Sobre o controlo de tráfego aéreo

 

 

 

Transposição para a ordem jurídica interna da Directiva 2006/23/CE, do Parlamento Europeu e do Conselho, de 5 de Abril de 2006, relativa à licença comunitária de controlador de tráfego aéreo

Intervenção de Bruno Dias na AR

 

 

Senhor Presidente,

Senhoras e senhores Deputados,

Senhores membros do Governo,

Antes de mais, importa assinalar que esta directiva (proposta de lei n.º 198/X) se integra directamente na estratégia do chamado "Céu Único Europeu". Trata-se de uma orientação política da União Europeia para a integração do controlo do tráfego aéreo ao nível comunitário, que merece a firme oposição do PCP - justamente porque está em causa a gestão do espaço aéreo do nosso país, componente inalienável da soberania nacional.

Sejamos claros: o que a Comissão Europeia pretende a todo o custo (e os Governos apoiam fervorosamente) é a liberalização e a posterior privatização desta actividade.

E este instrumento da "licença comunitária de controlador de tráfego aéreo" não passa disso mesmo: um instrumento, uma peça integrante dessa estratégia iníqua e perigosa. E a este propósito, é particularmente preocupante que o Governo mantenha o silêncio sobre a questão central do controlo de tráfego aéreo no Novo Aeroporto de Lisboa - e a quem será atribuída essa actividade.

Em segundo lugar, coloca-se a questão do processo legislativo e da participação das entidades com intervenção nesta matéria. O Governo indica no preâmbulo da Proposta de Lei que foram ouvidas as associações sindicais e de operadores do sector e a Comissão Nacional de Protecção de Dados, mas não faz acompanhar a sua iniciativa de quaisquer estudos, documentos ou pareceres que a tenham fundamentado, não cumprindo assim o previsto no n.º 3 do artigo 124.º do Regimento da Assembleia da República.

Por outro lado, o próprio preâmbulo desta Proposta refere um processo de apreciação pública - e inclusive a publicação do diploma em separata do Diário da Assembleia da República - que pura e simplesmente nunca aconteceu!

O PCP suscitou na Comissão Parlamentar de Trabalho esta questão, e pronunciou-se pela necessidade de ouvir estas organizações sindicais e associativas. E se até agora tal não aconteceu, então pelo menos em sede de especialidade isso terá de acontecer.

Em terceiro lugar, não podemos ignorar um aspecto preocupante, que aliás já hoje salta à vista no sector do transporte aéreo em Portugal (e que a Audição promovida pelo Grupo Parlamentar do PCP no passado dia 24 de Junho veio confirmar): é o regime difuso e pouco claro (para não dizer pior) que hoje existe na regulação atribuída ao INAC e nas competências delegadas, formal ou informalmente, a outras entidades ou empresas como é o caso da NAV, EPE. E isso volta a acontecer com esta proposta do Governo .

Veja-se o Artigo 23.º desta proposta, que simplesmente estabelece que o sistema de avaliação de proficiência, necessário para a renovação da licença, é da responsabilidade do "prestador de serviços de navegação aérea" - ou seja, da NAV. O que significa que os controladores de tráfego aéreo são avaliados pela entidade patronal, avaliação essa que pode resultar na impossibilidade do controlador exercer a sua profissão.

Em terceiro lugar, há aqui uma outra questão concreta que não podemos ignorar, e que se prende com o âmbito de aplicação desta Proposta de Lei. A este Grupo Parlamentar - e também a outros nesta Assembleia - chegou um testemunho de alerta e preocupação quanto à possibilidade de, sendo excluídos deste sistema de certificação os controladores de tráfego aéreo portugueses militares, possa dar-se o caso de termos o Estado Português obrigado a reconhecer profissionalmente os controladores militares de outros países (onde essa exclusão não aconteça).

Trata-se de uma matéria que merece reflexão, no seguimento aliás do Parecer elaborado pelo Deputado Nelson Baltazar do Grupo Parlamentar do PS.

Finalmente, também merece reflexão e esclarecimento uma questão que o PCP suscitou desde logo no Parlamento Europeu, aquando do debate do Relatório Schmitt sobre esta Directiva: a abertura da possibilidade de controladores "que exerçam a sua actividade sob a responsabilidade de prestadores de serviços de navegação aérea", não serem seus empregados. Terão um vínculo precário? Serão trabalhadores de uma empresa que trabalham noutra? Sob que condições? Pode um controlador trabalhar sem ser empregado do prestador do serviço de navegação aéreo? Com que consequências?

São aspectos que continuam por esclarecer e que suscitam as maiores preocupações do PCP. Na forma, no conteúdo e até no processo. Estamos pois perante mais uma etapa de um processo particularmente gravoso para o interesse nacional e a própria soberania.

Disse.

                                                                                                                                                      

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