Sobre a situação no acesso à habitação

A situação no acesso à habitação e as propostas do PCP
Declaração de Vasco Cardoso, da Comissão Política

O direito à habitação, consagrado no artigo 65.º da Constituição da República Portuguesa, contrasta frontalmente com as políticas prosseguidas e com a actual situação que se verifica no País: mais de 325 000 fogos em avançado estado de degradação; mais de 544 000 casas abandonadas; centenas de milhares de famílias submetidas a condições de habitabilidade degradadas; mais de meio milhão de casas que não dispõem de condições básicas - canalização, electricidade, esgotos ou, sequer, instalações sanitárias, isto a par, de um milhão e quatrocentas mil famílias com empréstimos  à habitação.

Os baixos salários, o desemprego, a precariedade, são factores que condicionam cada vez mais o cumprimento do direito à habitação e reveladores de uma política cada vez mais injusta que atinge de forma dramática os trabalhadores e a juventude.

Ao contrário do que o Governo procura difundir, uma análise breve das suas políticas revela uma ausência total de medidas estruturais na área da habitação, seja na garantia das condições de habitabilidade, seja no apoio à juventude, seja no auxílio a quem está sufocado com a dívida à banca, seja na garantia de alojamento para um conjunto de portugueses que continua a viver sem tecto ou em bairros ilegais. A política do governo tem sido a de beneficiar directa ou indirectamente os especuladores imobiliários, as grandes empresas de construção civil e a banca.

A especulação imobiliária e a sobreposição total dos interesses privados aos interesses públicos têm conduzido o País a uma situação de pura irracionalidade, sacralizando o mercado e empurrando milhares e milhares de pessoas para as coroas periféricas das áreas urbanas, degradando a qualidade de vida e ambiental, enquanto despovoa e desertifica os centros urbanos, colocando-os à mercê da especulação imobiliária. Ao mesmo tempo, a política de construção a custos controlados de habitação social e o apoio à autoconstrução e ao arrendamento são elementos meramente residuais perante as necessidades.

Importa deixar claro também, que foi com a política de direita, protagonizada pelo PSD e PS, que no plano da habitação se empurraram milhares de portugueses para a aquisição de habitação própria, levando a que hoje um milhão e quatrocentas mil famílias tenham um empréstimo à banca.

A ausência de uma política pública de habitação, o favorecimento da especulação imobiliária, a política facilitadora de crédito (num quadro em que ao longo de anos assistimos à desvalorização dos salários), a estratégia de marketing agressivo por parte da banca, o desaparecimento de mecanismos dinamizadores do arrendamento, como foi ocaso do recentemente destruído Incentivo ao Arrendamento Jovem, traduziram-se no aumento significativo de empréstimos contraídos para a aquisição de casa própria, e no agravamento das condições de vida de quem ficou sujeito às inaceitáveis imposições da banca.
Uma situação que, em particular para as cerca de 900.000 famílias situadas entre os 20 e os 40 anos, assume, a cada dia que passa, uma maior gravidade. É precisamente nestes escalões etários que mais de 56% das famílias têm hoje empréstimos à habitação, com custos que representam mais de 30% do seu rendimento disponível.

Sabemos bem que a concessão de crédito pelos bancos não se orienta pelas necessidades de desenvolvimento do país, ou pela elevação das condições de vida da população, mas sim com o estrito objectivo de alcançar lucros e reduzir os riscos do crédito. Lucros da banca que subiram sempre dois dígitos nos últimos anos, ao mesmo tempo que os salários reais diminuíram, como confirmou recentemente a OCDE ao revelar que em 2006, os salários em Portugal decresceram mais do que em qualquer outro país, ou seja, 2,6%.
Lucros sempre protegidos pela política do Banco Central Europeu que ainda recentemente decidiu uma nova subida das taxas de juro, a nona em pouco mais de dois anos, perante o silêncio cúmplice da parte do Governo PS, que nada diz perante o facto de, neste período, assistirmos ao agravamento de 50, 100 e até 150 euros na prestação mensal ao banco para pagamento dos empréstimos à habitação para centenas de milhar de famílias.

Dêem as voltas que derem há um gravíssimo problema hoje em Portugal com as dívidas à banca para a aquisição de casa própria e o governo, perante esse situação, ou está do lado dos trabalhadores, dos jovens e das populações, ou está do lado dos bancos.

O PCP não pode deixar de insistir e a bater-se por propostas que, no imediato, atenuem e aliviem o enorme peso das dificuldades e dos encargos que de forma abrupta passaram a pender sobre os trabalhadores e a população, em particular dos mais jovens, propostas integradas numa necessária ruptura com a política de direita, cada vez mais urgente, cada vez mais necessária. Propostas que, tal como as 7 medidas propusemos durante o mês de Junho, sejam efectivamente de emergência para acudir à situação excepcional que a população enfrenta, e que, de forma integrada, respondam aos seus problemas e não tímidas medidas avulsas, como aquelas que o primeiro-ministro recentemente esboçou.

O PCP considera que o Estado deve intervir através da Caixa Geral de Depósitos, enquanto banco público, para influenciar o mercado e fazer baixar o valor das taxas de juro que estão hoje a ser pagas nos empréstimos à habitação. Ou seja, definir como limite superior para os empréstimos de Crédito à Habitação Própria, uma taxa de juro efectiva máxima no valor da Euribor a 6 meses acrescida de um spread de 0,5 pontos percentuais. Esta medida, por si só, significaria a título de exemplo para um empréstimo de 100.000 euros pagos a 30 anos, uma poupança mensal de 102 euros e uma poupança no custo final do empréstimo de cerca de 37.000 euros. Proposta que não é contraditória com a necessidade de implementar uma verdadeira política de arrendamento, com incentivos nomeadamente ao arrendamento jovem.

O Governo PS ao substituir o anterior  Incentivo ao Arrendamento Jovem pelo actual Porta 65, invocando deficiências e oportunismos na sua utilização, diminuiu o seu financiamento e reduziu para menos de um quarto o número de beneficiários, tornando ainda mais supletivo este apoio aos jovens que pretendem alugar casa.

Para o PCP, o apoio ao arrendamento é um direito da juventude, não é uma benesse que o Governo lhes deu! Nesse sentido, propomos o imediato alargamento dos critérios e dos meios dos incentivos ao arrendamento jovem, bem como, o seu prolongamento aos jovens até 35 anos e comprometemo-nos a apresentar na próxima sessão legislativa uma proposta que venha a redefinir e a alargar significativamente os instrumentos que promovam o arrendamento jovem.

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