano de 2022 como fantástico. A banca teve, por dia, cerca de 5 milhões de euros de lucro. Continente e Pingo Doce tiveram, por dia, 2 milhões de euros de lucro.

Os principais grupos económicos tiveram, por dia, 20 milhões de euros de lucro. É esta gente que está a ganhar com a guerra e com as sanções, é esta gente não quer ouvir falar de paz, pudera.

É esta gente que se empenha fortemente e com os meios que tem para que a guerra continue e se prolongue. Gasolina no fogo, lucros nos cofres, para eles está tudo bem. Pois para nós está tudo mal, acabe-se com a guerra, procurem-se as soluções de paz. É de paz que os povos precisam, não de guerra, nem de destruição.

A guerra não é, a guerra não pode continuar a ser o pretexto.

Há sempre razões para aprofundar as injustiças, foi a crise, foram as troikas, foi epidemia, agora a guerra. Tudo serve de desculpa e justificação para o aumento das desigualdades, para a concentração de riqueza.

Exigem-se sacrifícios, sempre, sempre aos mesmos. Há sempre quem ganhe, e muito, à conta dos sacrifícios de muitos.

Que tem a dizer sobre tudo isto a orquestra da política de direita? Tem a dizer o mesmo de sempre.

Cada um que faça o exercício e veja por si mesmo.

Sempre que estão em causa os interesses dos grupos económicos, sejam eles quais forem, entra em jogo essa aparentemente estranha aliança.

Cada vez que que estão em causa os direitos e salários dos trabalhadores, vejam como se comporta essa aparentemente estranha aliança.

Assim foi entre outras matérias, na revogação da caducidade da contratação colectiva; nas 35 horas; no controlo de preços do cabaz alimentar; na alteração do estatuto do Serviço Nacional de Saúde; no pôr os lucros dos bancos a pagar a subida das taxas de juro, pôr fim à lei dos despejos; na taxa especial para os paraísos fiscais; na contribuição extraordinária sobre lucros.

Confrontados com esta realidade, os trabalhadores, o povo e os democratas estão perante uma opção que marcará o rumo dos que cá trabalham e vivem e o rumo do País.

Manter a alternância com as consequências que estão à vista, ou tomar nas mãos a construção da alternativa.

Manter a coisa tal como está, mais acelerado ou menos acelerado, ou romper com este caminho. Manter o comando disto tudo nas mãos dos grupos económicos e dos seus interesses ou tomar nas mãos o destino das nossas vidas. São estes os desafios que estão colocados.

Ou caminhamos no sentido do aumento da exploração para a qual haverá sempre justificação ou abrimos um novo rumo de uma alternativa que se coloque ao serviço dos trabalhadores, do povo e da maioria da sociedade.

Ou travamos isto, ou isto vai acabar mal.

O PCP é o portador da alternativa, somos a verdadeira oposição ao Governo e à sua política, somos quem faz frente aos projectos reaccionários, trauliteiros e velhos que se querem impor.

Somos o pólo dessa alternativa urgente e necessária, sabemos que não a construiremos sozinhos, sabemos e não a queremos construir sozinhos.

Esta é a alternativa dos trabalhadores, do povo, de todos os que são alvo da política de direita e como tal são todos estes os construtores da sua alternativa.

A política patriótica e de esquerda, a nova política, interessa à ampla maioria da nossa sociedade.

Essa política nova que se confronta diariamente com a política velha e ultrapassada. Porque o futuro e o que é novo são os direitos e a construção de uma vida melhor.

Ultrapassado e velho é o empobrecimento, é o roubo nos salários e pensões e a precariedade no trabalho e na vida.

Temos propostas, temos soluções e por elas nos batemos, porque são justas, porque correspondem às necessidades dos trabalhadores e do nosso povo. Mobilizemo-nos para ganhar outros e com eles, com o seu envolvimento e participação, construir e levar por diante todas e cada uma destas propostas.

Uma mobilização que exige empenho, criatividade, participação e construção pelo aumento dos salários das reformas e das pensões, porque não há futuro com salários de miséria e com a precariedade laboral; pelos direitos das crianças e dos pais, porque não é possível alegria e aprendizagem sem direitos e é dramático que pais tenham de optar entre pôr comida na mesa ou por tempo de brincadeira e aprendizagem com os seus próprios filhos; pela defesa e na exigência de mais e melhores serviços públicos, porque o público é de todos e o privado é só de alguns; pela paz, porque os povos exigem e a ela têm direito; pela produção nacional e pelo controlo público dos sectores e empresas estratégicas, porque um País cada vez mais dependente é um País cada vez mais condenado; por uma política fiscal que desagrave os trabalhadores e as micro, pequenas e médias empresas.

Os desafios que temos pela frente são muito exigentes. Mas a nossa alegria e o nosso ânimo não são menores.

Alegria e ânimo de quem sabe que é justa e invencível a causa por que luta.

Alegria e ânimo que temos de aplicar em toda e cada uma das linhas de trabalho decididas na nossa última Conferência Nacional e que precisamos de pôr em prática. Todos percebemos que o descontentamento está a crescer e é justo e necessário que cresça.

Mas não pensemos que as pessoas virão naturalmente ter connosco.

Desde logo porque não podemos desvalorizar a força e a intensidade da ofensiva ideológica, que precisamos de contrariar com trabalho, paciência e esclarecimento. E é nas lutas por melhores condições de trabalho, por melhores condições de vida, em defesa dos serviços públicos, ao lado dos trabalhadores, dos utentes, das populações, que temos de continuar a estar e cada vez com mais intensidade, e nenhum de nós está isento deste trabalho fundamental e urgente.

Está em curso uma poderosa acção de luta, uma justa luta que cresce e se alarga em diversos sectores e camadas, como foram há dias as acções dos estudantes do ensino superior e secundário.

No passado dia 18 a manifestação nacional da CGTP, em Lisboa, foi um momento de extraordinário significado e de uma enormíssima dimensão.

Uma luta que está em curso e uma manifestação nacional que é necessário continuar a valorizar, valorizar e muito pelo seu significado e acima de tudo por aquilo que ela revela de força dos trabalhadores, do movimento sindical unitário e do que abre para o futuro.

Um futuro que está já aí.

Dia 28, dia da juventude, é preciso voltar à rua. Mobilizar todos os jovens para a jornada em Lisboa é uma tarefa de todos nós.

Sabemos que a justa indignação e luta que está em curso não significa de forma directa um identificar imediato dos responsáveis, também políticos, pelo estado em que estamos.

Mas também sabemos que é pela luta e pela mobilização que os trabalhadores, as populações e outras camadas adquirem os instrumentos para perceberem quem os explora, quem são os responsáveis pelas injustiças de que são alvo. Estamos numa campanha “Mais força aos trabalhadores”. Temos realizado inúmeros contactos com trabalhadores e é muito o potencial que existe para ir mais longe no contacto.

Mas para isso ser uma realidade e se concretizar não há volta a dar, temos mesmo de continuar a lá estar, lá ir, lá conversar, lá esclarecer, lá mobilizar. Com mais contacto, mais conhecimento da realidade temos. Com mais conhecimento, mais esclarecimento estamos em condições de fazer, quanto às nossas propostas, quanto às nossas posições, quanto ao nosso programa, sem temer o confronto e o debate de ideias.

Com mais esclarecimento, mais recrutamento, com mais recrutamento mais força organizada.

Com mais recrutamento, mais responsabilização de quadros, e por aí mais resposta às tarefas que temos em mãos, transmitindo conhecimento e contribuindo para a sua necessária formação teórica e prática, que devem andar sempre lado a lado.

Com mais responsabilização de quadros e mais capacidade de resposta, mais contactos estamos em condições de realizar. Conhecer e dar a conhecer a nossa propaganda e a nossa imprensa, em particular o Avante!; dotar o Partido de mais meios financeiros, em particular através das quotas, são dois aspectos particularmente importantes da nossa actividade que importa valorizar pelo que representam de maior capacidade de intervenção.

Intervenção para tomar a iniciativa, fomentar a luta, a organização e os movimentos de massas, alargar a ligação e o trabalho com outros democratas.

Este é o Partido da classe operária, de todos os trabalhadores e de todos aqueles que são vítimas da exploração e da opressão nas suas mais diferentes formas.

Este é o Partido Comunista Português, partido com 102 anos que tem mais futuro que história, a vossa caravana vai continuar a passar, os cães continuarão a ladrar e este Partido continuará vivo, bem vivo e a crescer e a alargar.

Aos trabalhadores lhes dizemos, venham com confiança que este é o vosso partido. Este é o partido que vos representa. Este é o partido que combate o capitalismo, a causa estrutural da exploração e da opressão. Tal como afirma a JCP, o capitalismo não é verde, a cor do capitalismo é a cor da exploração, da injustiça, da desigualdade, da miséria, a única cor do capitalismo é a cor da destruição e da guerra.

Cá estamos, cientes das nossas dificuldades mas com uma vontade revolucionária de as superar, com uma vontade e determinação em recrutar mais, enquadrar mais, responsabilizar mais, lutar, intervir e mobilizar mais. Aqui estamos com esta alegria e com esta confiança porque é justa a nossa luta, porque ela é a luta do nosso povo, é a luta dos trabalhadores, é a luta pela sociedade e pelo País de Abril a que temos direito.

Sim, Liberdade, Democracia e Socialismo são futuro, e o futuro pelo qual vale a pena lutar.

Cá continuamos a transformar o sonho em vida. Cá estamos, tal como em toda a história do nosso Partido de 102 anos, com o entusiasmo de quem não se verga perante as dificuldades e de quem sabe que é justa e invencível a causa por que lutamos.

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