Intervenção de Ana Mesquita na Assembleia de República

São necessárias medidas para garantir a segurança de alunos e trabalhadores no ano lectivo 2020/2021

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Senhoras e Senhores Deputados,

Tendo sido anunciado o arranque do próximo ano lectivo para os dias que decorrem entre 14 e 17 de Setembro, importa que sejam tomadas todas as medidas necessárias para garantir a segurança de alunos e trabalhadores, considerando os vários cenários da evolução do surto epidemiológico.

Neste contexto, o despacho normativo de organização do ano lectivo 2020/2021 é determinante para que seja possível proceder às adaptações de forma minimamente atempada, tendo em conta que há alterações que têm mesmo de ser feitas: é o caso de turmas de menor dimensão, para que se garanta distanciamento físico a determinar pelas autoridades de saúde dentro das salas de aula; mais auxiliares, para garantir a segurança, limpeza e higiene; mais técnicos especializados, para um maior acompanhamento e apoio reforçado dos alunos; mais professores e educadores, para que sejam superados os défices de aprendizagens, de conteúdos curriculares não desenvolvidos, de desigualdades agravadas e para evitar os abusos e ilegalidades que o teletrabalho criou e agravou.

Além disso, é forçosa a tomada de medidas por parte do Governo para que o insucesso e o abandono escolar não sejam, no próximo ano lectivo e mesmo nos anos subsequentes, um problema de enormes dimensões. Assim, além do reforço do número de trabalhadores que garantam a segurança e o apoio acrescido aos alunos em termos pedagógicos, é urgente assegurar medidas de carácter socioeconómico aos alunos e às suas famílias, tendo em conta o aumento do desemprego, a perda de rendimentos e o agravamento geral da situação dos trabalhadores. São, por isso, urgentes medidas de reforço da Acção Social Escolar.

O orçamento suplementar pode e deve dar as respostas em falta que ainda não foram garantidas pelo Governo. E não faltam as propostas do PCP para que isso aconteça: demos entrada precisamente de uma proposta para garantir o reforço da contratação de todos os trabalhadores necessários e a abertura imediata dos concursos para integração dos trabalhadores não docentes das várias carreiras e categorias cujo processo do PREVPAP foi já homologado e ainda de uma outra para reforço da Ação Social Escolar no Ensino Público obrigatório, aumentando vários valores de comparticipação.

Falta também fazer um balanço sério e profundo deste período em que foram adotadas soluções à distância. No inquérito dinamizado pela FENPROF, os professores assinalaram que um dos indesejados frutos desta situação foi, cito, “a desigualdade entre os alunos, que se agravou, em alguns casos, perigosamente. Assinalam, como principais razões, a falta de apoios, que, para alguns, são absolutamente indispensáveis e, também, as questões de ordem social que, já tendo contornos graves, se tornaram ainda mais problemáticas, com dois milhões de trabalhadores a ficarem em layoff ou no desemprego.” Os professores referem ainda o desgaste e o enorme cansaço, que decorre de diversos fatores, “que vão da necessidade de adaptação a um modelo inédito de atividade até ao facto de ser bastante mais complicado, estando distante, acompanhar todos os alunos e satisfazer as necessidades educativas específicas de cada um; contribui, ainda, para este desgaste o facto de a atividade profissional ter tomado conta de todas as horas do dia e, ao invadir a casa de cada professor, dificultar a sua indispensável e saudável separação da vida familiar.”

“O ensino não é isto, nem nada que se pareça”. “Por muita tecnologia que exista e se possa utilizar, nada substitui o ensino presencial.”, dizem os professores.

Dizem mais, “Todos os recursos utilizados por mim foram comprados/pagos… por mim: computador, internet e telefone. Nunca ninguém me perguntou se eu queria ou podia utilizar o meu computador e/ou telefone... marcaram as aulas síncronas sem ouvir os professores. Em casas com computadores partilhados é um problema”.

“Onde estão os suplementos para luz, internet, chamadas telefónicas (+ de 10 horas de chamadas de telemóvel para assuntos da escola), impressora...?”.

“O trabalho docente triplicou. Os alunos procuram-nos a toda a hora e todos os dias recebo pedidos de esclarecimentos e trabalhos enviados às 23 ou 24 horas... Deixaram de existir fins de semana e as jornadas de trabalho chegam frequentemente às 12 e 14 horas/ dia.”

“O horário de trabalho dos professores está a ser significativamente violado por entidades superiores. Não há respeito por horários de trabalho.”

“É altamente esgotante manter e conjugar: trabalhos de direção de turma, apoio constante aos encarregados de educação, docente de várias turmas com níveis diferentes, centenas de contactos diários dos 110 alunos, realização de videoconferências… E ser encarregado de educação a apoiar dois filhos em níveis diferentes de escolarização!! Não sei se aguentarei até 26 de junho!”

A verdade é que não se pode tornar o excepcional em regra. É forçoso garantir todas as condições de segurança e trabalhar para o regresso à normalidade possível. Para isso, a redução do número de alunos por turma é um elemento importante e, por isso, o PCP acompanha a proposta hoje em discussão. As turmas já antes deveriam ser mais pequenas e a situação que vivemos veio evidenciar como isso seria fundamental.

No entanto, não podemos deixar de referir que esta proposta teria de ser substancialmente alterada para que pudesse ser minimamente exequível, sobretudo num curto espaço de tempo. Há consequências que têm de ser devidamente preparadas e pensadas, por exemplo:

- se não houver espaço nas escolas para fazer esta diminuição nos números exactamente propostos, para onde iriam os alunos? Na nossa óptica, não deveriam ir para o privado, portanto, o que aconteceria? Ficariam em casa?

- como se faria nos casos dos grupos docentes em que faltam professores e em que não tem havido colocação por não estarem no sistema nesta altura?

O PCP considera que, numa situação como a que atravessamos, seria fundamental, mais do que uma solução a régua e esquadro, existir a definição a breve trecho de normas sanitárias que, assegurando o escrupuloso cuidado pela saúde, higiene e segurança de alunos e trabalhadores, permitisse que as escolas, tendo em conta a sua autonomia, melhor pudessem proceder à redução e adaptações necessárias tendo em conta as características de cada estabelecimento, de cada sala, de cada equipamento.

O PCP coloca-se do lado da exigência da comunidade educativa para que sejam tomadas as medidas adequadas e em tempo útil por parte do Governo, que, aliás, demorou demasiado tempo a incluir os vários parceiros educativos e, nomeadamente, os sindicatos na conversa sobre a preparação do próximo ano lectivo.

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