Intervenção de

Transportes públicos - Intervenção de Bruno Dias na AR

Política tarifária nos sistemas de transporte público

  

Senhor Presidente,
Senhoras e Senhores Deputados,

Tal como o PCP sempre fez questão de sublinhar, a criação do passe social em 1976 significou a consagração da mobilidade como um direito fundamental de cidadania, constituindo uma importante conquista para a população, e uma medida de indesmentível alcance e justiça social tornada possível no Portugal de Abril.

O passe social é indissociável de uma estratégia de dissuasão à utilização do transporte individual e de salvaguarda do meio ambiente, constituindo um importante factor de coesão social e territorial. E constitui um dos elementos essenciais à implementação de um sistema integrado de transportes públicos, vital para a melhoria da qualidade de vida urbana e factor estruturante do desenvolvimento.

É por isso que, desde há muitos anos, o PCP afirma com clareza a necessidade de confirmar, defender e actualizar um sistema tarifário assente no passe social intermodal. É indispensável salvaguardar os princípios e objectivos que estiveram na sua origem. O que implica antes de mais uma outra política de financiamento do transporte público, em que o poder central assuma as suas obrigações.

Mas também se coloca a exigência de uma política que defenda o serviço público - e o sector público. Porque a verdade é que a privatização de importantes sectores do transporte público veio trazer a diminuição efectiva da oferta e da qualidade do serviço. E este cenário tem contribuído para o recurso ao transporte individual, com todos os inconvenientes económicos, sociais e ambientais daí decorrentes.

O que a vida tem demonstrado, o que os utentes sentem diariamente, é uma oferta de serviço de transportes que não corresponde às necessidades e aos anseios das populações. É uma política de "recolher obrigatório" para milhares e milhares de pessoas, confrontadas com os famigerados "ajustamentos" e "reestruturações" das redes de transportes, com as supressões e encurtamentos de carreiras, com a eliminação de circulações.

Na cidade do Porto, a resposta de utentes e populações fez-se com a luta, com a mobilização de acções de protesto, na firme recusa das alterações à rede dos STCP. Uma resposta que levou ao recuo da Administração da empresa, com a alteração de decisões tomadas. Mesmo que insuficiente no alcance das correcções efectuadas, este resultado veio demonstrar que a mobilização e a luta das populações vale sempre a pena e é sempre insubstituível.

Mais recentemente, em Lisboa, tivemos a notícia de mais uma "reorganização" da rede da Carris, desta vez apresentada como segunda fase da "Rede 7" - a tal que mereceu o parecer negativo quer da Câmara Municipal quer da Assembleia Municipal de Lisboa. Agora aí está a Carris a preconizar novas supressões de carreiras, contando já com a oposição e o protesto de várias juntas de freguesia da cidade de Lisboa.

O PCP não guarda silêncio face a estas preocupantes intenções da Carris. Nem no poder local, nem na Assembleia da República. Por isso, hoje mesmo, na Comissão Parlamentar de Obras Públicas, Transportes e Comunicações, o Grupo Parlamentar do PCP apresentou uma proposta para que se realize uma audição sobre esta matéria, para que sejam ouvidas a Administração da Carris e Comissão de Trabalhadores da empresa, bem como o Movimento dos Utentes dos Serviços Públicos.

Senhor Presidente,
Senhoras e Senhores Deputados,

O flagrante sub-financiamento do sector por parte do Estado tem condenado as empresas públicas de transporte a uma grave situação financeira, apesar do constante aumento dos custos para os utentes. Veja-se o caso concreto do passe social L123, o mais utilizado na Área Metropolitana de Lisboa. Ora, nos últimos sete anos, este passe social aumentou 44%, enquanto o salário mínimo aumentou 26%.

É uma política injusta para as populações e ineficaz para a promoção do transporte público.

Um exemplo concreto: o passe social, para poder valer no Metro Sul do Tejo (MST), custa mais 8,50 €. Só que as pessoas não recorrem a esse suplemento tarifário e, por isso, o MST continua com uma utilização muito abaixo do que seria de esperar. É um caso flagrante que demonstra a importância da integração tarifária para a própria promoção do transporte público.

Perante este cenário, é indispensável confirmar o passe social intermodal como título de transporte de insubstituível importância socio-económica, inegável factor de justiça social e importante incentivo à utilização do transporte colectivo.

Registamos assim que o projecto de lei (nº 169/X)  em debate assume em larga medida os objectivos e os princípios que o PCP defende nesta matéria. E registamos também o entendimento que agora lhe está subjacente, de que a Assembleia da República deve legislar sobre esta questão, e não apenas emitir recomendações ao Governo. É uma posição que vem ao encontro do que o PCP tem afirmado.

Entretanto, e quanto ao alargamento das coroas geográficas (e sublinhamos, coroas, conforme a concepção do PROTAML), o PCP tem propostas concretas, designadamente para a AML. Mais do que uma possibilidade, esse alargamento deve ser visto como uma necessidade real - e nesse sentido deve também ser definido em legislação. É preciso apontar orientações concretas face à situação diferente que existe no território. E a este propósito, consideramos que referir apenas a integração do Entroncamento é uma abordagem muito limitada.

No essencial, e na generalidade, estamos perante uma proposta que corresponde ao entendimento do PCP sobre esta matéria, pelo que manifestamos a nossa disponibilidade para discutir e contribuir, em sede de especialidade, para uma solução eficaz em termos de articulado.

 

 

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