Artigo de Domingos Lopes

«Síndroma dos Balcãs»

Os problemas de fundo da Jugoslávia e dos Balcãs não se resolviam e não se resolveram com uma guerra de agressão a um país soberano e independente. Na feliz expressão de François Mitterrand, não se resolve um conflito acrescentando-lhe mais guerra. O certo é que os EUA em véspera de imporem o novo conceito estratégico da NATO empurraram os seus aliados para uma aventura cujo objectivo anunciado não tinha a ver com o pretendido. Assim é hoje cada vez mais claro que não foram objectivos humanitários, mas objectivos de domínio económico, político e militar, que levaram à guerra contra a Jugoslávia. Nunca é demais lembrar que o maior êxodo de kosovares albaneses ocorreu depois do início dos bombardeamentos assim como uma autêntica limpeza étnica com a perseguição e fuga de dezenas de milhares de sérvios do Kosovo. Os EUA e NATO usaram na guerra contra a Jugoslávia novas e sofisticadas armas desde as bombas de grafite passando pelos mísseis de cruzeiro até às balas com urânio empobrecido. A Jugoslávia viveu sob um dilúvio de bombardeamentos dos mais modernos armamentos de destruição e morte. Sob o efeito dos corifeus da nova ordem mundial os "media" louvaram esta nova arte de destruir, apresentando-a como uma guerra "pura", "cirúrgica" e "limpa". Por aqui andaram os que se encantaram com o dilúvio de bombardeamentos sobre Jugoslávia.

Em nome de um sistema político prenhe de injustiças e tão cheio de marginalizados, os EUA e a NATO para "corrigir" o nacionalismo sérvio no Kosovo desencadearam uma guerra que na verdade se orientou para destruir um país e humilhar um povo. Ao lado do "Big Brother" os membros da NATO participaram nesta crueldade suprema. Os resultados já são conhecidos e outros começam a ganhar as proporções de um gigantesco escândalo. Afinal o urânio empobrecido disparado contra as populações no Kosovo (kosovares sérvios, kosovares albaneses, ciganos e outros) e que está a criar-lhes doenças em série, também mata os próprios soldados das forças dos outros países da NATO. Ao que parece se o urânio empobrecido apenas dizimasse as populações (sérvias ou albanesas), as consciências doridas do Ocidente ficariam tranquilamente a assistir por uma qualquer via a estas mortes da civilização made in USA e NATO. O drama parece ser que matando à farta na Jugoslávia também mata os soldados que lá estavam para matar... Bem o sabiam os que ordenaram os bombardeamentos. E mais devem saber que não dizem. O certo é que esta política dos EUA e da NATO assenta no domínio e na mentira.

Os seus autores tinham plena consciência do que iam fazer, do que fizeram e de todo o rol de destruição e mortes que semearam. Os seus responsáveis estão em Washington, Londres, Bruxelas, Bona, Paris, Madrid, Lisboa e não vão ao Tribunal de Haia. Porém os mortos na Jugoslávia e os que morrem por lá terem estado exigem que a opinião pública se levante e exija esclarecimentos e responsabilidades. É de exigir ao governo português que esclareça e não minta, que fale da toxidade do urânio e não da sua radioactividade, que cancele a ida de novos contingentes e que faça regressar as tropas. E que todos pensemos que mesmo que as tropas da NATO não comam nenhum alimento que não seja dos seus países da NATO, que respirem por máscaras, a seu lado as populações da Jugoslávia comerão o que os seus campos, rios, mar e indústrias lhes fornecerem, respirarão o seu oxigénio e morrerão de diversos tipos de cancros. Só isto bastava para demonstrar o carácter criminoso desta guerra.

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