Intervenção de Miguel Tiago na Assembleia de República

Terminal de contentores de Alcântara

Determina o carácter público da gestão do terminal de contentores de Alcântara Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: Já começa a disputa entre o PSD e o CDS para ver quem é que, desta vez, «faz a perninha» ao Governo. Desta vez, calhou ao CDS, mas o PSD também já teve oportunidade de fazer o seu jeitinho. Agora, tivemos oportunidade de assistir, algo divertidos, a este confronto para ver quem é que, desta vez, faz o jeito. Vou apenas ler duas ou três linhas da exposição de motivos do projecto de lei do PCP (projecto de lei n.º 70/XI/1.ª),(http://www.parlamento.pt/ActividadeParlamentar/Paginas/DetalheIniciativa...) porque julgo serem ilustrativas: «O Governo, em comunicado difundido pelo Ministério das Obras Públicas, Transporte e Comunicações a 7 de Outubro de 2008, procurava justificar o processo com a suposta ‘saturação iminente’ do terminal de contentores de Alcântara e com a suposta urgência de ‘aumentar a capacidade de resposta do País à crescente procura de transporte marítimo’. No entanto, no mesmo parágrafo desse comunicado, afirma o Governo que ‘já após o anúncio das obras de alargamento, o Porto de Lisboa e a empresa concessionária conseguiram captar para Lisboa, em detrimento dos portos espanhóis, uma nova linha regular de contentores (..)’, o que só poderia ter um de três significados: a) o terminal não estava em saturação iminente e podia captar novas linhas regulares de contentores; b) a nova linha regular de contentores é anunciada agora para entrar em funcionamento em 2014; c) a saturação iminente foi pura e simplesmente resolvida por um anúncio (…)» de alargamento do terminal. O mais provável, de facto, é que a primeira hipótese fosse a verificada. Estamos perante um contrato firmado sem lugar sequer a concurso público. É curioso que o CDS tenha proposto, na passada legislatura, a revogação do decreto-lei que consubstancia esse contrato; é curioso que, na passada legislatura, julgando pelas palavras do Sr. Deputado Pedro Mota Soares, não se preocupasse com os contribuintes portugueses. Mas é curioso, Sr.as e Srs. Deputados do CDS, que esta inversão traduza algo mais que ainda está difuso e que ainda não é possível perceber (pelo menos, por parte da nossa bancada). Como é que o CDS sabe que a suspensão e a renegociação do contrato não darão lugar a pedido de indemnização? Como é que o CDS sabe, com quem conversou o CDS, que negociações terá feito por trás das paredes desta Assembleia para saber que, desde que se mantenha a Liscont e a Mota-Engil no processo e no negócio, não há lugar a pedido de indemnização? É porque essa é uma dúvida que necessariamente se coloca. Ora, a Liscont tanto poderá requerer um processo para obtenção de indemnização perante a revogação do contrato como para uma obrigatória renegociação dos seus termos, Srs. Deputados. Portanto, há aqui uma nebulosa que nos leva a crer que o CDS teve alguma conversa com estes agentes — e, muito provavelmente, com os outros envolvidos e interessados na matéria (PS, Governo e talvez a empresa concessionária) — para ter a certeza de que não haverá assim qualquer hostilidade. Mas, Srs. Deputados, «cai por terra» a necessidade, pelo menos, do concurso público. O PCP vai mais longe e propõe, inclusivamente, o regresso à esfera da gestão pública das infra-estruturas portuárias. Temos a concepção de que a estrutura e a infra-estrutura portuária nacional devem ser colocadas ao serviço dos interesses nacionais e da soberania nacional e não ao serviço do lucro desta ou daquela empresa. E, mais, temos a percepção e a concepção de que essa é também a única forma de salvaguardar os interesses nacionais e os interesses dos trabalhadores que laboram nestas infra-estruturas portuárias. Esta é uma diferença substantiva entre o projecto de lei do PCP e os restantes, porque, de facto, propomos que, quando cesse o actual contrato, a concessão deixe de ser atribuída a uma empresa privada. Não nos oporemos, porém, a revogar só e ficar apenas pela revogação. Mas há esta orientação muito clara por parte do PCP de que os problemas só serão resolvidos quando rompermos com esta linha de privatização e concessão de infra-estruturas que são fundamentais para a soberania nacional. Infelizmente, os outros partidos não têm esta perspectiva e, ainda mais infelizmente, o CDS conseguiu dar aqui uma reviravolta para fazer o jeito ao Governo e não pôr em causa o negócio, mas «caiu por terra» a vossa indignação para com a ausência de um concurso público, porque é isso mesmo que cai.

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