Intervenção de

Sistema de vigilância em saúde pública

 

Instituição de um sistema de vigilância em saúde pública, que identifica situações de risco, recolhe, actualiza, analisa e divulga os dados relativos a doenças transmissíveis e outros riscos em saúde pública, bem como prepara planos de contingência face a situações de emergência ou tão graves como de eventual calamidade pública

Sr. Presidente,
Srs. Deputados:

Penso que a matéria abordada nesta proposta de lei (proposta de lei n.º 258/X) é muito importante, sendo preciso ter uma lei de qualidade e tecnicamente ajustada ao objectivo que se prossegue - a saúde pública, a vigilância, o controlo epidemiológico.

Certamente, na especialidade teremos oportunidade de contribuir para melhorias e aperfeiçoamentos destas normas técnicas e para a sua concretização em termos legislativos. Quero dizer que esta lei é a cara do Ministério da Saúde e da sua actual equipa: é uma lei tecnicamente muito perfeitinha, com um discurso técnico muito organizadinho, mas que, depois, confronta com a realidade. Tem este «pequeno? problema: confronta-se com a realidade!!

A Sr.ª Deputada Maria Antónia Almeida Santos disse agora mesmo, citando alguém, que é importante termos boas leis mas que não há boas leis sem bons aplicadores. O problema é mesmo esse.

É que aqui, Sr. Presidente, Srs. Deputados e Srs. Ministros, faltam os aplicadores. Temos aqui uma organização do sistema de saúde pública e de toda a rede relativa à saúde pública, mas temos na saúde pública uma das especialidades mais causticadas com a falta de formação de profissionais.

Os que existem são bons, são é poucos, Sr.ª Deputada!

Esta é uma das especialidades mais martirizadas com a falta de formação de médicos e, dentro da falta de formação de médicos, com a falta de prioridade a esta especialidade. E isto é responsabilidade de muitos governos nos últimos anos, sejam do PS ou do PSD, com ou sem o CDS.

É preciso dizer também que este Governo já atacou a estrutura que vai aplicar esta lei. A Direcção-Geral da Saúde perdeu - notem bem - 100 funcionários nesta Legislatura. Estes 100 funcionários serão necessários quando, um dia, for preciso pôr em prática aquilo que o Governo agora nos propõe que seja legislado.

Portanto, cá está: uma lei muito arrumadinha, muito organizadinha, faltam é os aplicadores para a pôr em prática.

Quando lemos a proposta de lei e o seu preâmbulo, vemos que se dá uma grande importância, como não podia deixar de ser, à estrutura básica do Serviço Nacional de Saúde - a Rede de Cuidados de Saúde Primários.

Ora, depois começamos a pensar no que se passa na Rede de Cuidados de Saúde Primários e como é que esta vai ser o sustentáculo básico do funcionamento de toda esta rede, quando sabemos que há uma grande dificuldade ao nível da medicina geral e familiar; que há falta de médicos de família; que a política das unidades de saúde familiar (USF) não vai resolver o problema da falta dos médicos de família e que está a ser feita, em muitos sítios, à custa da retirada de profissionais de unidades que estão fora da rede de unidades de saúde familiar, deixando aí carências graves para a população. Já estamos a ver, mais uma vez: uma lei muito organizadinha, faltam é os aplicadores, os instrumentos para a pôr em prática na realidade. E assim podíamos continuar a falar da contradição entre os discursos da Sr.ª Ministra, as propostas de lei sobre saúde pública e a realidade, bem dura, que os portugueses hoje sentem na área da saúde - a realidade da dificuldade no acesso a consultas; a realidade de continuarem a ter listas de espera; a realidade de a saúde estar cada vez mais cara; a realidade de, por exemplo, e se quisermos falar de epidemias e de situações mais agudas e mais críticas, o simples surto normal da gripe, que tivemos há uns meses, ter entupido, em vários sítios do País, os serviços de atendimento às pessoas na Rede de Cuidados de Saúde Primários.

Bem sabemos que isto também acontece por o Governo ter fechado administrativamente um conjunto de serviços de atendimento permanente que, não sendo serviços de urgência - bem sabemos que o não eram -, eram a porta de acesso para muitos milhares de cidadãos quando, numa situação aguda, tinham de ter resposta imediata e não podiam ficar à espera de outro tipo de respostas.

É por isso que num simples surto da gripe, normal e habitual, no último Inverno, tivemos tudo entupido - a Linha Saúde 24, os centros de saúde, os serviços de atendimento permanente, as urgências hospitalares. O que não seria se estivéssemos - espero que não venhamos a estar - com uma epidemia a sério, com necessidade de medidas mais fortes e de uma capacidade de resposta maior!?

Portanto, esta é uma proposta de lei que teremos todo o gosto em discutir na especialidade, sobre a qual não nos move nenhuma oposição de fundo em relação ao que postula, mas que se confronta não com a nossa oposição mas, sim, com a oposição da realidade concreta que existe no Serviço Nacional de Saúde, que é como os discursos da Sr.ª Ministra: aparentemente, muito organizadinho mas, na realidade, sem eficácia, cada vez com menos eficácia, para dar resposta às necessidades das populações.

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