Sobre &#8220;OPERAÇÃO PRIVATIZAÇÃO&#8221; NA SAÚDE<br />Conferência de Imprensa do PCP, com Bernardino Soares

Com a aprovação na generalidade da nova Lei de gestão hospitalar do Governo, estamos perante uma verdadeira “operação privatização” na saúde. A proposta do governo tem como objectivo o avanço da privatização da saúde em Portugal, seja na gestão de hospitais públicos, seja na concessão de serviços ou áreas de prestação directa de cuidados de saúde. É a máxima do “para o privado já e em força”.É aliás um objectivo mal disfarçado. Assim o provam as dificuldades do primeiro-ministro, em recente entrevista televisiva, para justificar a “operação privatização” em curso. Face à demonstração que diversas unidades privadas se encontram em graves condições económicas e financeiras - o que deixa sem sustentação o mito da eficácia da gestão privada na saúde – o Primeiro-ministro mais não soube argumentar do que dizer que nas unidades públicas também havia problemas de gestão. Tais problemas existem de facto; mas nada impede o governo de tentar resolvê-los. Lembre-se aliás que as actuais Lei de Bases da Saúde e Lei de Gestão Hospitalar foram aprovadas pelo PSD e mantidas incólumes pelo PS nos seis anos em que governou.Acabou o primeiro-ministro a justificar-se com a existência na gestão pública de nomeações por critérios diversos do da competência. O Primeiro-ministro e o PSD sabem do que falam. Foi de facto o Governo PSD, em que Durão Barroso era ministro, que instituiu o regime da nomeação governamental para cargos de gestão no Serviço Nacional de Saúde que ainda hoje vigora, e que aplicou vezes sem conta critérios partidários ou afins nas suas nomeações. O ataque aos trabalhadores da saúdeOs trabalhadores da saúde são também alvo desta “operação privatização”. Trata-se de abrir caminho à sua maior precarização, à diminuição dos seus direitos e à menorização das carreiras profissionais. O sector privado não dispensa uma diminuição das garantias e dos direitos destes trabalhadores, que lhe garanta uma maior disponibilidade de profissionais, a mais baixo custo e mais facilmente descartáveis, e sobretudo sem estar sujeito à concorrência do “mau exemplo” de um sector público que os defenda e valorize.Tudo isto vem invariavelmente embrulhado na demagogia de que “primeiro estão os doentes”, tentando criar a ideia de que com a penalização dos trabalhadores da saúde se abrirá caminho a um melhor atendimento das populações. Ao contrário, quanto maior a instabilidade e insegurança dos profissionais, quanto maior a sua incapacidade para resistir a orientações em que as necessidades de saúde sejam sacrificadas perante critérios economicistas, pior serão os serviços prestados aos utentes. A privatização trará prejuízos graves para os cidadãos.Neste quadro assume especial relevância a greve convocada por vários sindicatos do sector da saúde marcada para o próximo dia 19, que desde já saudamos, apelando à participação de todos nesta importante jornada de luta.Por um debate transparenteA aprovação desta lei na generalidade fez-se com escassíssimo debate. Foi debatida menos de uma semana depois de ter sido entregue pelo governo na Assembleia da República, sem que antes disso tivesse o governo, na elaboração da proposta, ouvido os representantes dos trabalhadores e outras entidades representativas do sector. Poucos dias depois foi votada pela maioria de direita, beneficiando ainda de uma abstenção comprometida do PS, que não pôde esconder o seu compromisso com uma política de privatização, a que aliás abriu caminho quando esteve no governo.Na política do governo muito está por esclarecer ou por desvendar.O governo deve pôr todas as cartas na mesa, para que todos os portugueses saibam o que está em causa com a sua proposta. O PCP apresenta oito desafios ao governo: Que aceite discutir regras alternativas dentro do regime público, designadamente a possibilidade de instituir o concurso como regra de escolha de uma gestão que assente na definição e cumprimento fiscalizado de objectivos de actividade;2. Que esclareça o significado da criação de um novo tipo de receitas próprias dos hospitais provenientes do “pagamento dos actos e actividades efectivamente realizados, através de uma classificação de actos médicos, técnicas e serviços de saúde, a consagrar numa tabela de preços de referência”, que pode significar um aumento do pagamento directo pela população dos serviços de saúde, para além das já existentes taxas moderadoras.3. Que demonstre a necessidade, para a gestão dos serviços públicos de saúde, de uma maior precariedade laboral, designadamente tendo em conta as reais e decisivas dificuldades criadas ao longo dos anos a estes serviços pela insuficiente formação de profissionais de saúde e pelo absurdo regime de “congelamento” de vagas nos quadros das instituições deste sector;4. Que promova uma avaliação fundamentada e discutida com os profissionais, as populações e todos os interessados, da experiência de gestão privada do Hospital Amadora-Sintra, antes da renovação do contrato ou da multiplicação deste sistema noutros hospitais, e que o mesmo se faça para as chamadas “experiências inovadoras” do governo anterior; Que aceite divulgar e debater as experiências de outros países, designadamente do Reino Unido, onde manifestamente o caminho que agora se propõe para Portugal se traduziu numa degradação dos cuidados de saúde, em maior desigualdade no acesso a eles, e em maiores gastos públicos, designadamente com o regime de construção e gestão privada; Que divulgue as projecções financeiras dos custos totais (até ao final) do anunciado processo de construção/concessão privada para novos hospitais, designadamente em comparação com os que resultariam da sua construção pelo Estado, mesmo recorrendo a endividamento; Que divulgue os critérios para a entrega de serviços ou departamentos de hospitais públicos a sectores privados, designadamente tendo em conta a tendência conhecida para privatizar o que é menos complexo e portanto com maior potencial lucrativo, deixando para o Estado tudo o que é mais pesado e exigente em riscos ou investimento;8. Que explicite as regras para combater a promiscuidade entre o sector público e o privado, quer a que já hoje existe, quer a que necessariamente tenderá a existir com a entrega de serviços dentro das unidades públicas a interesses privados.A privatização da saúde é desastrosa para os interesses de Portugal e dos portugueses. Pela nossa parte denunciaremos sistematicamente esta “operação privatização” em que se empenha o governo PSD/CDS, ao serviço dos interesses dos grandes grupos económicos, que esperam aumentar os seus lucros à custa da saúde dos portugueses.