Sobre a lei dos partidos<br />Declaração de Bernardino Soares, Presidente

A Comissão de Reforma do Sistema Político terminou hoje ao fim da manhã a concretização da maioria das alterações à Lei dos Partidos, com vista à sua aprovação em Plenário na véspera de mais um aniversário do 25 de Abril. É já possível confirmar que o sentido geral das alterações à Lei dos Partidos, mesmo com as alterações entretanto introduzidas, constitui uma inaceitável agressão, pela via da lei, aos valores fundamentais da liberdade de associação e auto-governo dos partidos, até aqui respeitados como princípios fundamentais da ordem jurídica portuguesa após o 25 de Abril. O PCP reafirma a sua discordância com o sentido destas alterações legislativas, manifestada também por muitos democratas e diversas personalidades da vida nacional, e denuncia com veemência esta imposição de PSD, PS e CDS, de um «modelo único» de funcionamento partidário decalcado das opções próprias destes partidos. A nova lei, que PSD, PS e CDS se preparam para aprovar, continua a desrespeitar o princípio básico do respeito pela vontade soberana dos membros de cada partido e a consagrar ingerências inaceitáveis na vida, na organização e no funcionamento interno dos partidos, designadamente no que respeita a formas de votação e procedimentos eleitorais internos. Para além disso, consagra regras que por um lado tornam mais difícil a livre criação de partidos políticos e que por outro tornam possível a extinção de partidos realmente existentes mas que legitimamente decidam não concorrer a eleições. Entretanto a comissão retomará ainda hoje os seus trabalhos, designadamente para abordar a matéria do financiamento dos partidos e das campanhas eleitorais, em que a maioria e o PS se encaminham para a duplicação das subvenções do Estado, o aumento dos limites fixados para as despesas eleitorais e para a imposição de limitações à angariação de receitas próprias pelos partidos junto dos seus militantes e em iniciativas para isso vocacionadas. Estas «iniciativas especiais de angariação de fundos que envolvam a oferta de bens e serviços», nas quais se inclui a Festa do Avante, estão previstas na actual lei e são bem distintas quer dos donativos das pessoas singulares, quer das «receitas de angariação de fundos» que têm já hoje um limite de 125 mil contos. A limitação da possibilidade de angariação de receitas pelos partidos naquelas iniciativas, que são, no que toca ao PCP, criteriosamente documentadas junto do Tribunal Constitucional, constituiria uma grave afronta à sua livre dinâmica de actividade, nomeadamente no que concerne a um vasto conjunto de iniciativas político-culturais promovidas pelo PCP entre as quais se destaca a já referida Festa do Avante!. Reafirmamos a nossa oposição ao aumento considerável proposto das subvenções estatais aos partidos, que contrasta com as dificuldades com que se confrontam o país e os portugueses e com as sucessivas proclamações do Governo sobre a contenção da despesa pública. Trata-se de uma medida que em nada contribuirá para a dignificação da vida política. Em matéria de financiamento dos partidos e das campanhas eleitorais o que é prioritário é conter o injustificado despesismo eleitoral, diminuindo ainda que moderadamente os limites em vigor – como aliás propomos – e não estimulá-lo ampliando esses limites. Importa também assinalar que este processo se transformou num contra-relógio legislativo nada apropriado à correcta ponderação de matérias tão sensíveis e importantes como as que aqui se abordam. A concretização destas graves alterações legislativas representará um grave retrocesso democrático-constitucional e manchará o 29º aniversário do 25 de Abril, contrariando os seus valores mais profundos.

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