Sobre as propostas da nova lei dos partidos e do financiamento dos partidos - Declação de Vitor Dias

Sobre as propostas do PSD, do CDS/PP e do PS da nova lei dos partidos e do financiamento dos partidos
Declaração de Vítor Dias, da Comissão Política do PCP

 

Na sua reunião de 3 de Fevereiro, a Comissão Política do PCP examinou o conteúdo dos projectos de lei apresentados pelo PS, pelo PSD e pelo CDS-PP sobre financiamento dos partidos e sobre uma nova lei dos partidos e entende tornar pública uma veemente e frontal oposição do PCP a estes projectos, empreender uma vigorosa denúncia pública das concepções que os inspiram e alertar para que a sua aprovação representaria um intolerável retrocesso de caracter profundamente antidemocrático.

Desde logo, o PCP considera oportuno lembrar que a apresentação destes projectos se verificou no quadro de uma lamentável e condenável convergência entre a maioria governamental e o PS em torno da urgente colocação na agenda política de uma suposta «reforma do sistema político», o que serve manifestamente as conveniências governamentais de desviar as atenções de problemas efectivamente cruciais do país e sobretudo das devastadoras consequências sociais e económicas da sua política.

O PCP sublinha também que quer pela prioridade que em conjunto resolveram conceder a estes temas quer pela forma insensata e demagógica como os vêm abordando, PSD, CDS e PS, julgando porventura que lhes respondem, acabam por dar alimento às erradas e equivocadas correntes de opinião que tendem a apresentar «os partidos» (isto é, todos os partidos) se não como associações de malfeitores pelo menos como os principais responsáveis dos piores vícios e defeitos da vida nacional.

O PCP salienta que todos os projectos já apresentados pelo PS, PSD e CDS têm em comum o propósito de impor seja inaceitáveis limitações à actividade de outros partidos por via de uma nova lei de financiamento seja inadmissíveis ingerências estatais nas formas de funcionamento e organização internas de partidos através de uma nova lei dos partidos.

E têm sobretudo em comum concepções que em absoluto desrespeitam e espezinham a natureza dos partidos enquanto associações voluntárias de homens e mulheres unidos em torno de ideais e de um projecto político e que, de forma descarada e chocante, pretendem converter os partidos em sucedâneos de departamentos, repartições ou organismos estatais.

No que respeita aos projectos do CDS-PP (apoiado pelo PSD) e do PS sobre financiamento dos partidos, o PCP adverte que, descontadas as doses maciças de retórica, os seus grandes e capitais objectivos são:

- aumentar significativamente as subvenções do Estado aos partidos e às suas campanhas eleitorais que é particularmente favorável a partidos como o PSD e o PS que sempre ficam com a parte de leão e em cujas receitas globais a subvenção estatal já hoje tem um grande peso;

- criar excessivas limitações e absurdas dificuldades à obtenção pelos partidos de receitas próprias (designadamente na área das iniciativas de angariação de fundos), criando uma situação extremamente desfavorável a partidos, como o PCP, que vivem predominantemente de receitas próprias que são fruto de uma generosa e esforçada actividade militante.

O PCP considera ainda indispensável sublinhar que nem o PS, nem o PSD, nem o CDS-PP têm qualquer autoridade ou percurso que lhes permita apresentarem-se agora como campeões da transparência em matéria de financiamento dos partidos.

Com efeito, é de recordar que só em 1999 o PS e o PSD concordaram finalmente com a repetida proposta do PCP de proibir o financiamento dos partidos por empresas. É de recordar que nos Acórdãos do Tribunal Constitucional sobre as contas anuais dos partidos, PS, PSD e CDS-PP são os partidos que mais observações críticas recebem sobre deficiências e irregularidades. E é sobretudo de recordar que, passados oito anos sobre a formulação dessa exigência legal, PS, PSD e CDS-PP continuam a não apresentar contas consolidadas (isto é, respeitantes a todas as suas estruturas e não apenas à actividade central), incumprindo assim reiteradamente num ponto que o TC sempre tem considerado «essencial e estruturante» para a transparência e fiscalização das contas e que o PCP sempre tem cumprido.

O PCP anuncia que, no quadro do seu combate político aos projectos já apresentados, apresentará em breve um projecto-lei sobre financiamento dos partidos que, procedendo a melhorias pontuais na lei em vigor, visará sobretudo diminuir os limites máximos das despesas eleitorais em cada eleição que estão em vigor, assim enfrentando, ao contrário do PS, do PSD e do CDS-PP, o problema crucial do despesismo eleitoral.

Tornada clara a sua firme oposição ao aumento das subvenções estatais aos partidos, o PCP anuncia também que tudo fará para que, em termos de opinião pública, PSD, CDS-PP e PS paguem um alto preço por esta sua opção feita numa conjuntura em que se avolumam as dificuldades da população e em que PSD e CDS tanto invocam as dificuldades orçamentais.

Por fim, mas como a questão mais importante e de mais sérias consequências, o PCP chama a atenção para a excepcional gravidade dos projectos coincidentes apresentados pelo PSD (apoiado pelo CDS-PP) e pelo PS com vista a uma nova lei dos partidos e que, ao pretenderem impor por via legal um modelo único de funcionamento e organização internos para todos os partidos, representam uma insolente tentativa de subversão e esmagamento de princípios e concepções democráticas justamente protegidos pela ordem jurídica pós-25 de Abril.

O PCP sublinha que, a par de intoleráveis ingerências e imposições, basta considerar a proposta do PSD para que os partidos depositem os seus ficheiros de militantes no Tribunal Constitucional ou as propostas do PS e do PSD para que os Estatutos dos partidos sejam sujeitos à aprovação do mesmo Tribunal, para se concluir que os partidos proponentes não só não têm memória histórica sobre procedimentos similares como se atrevem a querer impor um tipo de detalhada regulação legal da vida interna dos partidos que não existe em países europeus que têm quase sessenta anos de continuada vida democrática.

10. Não há outra forma de colocar a questão : PSD, CDS-PP e PS querem impor por lei a outros partidos as suas próprias concepções sobre matérias em relação às quais, em termos democráticos, a decisão só pode pertencer à opinião e vontade dos membros desses partidos.

As formas de funcionamento e organização interna de cada partido podem ser objecto de debate ou de crítica política mas não podem ser objecto de uma formatação legal que violente e agrida a opinião e vontade dos membros de cada partido.

O PCP que considera reger-se – como dispõe o art.º 51º da Constituição – «pelos princípios da transparência, da organização e da gestão democráticas e da participação de todos os seus membros», jamais se atreveria a apresentar um projecto de lei dos partidos para impor ao PSD, ao CDS ou ao PS alterações em aspectos do seu funcionamento que porventura considere de discutível ou insuficiente democraticidade.

O PCP é um partido que deu, como nenhum outro, uma valiosa contribuição para a conquista da liberdade e é um partido fundador do regime democrático-constitucional. Tem um longo e honroso passado de insubmissão perante todas as formas de domesticação, ingerências e pressões externas que contra ele foram tentadas.

É seguro e certo que, com activo empenhamento dos seus militantes e apoiantes, dará um firme combate às intoleráveis e antidemocráticas imposições e ingerências contidas nos projectos do PSD e do PS e que plenamente justificam a emergência de um movimento de opinião que, fazendo o PS e o PSD recuarem, poupe a vida democrática do país a uma situação de grave confronto político.

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