Intervenção

Segredo de Estado - Intervenção de António Filipe na AR

Segredo de Estado

 

 

Sr. Presidente,

Gostaria de fazer uma interpelação à Mesa, tendo em conta o ponto da ordem de trabalhos que vamos iniciar.

Vamos iniciar uma discussão que visa uma alteração à lei do Segredo de Estado, a Lei n.º 6/94, de 7 de Abril, a qual prevê a existência de uma comissão de fiscalização do segredo de Estado, composta por um juiz e por dois Deputados eleitos pela Assembleia da República, um sob proposta do grupo parlamentar do maior partido, que apoia o governo, e outro sob proposta do grupo parlamentar do maior partido da oposição.

Pedia à Mesa que informasse a Assembleia quem são os Deputados que integram esta comissão prevista na Lei n.º 6/94, porque não são do nosso conhecimento.

(...)

Sr. Presidente,

Fiquei esclarecido quanto à composição inicial em 1994. Já não fiquei esclarecido quanto à composição actual, embora eu presuma que seja nenhuma. A menos que a Mesa nos consiga informar.

(...)

Ficámos esclarecidos sobre a primeira composição histórica.

Sr. Deputado Mota Amaral, queria enaltecer a forma séria como encarou este debate e como se dirigiu ao projecto de lei do PCP (projecto de lei n.º 383/X), manifestando, inclusivamente, a sua discordância relativamente a uma questão concreta. No entanto, gostava de lhe colocar uma pergunta relativamente ao seu projecto de lei.

O projecto de lei que aqui nos apresentou (projecto de lei n.º 102/X) e pelo qual se tem vindo a bater há alguns anos, como sabemos, procura resolver um problema, que é o do acesso do Parlamento aos documentos que são classificados, nos termos da Lei do Segredo de Estado, lei de 1994, ou pelo Presidente da República, ou pelo Presidente da Assembleia da República, ou pelo Primeiro-Ministro ou pelos ministros. Segundo nos disse aqui, não há conhecimento de que documentos são esses, se existem documentos classificados - ninguém se queixou acerca disso. Portanto, corre-se o risco de, mesmo com estas alterações, essa lei ser ineficiente.

Pergunto se não considera que o problema se situa não tanto nos documentos classificados ao abrigo da lei de 1994 mas nos documentos que são, por força directa da lei, considerados segredo de Estado e que são precisamente os dos serviços de informações. Não temos conhecimento se existem ou não documentos classificados pelos membros do Governo como segredo de Estado, mas sabemos, de ciência certa, que, nos termos da Lei-Quadro do Sistema de Informações da República Portuguesa, todos os elementos operacionais desses serviços são segredo de Estado, e ponto final.

Pergunto, ainda, se não considera que a forma de resolver o problema do acesso da Assembleia da República ao segredo de Estado tem também de equacionar o acesso da Assembleia a esses documentos que estão classificados como segredo de Estado por força directa da lei; caso contrário, a lei perderá muita da sua eficácia.

É esta a questão sobre a qual gostaria que se pronunciasse.

(...)

Sr. Presidente,

Para pedir esclarecimentos ao Sr. Deputado Vitalino Canas, Sr. Presidente.

Tinha feito sinal de que me queria inscrever no final da intervenção do Sr. Deputado, mas não me consegui fazer entender pela Mesa.

(...)

Tentei usar o telefone, Sr. Presidente, mas o Sr. Deputado Vitalino Canas terminou de imediato a sua intervenção e, portanto, não foi possível estabelecer a comunicação atempadamente com a Mesa. Peço desculpa por isso e agradeço ao Sr. Presidente ter-me dado a palavra.

Sr. Deputado Vitalino Canas, gostaria de lhe pôr duas questões, uma das quais, aliás, já coloquei ao Sr. Deputado Mota Amaral.

Os Srs. Deputados reconhecem que a Comissão para a Fiscalização do Segredo de Estado, que foi criada em 1994, nunca funcionou, mas agora insistem em manter uma comissão que apenas difere da anterior no facto de, na sua composição, não ter um magistrado. A Comissão que foi criada pela lei de 1994 tinha um magistrado judicial e dois Deputados, um indicado pelo maior partido que apoia o Governo e outro pelo maior partido da oposição. Não me venha dizer, Sr. Deputado, que a Comissão não funcionou por causa do magistrado, porque agora querem manter uma comissão que, em termos parlamentares, tem exactamente a mesma composição daquela que foi criada pela lei de 1994.

Portanto, não estou a ver qual é o valor acrescentado desta nova comissão, sendo certo que, para nós, salvo prova em contrário, não foi devido ao magistrado judicial que a Comissão deixou de funcionar!

A segunda questão que gostaria de colocar-lhe tem que ver com o segredo de Estado que está para além da Lei n.º 6/94, porque já vimos o carácter limitado desta lei relativamente à abrangência do segredo de Estado. Mais significativo do que os documentos que possam ser classificados como segredo de Estado, designadamente por membros do Governo, são os documentos que, por força directa da lei, são considerados como tal.

O mecanismo que prevêem no artigo 4.º do vosso projecto de lei (projecto de lei n.º 473/X) tem que ver com o acesso da Assembleia da República ao segredo de Estado e seria fectivamente um ganho quanto à situação actual, que é «zero».

Nesse sentido, pergunto-lhe, muito concretamente, se este artigo 4.º também é aplicável aos documentos classificados como segredo de Estado, designadamente por se encontrarem na posse dos serviços do Sistema de Informações da República Portuguesa.

(...)
Sr. Presidente,

Pedi a palavra para defender a honra da bancada. Não é costume fazê-lo, mas o Sr. Deputado Nuno Melo disse que se algum Deputado do PCP tivesse acesso a alguma informação que estivesse em segredo de Estado que a divulgaria se isso fosse do seu interesse.

Sr. Presidente,

Queria dizer que isto é ofensivo da nossa honra e consideramos que é um insulto miserável. Consideramos inaceitável que um Deputado nesta Assembleia possa dizer o que disse de outros Deputados na base de um processo de intenções que não tem o mínimo fundamento.

Se o Sr. Deputado Nuno Melo tivesse respeito por esta Assembleia pedia-nos desculpa, a nós e ao conjunto da Assembleia da República!

(...)

Sr. Presidente,

Srs. Deputados,

Tive oportunidade de questionar os Srs. Deputados Mota Amaral e Vitalino Canas acerca de alguns aspectos, para nós relevantes, dos projectos de lei dos respectivos partidos, mas queria deixar uma palavra final em nome da bancada do PCP.

Devo dizer, pois, que entendemos que há que explorar todas as possibilidades de ultrapassar o bloqueio actualmente existente relativamente ao acesso, pela Assembleia da República, a todo e qualquer documento que esteja classificado como segredo de Estado.

Embora afirmando que nenhum dos projectos de lei em apreço vai até onde entendíamos que era razoável que a Assembleia da República tivesse a pretensão de querer ir, se quisesse assumir plenamente as suas responsabilidades constitucionais, entendemos que, no projecto de lei apresentado pelo Sr. Deputado Mota Amaral, há mecanismo proposto que deve ser trabalhado na especialidade, de maneira a encontrar, de facto, uma forma de a Assembleia da República, por alguma via, ter possibilidade de aceder a documentos classificados, obviamente tomando todas as medidas para que a reserva dos mesmos seja mantida.

É que nenhum de nós esteve a discutir aqui a quebra do segredo de Estado. O que sempre temos estado a discutir é a forma de a Assembleia da República ter acesso a essa informação, reservando, obviamente, a sua confidencialidade.

É isso que está em causa, embora, nalguns discursos, não parecesse.

Entendemos, pois, que se deve explorar essa possibilidade de acesso por parte da Assembleia da República, embora consideremos que ambos os projectos de lei são manifestamente insuficientes relativamente a esta matéria.

É óbvio que iremos trabalhar ambos os diplomas na especialidade mas, do nosso ponto de vista, nenhuma das soluções agora propostas é aquela de que carecia a Assembleia da República para poder exercer de facto as suas prerrogativas constitucionais em termos de matéria classificada.

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