Projecto de Resolução N.º 324/XII/1ª

Revogação das Taxas Moderadoras e Atribuição do Transporte de Doentes não Urgentes

Revogação das Taxas Moderadoras e Atribuição do Transporte de Doentes não Urgentes

O regime das taxas moderadoras imposto pelo Governo PSD/CDS-PP aumentou brutalmente o seu montante. A esmagadora maioria das taxas mais que duplicaram e algumas triplicaram. A taxa moderadora de uma consulta nos cuidados de saúde primários passou de 2,25€ para 5€ ou nas urgências polivalentes passou de 9,60€ para 20€. Criaram ainda novas taxas moderadoras, por exemplo, para as consultas de enfermagem no valor de 4€ nos cuidados de saúde primários e de 5€ ao nível hospitalar e até para as consultas sem a presença de utente – algo inédito! – no valor de 3€.

Desde a sua criação, as taxas moderadoras nunca serviram para moderar o dito “consumo de cuidados de saúde” pelos utentes, contrariamente ao apregoado pelos sucessivos Governos. Elas na prática constituem, cada vez mais, um obstáculo no acesso dos utentes aos cuidados de saúde que necessitam. Os portugueses estão mesmo a deixar de ir a consultas ou tratamentos, porque não têm possibilidade de assumir encargos tão elevados, face aos seus baixos rendimentos.

Segundo informação disponibilizada pela Administração Central do Sistema de saúde (ACSS), em Janeiro e Fevereiro de 2012 verificou-se uma redução de 7,6% nas urgências hospitalares, correspondendo a menos 82.279 episódios. Tal não se deve à dita “moderação”. Também não se deve ao facto dos utentes recorrerem aos cuidados de saúde primários, dado o encerramento ou redução de horários de funcionamento de valências nos centros de saúde. Esta redução é reflexo do aumento das taxas moderadoras.

É do conhecimento geral, que muito utentes, sobretudo idosos, com baixas reformas, não conseguem comprar os medicamentos e adiam as consultas. E, muitas vezes estes utentes quando chegam às urgências hospitalares, já estão numa situação de saúde muito frágil, necessitando de internamento. Está demonstrado que a cegueira do Governo em cortar na saúde e em transferir os custos da saúde para os utentes, sem promover a saúde, só piora as condições de saúde dos utentes e saí mais cara para o Estado.

Na verdade, a aplicação do Pacto de Agressão subscrito por PS, PSD e CDS-PP e das políticas de direita do atual Governo PSD/CDS-PP estão a levar ao empobrecimento dos portugueses, devido ao roubo nos salários, ao corte nas reformas e pensão, à redução das prestações sociais, ao aumento dos preços de produtos alimentares, da eletricidade, do gás, dos medicamentos e dos transportes.

No que respeita às isenções estão ainda por confirmar as estimativas avançadas pelo Governo. O Governo continua a adiar sucessivamente os prazos do período transitório, mas os números que vão sendo conhecidos estão ainda muito aquém dos cerca de 7 milhões de utentes isentos. Acrescem a isto, as injustiças introduzidas nos critérios de isenção. Os doentes crónicos perderam a isenção, passando a estar isentos apenas alguns atos referentes à doença crónica, porque muitos não foram contemplados, como por exemplo os atos para os doentes com hemoglobinopatias ou com fibrose quística.

Quanto à insuficiência económica são já inúmeros os relatos de famílias com baixos rendimentos, indignadas com o indeferimento do seu pedido de isenção. Por exemplo, um idoso com uma reforma de 571,24€, que inclui a pensão de viuvez no valor de 160€, não teve isenção nas taxas moderadoras, porque o atual modelo considera como rendimento todas as prestações sociais, quando no passado estava isento, porque só era considerado o valor da sua reforma. Ou o exemplo de uma família composta por um adulto e um filho, com rendimento mensal de 703,88€, também viu indeferido o pedido de isenção das taxas moderadoras, porque os filhos não são considerados.

Estes exemplos, entre muitos outros, põem a nu as injustiças das taxas moderadoras e do modelo de isenção por insuficiência económica, que considera os rendimentos brutos, divide o rendimento total por 12 e não por 14, integra todas as prestações sociais como rendimentos, não tem em conta a dimensão do agregado familiar, nomeadamente no que diz respeito ao número de filhos e até inclui o património.

Bem pode o Governo afirmar o oposto, mas as taxas moderadoras constituem um copagamento do Serviço Nacional de Saúde (SNS), subvertendo claramente os princípios constitucionais e o espírito inovador do SNS.

Mas não é só nas taxas moderadoras que o Governo transfere os custos da saúde para os utentes; o mesmo se verifica ao nível dos transportes de doentes não urgentes. O anterior Governo PS decidiu incluir o critério da insuficiência económica para a atribuição de transporte de doentes não urgentes. O resultado foi o abandono de consultas e tratamentos pelos utentes, porque não conseguiam suportar os elevados custos de deslocação, por dificuldades económicas. Critério que o atual Governo manteve e que inscreveu no regime das taxas moderadoras.

Por todo o país, mas com uma incidência muito expressiva nas regiões de interior, os utentes viram-se impossibilitados de ir a consultas ou tratamentos. Um doente oncológico, com rendimento de 700€ residente no Distrito de Bragança, que necessite de ir uma vez por semana ao hospital no Porto, não consegue suportar os cerca de 200€ por deslocação.

Em declarações públicas o Governo, diversas vezes, manifestou disponibilidade para alterar os critérios da atribuição de transporte de doentes não urgentes e assumiu que os doentes que necessitam de tratamento prolongados têm o transporte garantido. Avançaram ainda que o valor máximo a suportar pelo utente será de 30€, significando portanto que o Governo mantém o critério da insuficiência económica e exige aos utentes o pagamento pelo transporte para poderem ter acesso aos cuidados de saúde. Para muitos utentes, o pagamento de 30€, 4 ou 5 vezes por mês é incomportável. Na realidade não há alterações nos aspetos essenciais, permanecendo as restrições na atribuição do transporte de doentes não urgentes.

É desumana a aplicação das taxas moderadoras e a limitação na atribuição do transporte de doentes não urgentes, que impossibilitam os utentes de se tratarem.

A consagração do direito à saúde, universal, geral, independentemente das condições socioeconómicas e de qualidade na Constituição da República Portuguesa, e a consequente criação do Serviço Nacional de Saúde proporcionou avanços sem precedentes na saúde dos portugueses. Foi a garantia do acesso aos cuidados de saúde que permitiu a Portugal em poucos anos, colocar-se entre os melhores ao nível da saúde.

Sendo a saúde um direito que assiste a todos os portugueses, não é compatível com a existência de taxas moderadoras, nem com limitações no acesso aos cuidados de saúde, segundo as condições económicas. Isto é, quem pode pagar tem acesso a todos os cuidados de saúde, enquanto a quem menos tem, só lhe é garantido um pacote mínimo de cuidados.

Em cumprimento dos valores de Abril e dos princípios constitucionais defendemos a revogação das taxas moderadoras e a atribuição do transporte de doentes não urgentes a todos os utentes que dele necessitem.

Assim, nos termos regimentais e constitucionais aplicáveis, os Deputados abaixo assinados do Grupo Parlamentar do PCP propõem que a Assembleia da República adote a seguinte

Resolução

A Assembleia da República recomenda ao Governo:

1. A Revogação das Taxas Moderadoras;
2. Garantir o transporte de doentes não urgentes, a título gratuito, a todos os utentes do Serviço Nacional de Saúde, que dele careçam por motivos clínicos ou económicos, para consultas, exames ou tratamentos, independentemente do período de duração.

Assembleia da República, em 11 de Maio de 2012

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