Projecto de Resolução

Temporal ocorrido na Região Oeste

 

Realização de auditorias sobre as interrupções no abastecimento de energia eléctrica decorrentes do temporal ocorrido na Região Oeste no dia 23 de Dezembro de 2009 e ressarcimento dos prejuízos verificados

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1.No passado dia 23 de Dezembro de 2009 ocorreu um temporal, com chuvas e ventos de grande intensidade, provocando a destruição generalizada de diversos elementos das redes de transporte e distribuição de energia eléctrica em alta e baixa tensão de energia eléctrica na Região do Oeste (concelhos de Torres Vedras, Lourinhã, Cadaval e Alenquer), e a consequente interrupção do abastecimento, que se manteve nalguns casos até aos dias 28 e 29 de Dezembro. Os prejuízos decorrentes dessas interrupções prolongadas no abastecimento de energia eléctrica a empresas, nomeadamente no sector agrícola, e outros utentes são avaliados em milhões de euros. Prejuízos que se somam aos da EDP, proprietária e responsável pelo abastecimento da energia eléctrica, decorrentes da danificação dos equipamentos, custos das operações de intervenção e reposição das redes e a muitos outros prejuízos materiais;

2.Face à grave situação criada aos cidadãos, empresas e muitos serviços públicos, foram emitidas opiniões muito diversas e contraditórias, que se podem sintetizar em 4 planos:

(i) O estado de manutenção das infraestruturas do abastecimento de energia eléctrica, referindo-se a insuficiência dos investimentos de modernização dos equipamentos e das operações de conservação realizados nos últimos anos, que determinaram a fragilidade e vulnerabilidade das redes e equipamento, "facilitando" a acção com que o temporal as tornou inoperativas;

(ii) O não accionamento pela EDP das medidas de prevenção recomendadas e necessárias face ao "Alerta Laranja" decretado pela Autoridade Nacional de Protecção Civil;

(ii) O atraso na resposta da empresa, EDP, à reposição das condições de funcionamento das redes, por insuficiente mobilização de meios ou disponibilidade de capacidade de assistência e reparação em situações excepcionais como a verificada, levando ao prolongamento excessivo das interrupções no abastecimento, durante muitas horas e dias;

(iii) A responsabilidade pelo ressarcimento dos prejuízos verificados, intrinsecamente ligados às questões anteriores, pretendendo a EDP afastar liminarmente qualquer possibilidade de assumir esses encargos.

3.A situação que acorreu na zona Oeste, e as suas consequências no abastecimento de energia eléctrica, tornou ainda mais evidente, se tal era necessário, a essencialidade desse bem para as sociedades actuais. Não sabemos nem podemos viver sem energia eléctrica!

Cuidar e garantir que o abastecimento desse bem essencial se processará em continuidade e condições de fiabilidade e de acesso físico e económico adequados e de forma universal, é certamente uma incumbência central de qualquer Estado, o que implica:

-a existência de centros produtores e redes permanentemente capacitados e dimensionados para um consumo em crescendo,

-uma capacidade de resposta adequada, para fazer face a situações excepcionais, como rupturas/destruições das infraestruturas de produção/transporte/distribuição de energia eléctrica, decorrentes de calamidades naturais e outras, repondo o abastecimento no "tempo razoável".

Os problemas verificados no Oeste são assim uma boa oportunidade para o país e Estado português avaliar das condições de segurança e fiabilidade em que se está a processar o abastecimento de energia eléctrica em Portugal, com o escrutínio e apuramento do estado das redes, da prontidão da resposta das empresas responsáveis e simultaneamente clarificar as responsabilidades civis dos prejuízos ocorridos nessas circunstâncias.

Face às considerações acima reportadas, nos termos da alínea b) do artigo 156.º da Constituição da República Portuguesa e da alínea b) do n.º 1 do artigo 4.º do Regimento, a Assembleia da República recomenda ao Governo, que através dos Ministérios e Secretarias de Estado com tutela sobre ao problemas referidos, nomeadamente, o Ministério da Economia, da Inovação e Desenvolvimento, o Ministério das Finanças e a Secretaria de Estado da Administração Local/Presidência do Conselho de Ministros, tome as iniciativas necessárias à realização de uma Auditoria sobre os problemas do abastecimento de energia eléctrica na Região do Oeste decorrentes do temporal verificado no dia 23 de Dezembro de 2009, que deve estar concluída no prazo de 90 dias a partir da data da publicação do Despacho e que nomeie Comissão para o efeito, que deve ter em conta as seguintes referências:

1.A Comissão nomeada, para além dos representantes dos ministérios deve contar na sua composição com representantes de Faculdades e Escolas de Engenharia, Ordem dos Engenheiros, Associação Nacional dos Engenheiros Técnicos, Associação Portuguesa de Técnicos de Segurança e Protecção Civil (AsproCivil) Associação Nacional dos Municípios Portugueses (ANMP), Associação Portuguesa para a Defesa dos Consumidores (DECO), Autoridade Nacional de Protecção Civil, Instituto de Meteorologia, Instituto de Seguros de Portugal;

2.A Comissão deve proceder a uma larga audição de entidades e instituições, públicas e privadas, das zonas mais atingidas, nomeadamente, câmaras municipais e juntas de freguesia, associações empresariais, profissionais e sindicais das empresas envolvidas na distribuição e trabalhos de conservação e reparação e a Entidade Reguladora dos serviços Energéticos (ERSE);

3.A Comissão deve responder, entre outras às seguintes ordens de questões:

(i) O estado das redes e outras infraestruturas do abastecimento de energia eléctrica antes do acidente climatérico, a avaliação do nível quantitativo e qualitativo dos trabalhos de conservação e reparação, as equipas e os recursos humanos e materiais da EDP dedicados a essas funções, os investimentos realizados nos últimos 5 anos, apurando as responsabilidades desse "estado" na dimensão e gravidade dos danos ocorridos; deve ser avaliada em concreto:

- a capacidade da área de conservação e reparação de avarias da EDP Distribuição na prestação de serviços essenciais 24 horas por dia, nomeadamente dos piquetes, equipas de manutenção e de despachos de média e baixa tensão (hoje a funcionar com 1 turno em vez dos 2 anteriormente existentes);

-o quadro da contratação de empresas prestadoras de serviços, que após a privatização da empresa foram substituindo num processo de "externalização" de serviços, as equipas de trabalhadores da própria EDP, em muitas daquelas funções de manutenção e reparação; as condições técnicas e profissionais dessas empresas para a prestação dos serviços contratados pela EDP;

(ii) As razões do não accionamento das medidas de prevenção pela EDP, caso tal se tenha verificado, previstos pelos procedimentos regulamentares, face ao "Alerta Laranja" decretado pela Autoridade Nacional de Protecção Civil;

(iii) As condições em que se processou a resposta da EDP na reposição do funcionamento das redes, avaliação do tempo de resposta e a sua conformidade com as actuais exigências regulamentares, meios mobilizados, apurando da razoabilidade ou não dessas condições face à situação excepcional verificada, com a possível indicação de recomendações a ter em conta prevenindo situações semelhantes;

(iv) O problema das responsabilidades civis, se existirem, no ressarcimento dos prejuízos privados e públicos decorrentes do acidente, apurando da desactualização ou não do actual quadro legal, da capacidade/incapacidade dos actuais sistemas de seguros, com possível indicação de recomendações. Em particular devem ser avaliados os actuais indicadores de qualidade do serviço (regulamentos dos operadores de distribuição de electricidade), com as correspondentes propostas de alteração julgadas necessárias e o quadro legal das actuais concessões protocoladas entre os municípios e a EDP para a distribuição em baixa;

(v) A correlação entre a actual gestão económica e financeira da EDP e as correspondentes opções estratégicas numa lógica de empresa privada, e as suas obrigações de prestação do serviço público essencial que é o abastecimento de energia eléctrica ao País. 

4. O Relatório com as suas conclusões e recomendações, além da sua utilização pelo Governo para os fins convenientes, deverá ser enviado à Assembleia da República que o analisará nas comissões parlamentares competentes e tomará as iniciativas julgadas adequadas.  

Assembleia da República, em 20 de Janeiro de 2010

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