Intervenção de Paulo Sá na Assembleia de República

"Os tempos que vivemos não são tempos de resignação, são tempos de luta para demitir este Governo"

Procede à primeira alteração à Lei n.º 83-C/2013, de 31 de dezembro (Orçamento do Estado para 2014)
(proposta de lei n.º 193/XII/3.ª)

Sr. Presidente,
Srs. Deputados, Sr.ª Ministra das Finanças, ao nono dia da execução do Orçamento do Estado, o Conselho de Ministros aprovou o primeiro Orçamento retificativo. Ao nono dia, Sr.ª Ministra! Será difícil, no futuro, um governo, qualquer governo, fazer pior! E a responsabilidade desta situação é exclusivamente do Governo, que insiste em governar à margem da lei contra a Constituição da República Portuguesa.
Com este Orçamento retificativo, o Governo ataca mais uma vez, pela enésima vez, os reformados, os pensionistas e os trabalhadores da Administração Pública com o objetivo de lhes retirar 700 milhões de euros.
As questões que se levantam são as seguintes, Sr.ª Ministra: por que razão as vítimas são sempre as mesmas? Por que razão não considerou o Governo outras medidas dirigidas aos grandes grupos económicos e financeiros? Por que razão o Governo não reduz a despesa com os juros da dívida pública, renegociando essa dívida? Por que razão o Governo não reduz os encargos com as PPP? Por que razão o Governo não corta os benefícios e isenções fiscais das grandes empresas? Por que razão o Governo não altera a base de incidência da contribuição extraordinária aplicada à banca e ao setor energético? Por que razão o Governo não aumenta a taxa efetiva de IRC para as grandes empresas? Por que razão o Governo não cria uma taxa sobre as transações financeiras? Ou por que razão o Governo não elimina a isenção de IMI para os fundos de investimento imobiliário?
A Sr.ª Ministra nem quer ouvir falar destas medidas. O Governo nem quer ouvir falar destas medidas, porque, para o Governo, os lucros do grande capital nunca são demasiado elevados. Mas se um reformado, ao fim de uma vida de trabalho, depois de ter descontado para a segurança social, tem uma pensão de 1000 €, então, na ótica do Governo, ele é um privilegiado, vive acima das suas possibilidades e há que cortar-lhe a reforma.
É esta a opção do Governo; atacar os rendimentos dos trabalhadores, dos reformados e pensionistas para garantir os lucros e as benesses do grande capital.
Ainda uma questão sobre a ADSE, Sr.ª Ministra.
O Governo justifica este Orçamento retificativo com o Acórdão do Tribunal Constitucional, mas é preciso que a Sr.ª Ministra explique o que é que o aumento da contribuição para a ADSE tem a ver com a famigerada convergência de pensões. Por que é que o aumento da ADSE para os funcionários públicos tem a ver com o Acórdão ou com as pensões? Nada, Sr.ª Ministra! Não tem nada a ver! Mas tem tudo a ver com a política de roubo de pensões, de reformas e também de salários que o Governo e a maioria têm executado.
Por fim, Sr.ª Ministra, mais um pedido de explicações: é necessário que justifique porque e para onde desvia as contribuições dos trabalhadores que deveriam reverter para a ADSE e que vão ter outro destino. Qual é esse destino, Sr.ª Ministra?
(…)
Sr. Presidente,
Srs. Deputados,
Srs. Membros do Governo:
A cada Orçamento do Estado o Governo tenta ir mais longe na sua opção ideológica de atacar quem vive do seu trabalho. Neste Orçamento do Estado retificativo, as vítimas são as mesmas de sempre: os reformados, os pensionistas e os trabalhadores. Através do alargamento da base de incidência da contribuição extraordinária de solidariedade e do aumento da taxa de contribuição dos beneficiários da ADSE, o Governo quer, mais uma vez, tirar a quem menos tem para poder continuar a garantir os lucros, as rendas e os privilégios do grande capital.
Um Governo que há apenas umas semanas optou, através de uma reforma do IRC, por reduzir de forma acentuada os impostos pagos pelas grandes empresas quer agora impor mais sacrifícios aos reformados, aos pensionistas e aos trabalhadores.
Perante isto, pergunta-se: se há condições para aliviar o grande capital do pagamento de centenas de milhões de euros de impostos nos próximos anos, por que motivo não há condições para repor as pensões a quem trabalhou uma vida inteira, fez os seus descontos e tinha agora a legítima expetativa e o direito de receber a sua reforma por inteiro?
Por que razão não corta o Governo nas parcerias público-privadas, que este ano absorverão 12 vezes mais do que aquilo que o Governo quer arrecadar com o aumento dos descontos para a ADSE?
A resposta a estas perguntas é simples: este Governo, esta maioria, a troica têm como opção ideológica uma política ao serviço dos interesses do capital financeiro e dos grupos económicos, à custa da espoliação dos direitos e rendimentos dos trabalhadores, do aumento da exploração e do empobrecimento generalizado. A fartura de poucos à custa de miséria de muitos, é esta a política do Governo!
Sr. Presidente, Srs. Deputados, Srs. Membros do Governo: Como compatibilizar este Orçamento retificativo de saque dos rendimentos dos reformados, pensionistas e trabalhadores com o discurso governamental e da maioria PSD/CDS dos sinais positivos.
Não há compatibilização possível!
O Governo constrói a sua propaganda dos sinais positivos por cima do roubo dos salários e das pensões, constrói a sua propaganda em cima da miséria e da desgraça de um número cada vez maior de portugueses.
O Governo e a maioria PSD/CDS sabem que o programa político que pretendem executar, se confessado em toda a sua crueza, enfrentaria uma oposição determinada por parte dos trabalhadores e do povo. E, por isso, recorrem à mistificação e a falsidades para tentarem ocultar as suas opções de classe, desmotivar a luta e promover a resignação e o conformismo.
Afirmam que as medidas que o Governo tem vindo a impor aos portugueses — como aquelas contidas no Orçamento retificativo — são sacrifícios transitórios que permitirão, no futuro, a melhoria das condições de vida dos portugueses. Mas esse futuro está sempre a ser adiado e as medidas transitórias vão-se tornado cada vez mais definitivas,
À conversa fiada do Governo e da maioria sobre um futuro melhor — ali, ao virar da esquina, mas sempre adiado — contrapomos a dura realidade vivida pelos portugueses: o alastramento da pobreza e da miséria, a perda de direitos laborais, o retrocesso social, o desemprego e a precariedade, a degradação do Serviço Nacional de Saúde e da escola pública, a falência de milhares de micro e pequenas empresas, a emigração em massa. Não há propaganda do Governo que consiga esconder esta realidade.
As medidas incluídas pelo Governo no Orçamento retificativo não são um sacrifício necessário para a construção de um futuro melhor para Portugal e para os portugueses; são mais um elemento de uma política que tira a quem vive do seu trabalho para dar a quem vive à custa da exploração do trabalho alheio.
Com esta política, aos trabalhadores e ao povo estão reservados infindáveis sacrifícios, destinados a garantir que os grandes grupos económicos e financeiros possam continuar a apropriar-se de parcelas crescentes da riqueza nacional.
Em alternativa a esta política de desastre nacional, o PCP propõe uma política patriótica e de esquerda, que aposte na valorização do trabalho e dos trabalhadores, que devolva os salários e as pensões indevidamente confiscados por este Governo, que proceda à renegociação da dívida nos prazos, juros e montantes, que defenda os setores produtivos e a produção nacional e que reforce as funções sociais do Estado.
Os tempos que vivemos não são tempos de resignação e conformismo; são tempos de luta, de luta intensa, para demitir este Governo, derrotar esta política e abrir caminho à construção de uma política alternativa, patriótica e de esquerda.

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